Banca descontente com condições da venda do Novo Banco
A solução está a ser negociada com Bruxelas e prevê que o Fundo de Resolução fique com uma posição de 25% no banco que será vendido ao Lone Star, Estado fica sem sem intervenção na gestão corrente.
O sistema financeiro não vê com bons olhos que 25% do Novo Banco fique no Fundo de Resolução, o que se vai traduzir num acréscimo da sua exposição ao grupo concorrente, onde ficará como accionista sem contrapartidas ou poder de controlo. Mas esta é a solução encontrada para assegurar que o Novo Banco é vendido ao Lone Star até ao final da semana, possibilitando ao Governo fazer uma gestão política do negócio: o parceiro silencioso do fundo imobiliário é a banca e não é o Estado.
Numa escala de zero a 10 a possibilidade de António Costa usar a banca para “eliminar” o último obstáculo que tem pela frente no sistema financeiro, é a mais alta: 10. E, tudo indica, que até sexta-feira o Governo vai anunciar que vendeu o Novo Banco ao Lone Star e o Fundo de Resolução ficará com 25%, mas sem direitos políticos e intervenção na gestão corrente.
Uma decisão que se vai traduzir num aumento da exposição do sector bancário a uma entidade concorrente, onde desde Agosto de 2014 (colapso do BES) já arrisca 3,9 mil milhões. Desta vez, o investimento irá aumentar, mas sem contrapartidas. O Fundo de Resolução é detido pela banca e gerido pelo Banco de Portugal, mas é risco público e as potenciais perdas terão impacto orçamental.
Depois de Pedro Passos Coelho ter envolvido o sistema financeiro, contra a vontade dos banqueiros, na resolução do BES, esta hipótese (em 2014 criticada pela oposição, PS, BE e PCP) volta a ser a escolhida para responder à exigência do gigante imobiliário Lone Star de partilhar riscos com os contribuintes. E está a levantar um coro de protestos ao mais alto nível dentro de várias entidades bancárias. Um ruído que não tende a diminuir, pois trata-se de um auxílio a um concorrente, ainda que o volume dependa das condições finais da operação, disseram ao PÚBLICO vários gestores de bancos e accionistas.
Mas os protestos dificilmente passarão disso mesmo. Desde logo porque o Governo e o BdP têm poder para avançar com a medida, independentemente das reacções do sector. E mesmo que este se oponha, o recurso aos tribunais tenderá a arrastar-se, o que não interessa a nenhuma das partes.
Depois, com excepção do BCP (que visou marcar posição perante o possível interesse do BPI e do Santander) nenhum outro banco se chegou à frente para disputar a instituição chefiada por António Ramalho. No final, todas as instituições se colocaram no lugar de espectadoras.
Por outro lado, todos os banqueiros têm pela frente desafios para resolver, o que os impediu, aliás, de olhar de forma credível para o Novo Banco, difícil de rentabilizar. E o Governo já compensou os bancos dilatando por 30 anos o prazo de pagamento do empréstimo estatal de 3,9 mil milhões ao Fundo de Resolução.
Quando tomou posse, no final de 2015, António Costa tinha vários temas bancários sensíveis em cima da mesa: recapitalizar a CGD em larga escala; estabilizar o capital do BPI; reforçar os capitais do BCP obrigado a pagar ao Estado, até Julho deste ano, 750 milhões, o que já fez; regularizar a situação da Caixa Económica Montepio Geral; vender o Novo Banco; resolver o Banif. Todos os bancos representavam quase 80% do mercado.
E, um a um, todos os temas têm vindo a ser fechados. O Estado foi autorizado pelas autoridades europeias a recapitalizar o banco público em cerca de cinco mil milhões, processo em curso, enquanto os problemas do BCP e do BPI foram solucionados pelos seus accionistas privados, como era suposto. E a percepção geral no meio bancário é que a Caixa Económica Montepio Geral está a ultrapassar os actuais constrangimentos e o horizonte não é catastrófico. Resta o último tema, e o mais difícil: a venda do Novo Banco, o terceiro maior grupo do sistema. Se este tiver êxito, o Governo poderá vir dizer que fecho um ciclo, com uma derrota: o Banif, cuja parte boa foi entregue ao grupo espanhol Santander, que ainda pode receber um prémio de cerca de 900 milhões a retirar dos bolsos dos portugueses.
Os próximos dias vão ser decisivos para o Governo virar a página do Novo Banco, o último tema na gaveta. No último fim-de-semana ficou a saber-se que o BCE e a DGcomp autorizaram o Estado, ou um veículo por este designado, a manter-se com 25% do Novo Banco, uma exigência do Lone Star para avançar com o negócio e partilhar riscos.
Bruxelas e Frankfurt aceitaram, mas impuseram condições: o Estado prescinde dos seus direitos políticos (de voto) e de controlo da gestão. Um presente para o Lone Star, já que os contribuintes arriscam as verbas, mas ficam sem voz em temas sensíveis, como a constituição de imparidades (desvalorização dos activos em carteira), o que pode obrigar a recapitalizações públicas.
O levantar do véu das conversas reforçou também o coro de objecções levantadas pelos parceiros políticos do PS: o BE e PCP. E que têm surgido a defender a nacionalização do Novo Banco, contestando ainda a intenção de o vender a um gigante imobiliário, com interesse nas propriedades do banco na zona da Avenida da Liberdade, em Lisboa, e nos terrenos das Amoreiras. Os dois partidos juntam-se aos que já apareceram a defender a nacionalização, ainda que transitória (Vítor Bento, por exemplo), como sendo a via mais racional.
Para além de, neste momento, ser difícil de reverter o processo de alienação, a nacionalização obrigaria o Governo a entrar em terreno desconhecido, sem desenho definido. E para António Costa seria, talvez, a continuação da dor de cabeça, pois não evitaria a guerra com as actuais chefias do PSD e do PP. Tudo o que o primeiro-ministro não quer.
Com o contexto económico mais favorável e a perspectiva de saída do espartilho do défice excessivo, António Costa procura entrar num novo ciclo político, centrado nas eleições autárquicas, sem ter a espada da banca a ameaçar a governação. Veremos se no final desta semana o último obstáculo (a venda do Novo Banco), de todos os dossiês financeiros problemáticos que recebeu em 2015, é ultrapassado.