Presidenciais são um novo teste a Timor-Leste, 15 anos depois
Francisco Guterres “Lu Olo”, o candidato apoiado pelos dois maiores partidos timorenses, é o grande favorito, mas vitória à primeira volta não está garantida. São as primeiras eleições que o país organiza sozinho.
Quinze anos depois da independência, Timor-Leste volta nesta segunda-feira às urnas para escolher o seu quarto Presidente, naquela que será a primeira eleição organizada inteiramente pelas autoridades de Díli. Pela terceira vez na corrida, Francisco Guterres “Lu Olo”, o presidente da Fretilin que desta vez conta com o apoio do ex-Presidente Xanana Gusmão, é o favorito à vitória, mas é grande a incerteza sobre se terá de disputar uma segunda volta, provavelmente frente a António da Conceição, o candidato do Partido Democrático (PD).
“Este é um teste muito grande para as autoridades timorenses”, diz ao PÚBLICO, por telefone, a eurodeputada Ana Gomes, que lidera a missão de observadores do Parlamento Europeu às presidenciais, recordando que em 2012 “a presença das Nações Unidas era muito grande” – a missão da ONU deixaria o país nesse ano, já depois das legislativas que deram a vitória ao Conselho Nacional de Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), de Xanana Gusmão. “Nesse aspecto é muito significativo que tudo esteja perfeitamente tranquilo e confiante em que vai correr bem” diz a eurodeputada, notando a forma pacífica como decorreu a campanha, com registo de um único incidente nos dias iniciais.
Na corrida à sucessão de Taur Matan Ruak estão oito candidatos – entre eles três deles independentes e uma única mulher. Mas a reaproximação entre Xanana e a Fretilin, consumada após anos de conflito em 2015 com a nomeação de Rui Araújo (da nova geração do partido da libertação) para substituir o histórico dirigente no cargo de primeiro-ministro, colocou “Lu Olo” em clara posição de vantagem.
“A conclusão local é a de que ‘chegou a vez dele’, uma referência ao facto de os outros líderes icónicos da resistência, de Xanana, ao [secretário-geral da Fretilin] Mari Alkatiri, a José Ramos-Horta e Taur Matan Ruak já terem tido a sua oportunidade”, escreveu Susan Marx, representante da Asian Foundation em Timor. Clinton Fernandes, professor na Universidade da Nova Gales do Sul é mais taxativo, dizendo Sydney Morning Herald que o vencedor “será aquele que Xanana apoiar” – foi assim com Ramos-Horta em 2007 e com Matan Ruak, em 2012, nas duas vezes contra “Lu Olo”.
Mas no país cresce o descontentamento, sobretudo dos mais jovens, com o desemprego e a pobreza que os milhões do petróleo não resolveram e que engrossam a corrupção. Um desagrado a que Matan Ruak deu voz quando, há um ano, foi ao Parlamento acusar Xanana, Alkatiri de “usarem a unanimidade para ter poder e privilégios”. Foi o ponto alto de um conflito que afastou os dois antigos guerrilheiros, acelerou a saída do PD da coligação governamental, ao mesmo tempo que era criado o Partido da Libertação do Povo (PLP), que já anunciou a intenção de apresentar Matan Ruak como candidato a primeiro-ministro nas legislativas de Julho.
É esta a plataforma que apoia António da Conceição, ministro da Educação, que se apresenta como candidato de uma nova geração política, apostada no combate à corrupção e na diversificação da economia. “Vai ser renhido. Acredito que Lu Olo vai ter uma boa votação, mas a questão é saber se será suficiente para vencer à primeira volta”, disse à agência australiana AAP Damien Kingsbury, especialista em assuntos timorenses e membro da missão de observação enviada pelo país vizinho.
Também Ana Gomes acredita que está tudo em aberto. “São eleições bastante competitivas. Ninguém sabe quais serão os resultados, há todo o tipo de percepções” sobre o desfecho, sublinhando que apesar das diferenças políticas "há um sentimento de unidade nacional e de continuar a reconciliação" que diz ter ficado bem visível quando sexta-feira, no último dia da campanha, os oito candidatos se reuniram para um debate, transmitido pela televisão nacional, que terminou com todos de mãos dadas. "Foi um sinal muito importante e o positivo".
As urnas estarão abertas entre as 7h e as 15 desta segunda-feira e os resultados devem ser conhecidos nos dias seguintes, sendo que com a electrificação completa do país, haverá pela primeira vez um apuramento electrónico dos resultados, complementar aos métodos tradicionais, que poderá acelerar o processo, explica a eurodeputada, confiante também que o dia da votação decorrerá sem violência.