Tribunal Constitucional preocupado com fiscalização das contas das autárquicas
Depois de se queixar da falta de meios, Costa Andrade levou ao Parlamento um documento com as dificuldades de aplicação da lei de controlo das contas dos partidos e campanhas. Deputados comprometeram-se a rever a legislação.
O presidente do Tribunal Constitucional (TC) está preocupado com a fiscalização das contas dos partidos e das campanhas eleitorais, tendo em conta, sobretudo, a proximidade das eleições autárquicas que se realizam no próximo Outono, e foram essas as preocupações que transmitiu esta quarta-feira aos deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais. Mas fê-lo à porta fechada.
O PÚBLICO sabe que Manuel da Costa Andrade entregou aos parlamentares um documento com as principais dificuldades com que o TC se debate na tarefa. A informação foi confirmada pelo presidente da 1ª comissão, Pedro Bacelar de Vasconcelos (PS), que no entanto não quis referir-se ao conteúdo do mesmo, porque “não é um documento público”.
Mas Costa Andrade já se referiu a algumas dessas dificuldades em Setembro, quando se reuniu com o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e apontou a falta de meios como uma das grandes asfixias. "As tarefas de fiscalização das contas, de eventuais ilícitos, etc, que possam ter ocorrido, é uma tarefa muito exigente porque é preciso fiscalizar as contas dos partidos em todo, com uma análise de minúcia e de pormenor muito grande, isso é um trabalho imenso, é um processo que se estrutura em muitos milhares de folhas e muitos milhares de páginas", afirmou então aos jornalistas.
As eleições autárquicas complicam ainda mais esta tarefa. Isto porque cabe ao TC fiscalizar as contas de cada partido que concorre a cada órgão: são 308 câmaras municipais e outras tantas assembleias municipais, e mais de 3000 juntas de freguesia, a que correspondem outras tantas assembleias. No total, rondarão as 30 mil contas a fiscalizar, uma tarefa hercúlea para a Entidade das Contas e Financiamento dos Partidos (ECFP), composta por uma presidente, Margarida Salema, e dois vogais. Os fiscais são contratados em função das necessidades.
Em Setembro, Costa Andrade afirmou que faltam meios à ECFP - "tanto em termos de pessoal como de espaços físicos" - para desempenhar a sua missão, um problema que afirmou ser notório e que merece "solução ajustada". Mas, desde então, nada aconteceu nesta matéria.
Aliás, essa falta de meios resulta habitualmente em grandes atrasos na fiscalização das contas, tanto dos partidos como das campanhas eleitorais, o que por vezes leva à prescrição de processos. Nos últimos meses, registaram-se mesmo dois casos em que a aplicação das coimas por irregularidades prescreveu, por terem sido ultrapassados os prazos processuais.
Acresce que o TC, como entidade da Administração Pública que é, está sujeito à cativação de 25% do seu orçamento, sendo necessário pedir a descativação de verbas para que a ECFP possa funcionar normalmente.
A estas grandes questões juntam-se outras dificuldades derivadas da lei e sobre as quais Costa Andrade quis conversar com os deputados. “Não é do desconhecimento público que existem dificuldades no cumprimento de prazos e na garantia da efectividade de fiscalização em tempo útil que a lei do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, que já tem 12 anos, suscita", disse aos jornalistas, no final do encontro, o presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais.
Pedro Bacelar de Vasconcelos adiantou que houve "o compromisso relativamente à necessidade de proceder às revisões legislativas que se impuserem" na sequência desta reunião. "O que está em causa é consolidar e alargar o grau de controlo de todos os processos eleitorais e do funcionamento dos partidos políticos”, afirmou Bacelar, acrescentando: “É preciso ter em conta as dificuldades que surgem e melhorar. É nosso dever procurar que a legislação se adeque ao cumprimento da sua principal finalidade que é garantir a transparência dos partidos políticos e das campanhas eleitorais”.
Foi para permitir que o encontro fosse “mais distendido e porventura mais útil” que este decorreu à porta fechada, acrescentou o presidente da comissão, assumindo a responsabilidade da decisão – embora o PÚBLICO saiba que o pedido foi feito pelo TC. “Fui eu [que decidi], tendo em conta a importância de uma troca de impressões que não estivesse condicionada pela exposição à comunicação social e assim pudesse trazer contributos substanciais, mais no sentido do compromisso das alterações legislativas que se impuserem”, disse aos jornalistas.
E confirmou que a preocupação se coloca particularmente este ano, devido às eleições locais: “As autárquicas são milhares de actos eleitorais que vão decorrer e as deficiências do processo multiplicam-se por esses actos”, sublinhou. Resta saber se o Parlamento consegue resolver os estrangulamentos a tempo.