Sob o olhar de Pequim, Hong Kong começa a escolher novo líder
Arrancou o processo de nomeação dos candidatos a chefe executivo, que os sectores pró-democracia consideram ser apenas uma confirmação das preferências do regime chinês.
Hong Kong começa esta terça-feira a escolher os candidatos ao cargo de chefe executivo do território. O processo é muito criticado pelos sectores pró-democracia e independentistas que o consideram uma imposição dos nomes mais convenientes para Pequim.
Até 1 de Março, a comissão eleitoral vai manifestar o seu apoio às várias pré-candidaturas à chefia do governo de Hong Kong, mas não há muita margem quanto ao desfecho deste procedimento. A comissão é composta por cerca de 1200 elementos seleccionados de um grupo de 230 mil eleitores e que têm um mandato de cinco anos. É este grupo restrito que tem direito a voto num território com mais de sete milhões de habitantes.
De acordo com a lei básica, este colégio eleitoral – que é responsável tanto por aprovar as candidaturas como pela eleição final do chefe executivo, marcada para 23 de Março – junta representantes que devem reflectir os vários grupos de interesse da sociedade de Hong Kong, incluindo dirigentes de associações económicas e industriais, sindicatos e grupos sociais e ainda os 70 deputados do Conselho Legislativo.
“Os membros da comissão eleitoral não protegem nada mais do que os seus interesses próprios. Como podem representar os interesses do povo de Hong Kong?”, questionava Stone Shek, um engenheiro de 49 anos, citado pela AFP.
Os favoritos para chegarem à liderança do executivo local são dois ex-dirigentes governamentais, ambos conotados com a linha de Pequim. Carrie Lam, ex-secretária-chefe para a Administração, tem uma longa carreira na burocracia de Hong Kong e liderou também a Secretaria do Desenvolvimento. A ausência de um passado fora da administração pública do território é uma das grandes críticas feitas pela oposição a Lam e deu azo a alguns episódios caricatos.
Um dos privilégios dos titulares de pastas ministeriais é a atribuição de residências oficiais em alguns dos locais mais exclusivos de Hong Kong. Para se candidatar à chefia do executivo, Lam teve de apresentar no mês passado a sua demissão do governo e, por isso, deixou a sua casa oficial. Ao lembrar as dificuldades de regresso à vida civil, Lam contou que, quando faltou o papel higiénico na sua nova casa, foi de táxi até à sua antiga residência oficial para se abastecer. O episódio, contado pela BBC, deu origem a uma onda de gozo nas redes sociais e nos círculos da oposição de Hong Kong, onde, ao contrário da China, não existem limitações à liberdade de expressão.
O principal adversário de Lam é o ex-secretário das Finanças John Tsang, considerado mais próximo dos grupos pró-democráticos e mais popular. A imprensa local chegou a divulgar notícias de que o Governo chinês tentou dissuadir Tsang de concorrer às eleições, mas o candidato referiu um aperto de mão dado pelo Presidente, Xi Jinping, durante o encontro do G-20 em Huangzhou no ano passado como “um dos factores” que o levaram a avançar.
No final, é de sinais deste género que a escolha do próximo líder governamental de Hong Kong está dependente. “Muita gente, incluindo os candidatos, percebe a importância e está mesmo impaciente para que Pequim ‘abençoe’ a sua escolha para acabar com a incerteza”, escreve no South China Morning Post a colunista Tammy Tam. Porém, avisa, “qualquer apoio explícito nesta altura pode ser criticado como qindian, ou unção, por Pequim”.
É precisamente este tipo de jogo político que levou para as ruas de Hong Kong milhares de pessoas durante várias semanas em 2014, durante os protestos que ficaram conhecidos como a “revolução dos guarda-chuvas”. Numas eleições com desfecho previsível, a incerteza está na forma como vão as ruas reagir a este processo.