Palmira perdeu parte do teatro romano e mais um dos seus principais monumentos
Autoridades sírias acusam o Daesh, que reconquistou a cidade antiga em Dezembro.
Novas imagens de satélite mostram que terão sido destruídos mais dois monumentos icónicos de Palmira, uma das mais importantes cidades históricas do Médio Oriente. Desta vez, e segundo o chefe do património da Síria, Maamoun Abdulkarim, os militantes do Daesh terão deitado praticamente por terra o tetrápilo – um dos principais monumentos da grande avenida de colunas que é a imagem de marca daquele sítio arqueológico – e boa parte do teatro romano, palco que escolheram para muitas das execuções que mostraram ao mundo desde Maio de 2015, data em que tomaram a cidade pela primeira vez (segundo a agência Associated Press, as últimas terão ocorrido na quinta-feira, com os extremistas a decapitarem 12 prisioneiros).
O tetrápilo - palavra que deriva do grego e que é usada para designar uma estrutura com quatro portas ou portões - é uma construção típica da arquitectura clássica, algo que os romanos podiam erguer nos cruzamentos de vias importantes. O de Palmira já não tinha paredes nem cobertura, mas era extremamente cenográfico (como toda a cidade, aliás).
Construído no local onde a avenida apoteótica de Palmira faz uma ligeira curva, este tetrápilo tinha ainda de pé, nos quatro cantos da sua base de pedra, outras tantas estruturas quadradas com quatro colunas cada. De acordo com as imagens enviadas por Maamoun Abdulkarim à agência Reuters, divulgadas esta sexta-feira, apenas quatro das 16 colunas sobreviveram.
Estas imagens foram fornecidas, segundo a Associated Press (AP), pela American Schools of Oriental Research (ASOR), uma organização fundada em 1900 e que se tem dedicado ao estudo das culturas do Médio Oriente e do mundo mediterrânico em geral, composta por quase 90 instituições internacionais, incluindo universidades de prestígio como Yale e Harvard.
O satélite mostra ainda que grande parte do teatro romano do século II - à falta de melhor palavra, chamemos-lhe fachada -, também ele carregado de colunas, está agora em fragmentos, caído sobre o palco onde em Maio último uma orquestra russa, a do histórico Teatro Mariinsky, conduzida por um maestro amigo do Presidente Valdimir Putin, Valery Gergiev, deu um concerto para festejar o facto de as tropas governamentais terem recuperado o controle de Palmira, graças à aviação de Moscovo. Um controle que mantiveram apenas entre Março e Dezembro, altura em que os militantes do Daesh reconquistaram a cidade, aproveitando o facto de as tropas governamentais de Bashar al-Assad e de as milícias que as apoiam no terreno estarem concentradas no ataque final ao grande reduto do Estado Islâmico no país, a cidade de Alepo.
Na altura, o Presidente sírio disse à televisão estatal japonesa TBS que os extremistas tinham recuperado Palmira com “o apoio dos americanos e sob vigilância dos drones dos Estados Unidos”, sem esquecer, claro, de acusar a Turquia de financiar o Daesh.
Segundo o chefe das antiguidades da Síria, a destruição terá acontecido algures entre 26 de Dezembro e 10 de Janeiro, mas a sua verdadeira extensão é ainda desconhecida.
Segundo a ASOR, citada pela AP, esta destruição parece ter sido intencional, embora a organização não deixe de sublinhar que não fez ainda qualquer verificação no local que lhe permita determinar a causa exacta.
Como sempre, quando se trata de sítios arqueológicos sírios e iraquianos alegadamente destruídos pelo Estado Islâmico, boa parte da informação que chega aos jornais e televisões em todo o mundo está longe de ser independente, já que é veiculada por uma ou outra das partes em conflito.
Entre Março e Dezembro de 2016, e segundo a televisão síria, Palmira, património mundial desde 1980, foi submetida a trabalhos de limpeza e de restauro, procurando minimizar os extensos danos que o Daesh lhe terá infringido desde que ali chegou pela primeira vez. Os esforços de reconstrução estavam concentrados nos dois principais templos desta antiga cidade que era paragem obrigatória na Rota da Seda e que foi um importante centro de cultura e conhecimento do Médio Oriente, cruzando influências ocidentais e persas: o de Bel e o de Baal-Shamin. O Leão de Al-lat (século I), uma escultura em pedra com três metros de altura que se tornou um dos símbolos deste sítio arqueológico, e o monumental arco do triunfo, com dois mil anos, também estavam a ser restaurados.
Quando as tropas de Assad e a aviação russa reconquistaram aquela que foi um dos centros mais ricos do Império Romano em Março de 2016, o responsável máximo pelos museus e monumentos do país, Maamoun Abdulkarim, dissera já que seriam precisos pelo menos cinco anos para reconstruir a cidade a que os sírios chamam “noiva do deserto”. Agora, talvez cinco anos não cheguem.