Líbios que desviaram avião para Malta queriam anunciar partido pró-Khadafi
Ainda se sabe pouco sobre os dois homens que obrigaram piloto a tirar da rota avião da companhia Afriqiyah Airways com 118 pesoas a bordo. Mas mais do que terrorismo, será um exemplo das profundas divisões políticas entre os líbios desde a revolução e a morte de Khadafi.
Dois homens desviaram um avião líbio para Malta com 118 pessoas a bordo, mas não mantiveram os reféns durante muito tempo. Libertaram rapidamente os passageiros e acabaram por se render, anunciando serem membros de um partido pró-coronel Khadafi – o líder morto na revolução de 2011.
O ministro dos Negócios Estrangeiros do governo de união nacional líbio identificou os sequestradores como Suhaha Mussa e Ahmed Alid, diz o jornal Times of Malta, e disse que queriam pedir asilo político a Malta e, ao mesmo tempo, anunciar a criação de um partido pró-Khadafi, diz a AFP. Mas o primeiro-ministro maltês, Joseph Muscat, desmentiu que tenha sido pedido asilo, diz o jornal.
Hijackers surrendered, searched and taken in custody.
— Joseph Muscat (@JosephMuscat_JM) December 23, 2016
Os sequestradores, na casa dos 20 anos, traziam armas falsas e são membros dos Tebu, um grupo étnico existente no Sul da Líbia, de onde o avião partiu. Depois de todos os passageiros terem deixado o avião, apareceu um homem no topo das escadas do avião com uma bandeira verde parecia com a antiga bandeira dos tempos de Khadafi.
O desvio do voo A32 da companhia aérea Afriqiyah Airways parece menos um caso de terrorismo e mais um exemplo das profundas divisões políticas entre os líbios desde a revolução e morte de Khadafi em resultado da revolta da Primavera Árabe de 2011. Embora não tenham sido tornadas públicas as suas reivindicações, o Times of Malta fala na possibilidade de os sequestradores exigirem a libertação de Seif Khadafi, o filho mais velho do ditador, preso e condenado à morte em 2015.
Após o derrube de Kadhafi, em 2011, por milícias no terreno, apoiadas por uma operação aérea europeia liderada pela NATO, este país produtor de petróleo nunca conseguiu restabelecer-se como uma nação unida e operacional. Diversas zonas são controladas por diferentes grupos armados, que batalham entre si.
No vazio de poder central que se seguiu, o Daesh conseguiu implantar-se, controlando a cidade costeira de Sirte. Mas já este mês, as milícias de Misrata, que apoiam o governo de união nacional – reconhecido internacionalmente –, apoiadas por bombardeamentos aéreos norte-americanos, conseguiram retomar a cidade, após uma batalha de sete meses.
Mas isso não quer dizer que os jihadistas tenham fugido da Líbia – simplesmente ter-se-ão espalhado pelo país, e misturado com a população. Por isso, continuam a ser um risco, dizem os analistas de segurança
O que não falta na Líbia é riscos. O governo de unidade nacional é um deles. Uma análise do grupo Stratfor para 2017 prevê o seu declínio acelerado, agora que está à beira do fim do seu primeiro ano. A sua sobrevivência é ameaçada pela força crescente do centro de poder rival que representa o marechal de campo do Exército Nacional Líbio Khalifa Hifter, no Leste, que controla mais território do que qualquer outra entidade no país dividido.
Ainda fresco do sucesso na Síria, Vladimir Putin procura outro, desta feita na Líbia, apostando em Khalifa Hifter, que se formou em Moscovo e fala bem russo. O marechal tem sido visto frequentemente em Moscovo, diz a Deutsche Welle. É apoiado com dinheiro e armas pelo Kremlin, mas também pelo Egipto e pelos Emirados Árabes Unidos, diz a Bloomberg.
Neste jogo de tronos líbio, o primeiro-ministro do governo de unidade, Fayez al-Serraz, em Tripoli, está cada vez mais frágil. “Há um ano, representantes dos governos rivais – a Câmara dos Representantes, em Tobruk, e o Congresso Geral Nacional, em Tripoli – assinaram um acordo para se unirem num único governo. Embora o acordo tenha instalado uma nova administração em Tripoli, hoje o país está mais fragmentado do que nunca. Em vez de dois governos rivais, a Líbia tem hoje três, e a liderança reconhecida internacionalmente, o governo de união nacional, está a perder terreno”, diz a análise da Stratford.