Solução para lesados pode agravar défice se houver garantia estatal

Apresentação do plano para compensar lesados do BES está prevista para esta segunda-feira, com pagamentos situados entre 50% e 75% do valor investido.

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Solução para lesados do BES poderá ser apresentada esta segunda-feira Enric Vives-Rubio

A solução para compensar os lesados do BES que o Governo se prepara para anunciar pode conduzir a um agravamento do défice público, se a operação envolver a assunção pelo Estado de algum tipo de risco financeiro, como a concessão de uma garantia por qualquer entidade pertencente à administração pública.

O anúncio da solução deverá acontecer já esta segunda-feira e envolve a criação de um veículo que terá como missão reembolsar os lesados com um valor situado entre 50% e 75% do seu investimento. Para poder fazer esse reembolso e esperar depois por uma eventual recuperação do dinheiro junto da massa falida do BES, o veículo terá de se financiar num montante elevado, já que no total foram vendidos aos balcões do BES cerca de 430 milhões dos títulos agora colocados em causa.

Uma das questões que tem preocupado o Governo no desenho desta operação é a de saber se é possível satisfazer os pedidos dos lesados sem que haja um impacto negativo nas finanças públicas. Desde o início que o Ministério das Finanças garantiu publicamente estar a trabalhar “numa solução que não tenha impacto no défice”.

E é por isso que, no plano a apresentar, se deverá prever que o veículo que compensa os lesados seja detido unicamente por privados, nomeadamente bancos. No entanto, isso não garante só por si que a operação não tenha impacto no défice público. De acordo com os especialistas de finanças públicas ouvidos pelo PÚBLICO, e seguindo decisões tomadas no passado em operações semelhantes, as autoridades estatísticas nacionais e europeias, ao analisarem a operação, têm de levar em linha de conta se o Estado, mesmo não sendo accionista do veículo, está a assumir algum tipo de risco, mesmo que de forma indirecta.

Uma das possibilidades que se tem colocado em cima da mesa é a de que, para obter o financiamento de que precisa, o veículo detido pelos bancos recorra a um empréstimo, que seria facilitado pelo facto de se entregarem garantias do Estado e/ou do Fundo de Resolução.

Neste caso, o Estado e o Fundo de Resolução (que para as autoridades estatísticas faz parte da Administração Pública) estariam a incorrer num risco financeiro, que teria de se repercutir no valor do défice público.

Naturalmente que, seguindo a mesma lógica, se em vez de um veículo criado propositadamente para o efeito, se optasse por colocar o fundo de resolução directamente a compensar os lesados ou a emprestar o dinheiro ao veículo, o impacto negativo no défice seria também inevitável.

Seja como for, qualquer decisão definitiva das autoridades estatísticas sobre esta matéria (INE primeiro e Eurostat depois) apenas deverá acontecer em Março de 2018, o momento em que se apresentam as contas relativas ao Reporte do Défice e da Dívida do ano de 2017.

A solução para o problema dos lesados do BES foi discutida ao longo dos últimos meses pelo grupo criado no memorando de entendimento assinado pelo Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Governo, BES e a associação de lesados.

Segundo apurou o PÚBLICO, o acordo deverá beneficiar mais de 2 mil clientes que reclamam 490 milhões de euros. Estará assente entre as partes que aqueles que tinham até 500 mil euros aplicados recuperam 75% do valor, mas com um tecto máximo de 250 mil euros. Ou seja, quem aplicou 400 mil euros não receberá 300 mil euros (que corresponderiam aos 75%), mas apenas 250 mil euros.

No caso de aplicações acima de 500 mil euros, a percentagem de recuperação é de 50%, neste caso sem um tecto máximo. Na prática, um investidor que aplicou 800 mil euros recupera 400 mil.

Os montantes deverão ser entregues em tranches, até 2019, e os clientes que aceitarem esta solução (será-lhes dado um mês para reflectir) terão de comprometer-se a renunciar a reclamações e processos judiciais contra uma série de entidades, como o Banco de Portugal, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), o Fundo de Resolução bancário e o Estado.

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