Milionário Rex Tillerson, um amigo da Rússia, será o chefe da diplomacia dos EUA
É o cargo mais importante a seguir ao Presidente e vai ser ocupado por um milionário que chefia a ExxonMobil. É o primeiro nome da equipa de Trump a quem senadores do Partido Republicano torceram o nariz.
Na mesma semana em que Barack Obama anunciou a abertura de uma investigação para tentar perceber se a Rússia influenciou o resultado das eleições norte-americanas, o seu sucessor, Donald Trump, pôs na liderança dos negócios estrangeiros dos Estados Unidos um homem que foi condecorado por Vladimir Putin com a Ordem da Amizade – uma medalha que é posta ao peito dos cidadãos estrangeiros que se distinguiram por melhorarem as relações com a Rússia e com o seu povo.
Na corrida ao cargo de secretário de Estado ficou para trás o antigo mayor de Nova Iorque Rudolph Giuliani, ele que sempre esteve ao lado de Donald Trump mesmo nos piores momentos da campanha. Entre os candidatos estavam ainda a antiga rock star dos generais norte-americanos, David Petraeus, que caiu em desgraça depois de ter trocado informações confidenciais por e-mail com a sua amante. E Donald Trump arrastou lentamente o nome de Mitt Romney pela lista de candidatos, deixando queimar em lume brando um dos membros do Partido Republicano que mais lhe fez frente durante as eleições primárias e até na campanha contra Hillary Clinton.
Mas os ventos que sopram da "Casa Branca-sombra" em que se transformou a Trump Tower, em Manhattan, empurraram para a linha da frente um até agora relativamente desconhecido milionário chamado Rex Tillerson – quem lê tudo e mais alguma coisa sobre o mundo do petróleo talvez se tenha cruzado com o nome dele no topo da gigante ExxonMobil mas, para a maioria dos cidadãos, Tillerson, Tillerson, ora bem Tillerson, é um nome que pouco dizia até ao último fim-de-semana.
Ao contrário da norma em eleições passadas, a composição da futura Administração Trump tem passado muitas vezes por um teste público – o Presidente eleito escreve no Twitter o nome de um candidato ou de uma candidata, e depois as reacções públicas encarregam-se de contribuir para a redução da lista.
E ninguém mais do que Mitt Romney sentiu isso na pele – graças à sua oposição a Trump durante a campanha, os eleitores mais fervorosos dizem dele o que nenhum cristão diz sobre Judas, e fizeram sentir ao seu futuro Presidente que queriam ver Romney bem longe de Washington.
Visto como o cargo mais importante de toda a Administração a seguir ao Presidente, o secretário de Estado é a cara da política externa norte-americana no mundo, e essa cara é actualmente a de John Kerry, antigo vice-governador e senador pelo estado do Massachusetts e ex-presidente da Comissão de Relações Internacionais do Senado. Por lá passaram também Hillary Clinton, depois de dois mandatos no Senado e uma primeira corrida falhada à Casa Branca, em 2008; Condoleezza Rice, depois de ter sido conselheira de segurança nacional de George W. Bush; e Collin Powell, depois de um ano como conselheiro de Ronald Reagan e quatro como chefe do Estado-maior das Forças Armadas no Governo de George W. Bush, só para falar dos mais recentes.
Negócios com a Rosneft
Para quebrar a tradição da experiência em cargos de governação (e para manter a tradição que inaugurou ao nomear responsáveis sem esse passado), Trump anunciou como secretário de Estado Rex Tillerson, actual presidente executivo da ExxonMobil e ex-líder da Boy Scouts of America, uma das maiores organizações juvenis dos Estados Unidos e que, ao fim de 105 anos de vida, em 2015, começou a aceitar homossexuais em todos os postos.
Pouco se sabe sobre a vida pessoal de Rex Tillerson, ao contrário do que acontece com líderes de outras gigantes do mundo empresarial, geralmente mais dados à exposição pública. Mas sabe-se que tem um potencial conflito de interesses pela frente, e que foi o primeiro nome avançado por Donald Trump a quem senadores do Partido Republicano torceram o nariz – as principais nomeações do Presidente eleito têm de ser aprovadas no Senado, após um processo de audições, e o Partido Republicano tem uma maioria de 52-48, pelo que é preciso ter quase toda a gente a remar para o mesmo lado para que um nomeado de Donald Trump não bata com o nariz na porta. Em caso de empate, desempata o vice-presidente dos EUA, que é, por inerência, presidente do Senado.
O que leva esses senadores a torcerem o nariz são as ligações do próximo secretário de Estado à Rússia de Vladimir Putin. Até agora, os mais vocais foram John McCain e Marco Rubio – não disseram que vão votar contra se Trump nomear Tillerson, mas as primeiras palavras indicam tudo menos uma aprovação.
"Tenho problemas óbvios sobre a relação dele com Vladimir Putin, que é um rufia e um assassino, mas é claro que vamos ter audições, e esse e outros assuntos vão ser avaliados. Só depois poderemos decidir se votamos a favor ou contra", disse o senador do Arizona na CNN, no sábado.
Já o senador da Florida disse o que pensava através do Twitter: "Ser-se 'amigo de Vladimir' não é um atributo que espero encontrar num secretário de Estado."
A medalha da Ordem da Amizade atribuída por Vladimir Putin ao próximo secretário de Estado norte-americano foi-lhe colada ao fato após anos e anos de negócios e de relações de grande proximidade com o Presidente russo e o com o seu amigo e conselheiro Igor Sechin, o presidente executivo da gigante estatal do petróleo Rosneft.
Em 2011, a ExxonMobil e a Rosneft fecharam um negócio para a extracção de petróleo no Árctico – uma tarefa muito dura, mas que foi ficando menos difícil devido ao degelo provocado pelo aquecimento global. Ainda assim, a Rosneft precisava da tecnologia da ExxonMobil para apressar as operações, e a ExxonMobil via abrir-se-lhe as portas de um novo e gigantesco filão de petróleo.
Os problemas começaram quando a Rússia invadiu a península da Crimeia, na primeira metade de 2014, e quando estalou uma guerra civil no Leste da Ucrânia – com as sanções impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia à Rússia, o negócio ficou a patinar e a ExxonMobil reportou perdas de mil milhões de dólares.
Como presidente da ExxonMobil, Rex Tillerson combateu contra as sanções, fazendo visitas à Casa Branca mas também a Moscovo, com o objectivo de aligeirar as sanções, sempre más para os negócios. Os seus críticos temem agora que o mesmo Rex Tillerson não consiga atirar para trás das costas os seus 41 anos na ExxonMobil, os últimos nove como presidente executivo, e que mantenha o mesmo pragmatismo, fazendo tábua rasa da política norte-americana em relação à Rússia nos últimos anos.