Zika não deixa OMS descansar à medida que atinge mais países
Tailândia e Singapura anunciaram surtos. Organização Mundial da Saúde recomenda práticas de sexo seguro durante seis meses para quem esteve em locais onde há transmissão do vírus.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) ainda não desceu o estado de alerta associado à epidemia do vírus Zika na última grande reunião sobre a doença, no início de Setembro. “Devido à contínua expansão geográfica e às falhas consideráveis na compreensão do vírus e das suas consequências, a infecção pelo vírus Zika (...) continua a ser uma Emergência de Saúde Pública de Preocupação Internacional”, lê-se num documento da OMS.
Não é de estranhar, por isso, que as notícias sobre a epidemia continuem a surgir diariamente. Parte delas são sobre a sua expansão. Nesta terça-feira, o Ministério da Saúde do Governo da Tailândia anunciou, pela primeira vez, que foram detectados 200 casos de pessoas infectadas com o Zika desde o início do ano. “Nas últimas três semanas confirmámos uma média de 20 casos por semana”, disse Suwannachai Wattanayingcharoenchai, porta-voz do Ministério da Saúde, à agência Reuters.
Estes novos casos num país do Sudeste da Ásia podem ser um reflexo do actual esforço mundial para se detectar e conhecer melhor esta doença que, há pouco mais de um ano, fazia parte do vocabulário de um reduzido número de pessoas.
A principal forma de se ser infectado pelo vírus Zika é com uma picada de um mosquito infectado do género Aedes. Entre os mosquitos deste género, o mais famoso é o Aedes aegypti, que transmite a febre da dengue, outra doença viral. O Aedes aegypti vive nas regiões tropicais de todos os continentes.
No Outono do ano passado, o Zika, até então desconhecido no Brasil, começou a ser uma fonte crescente de preocupação devido a uma quantidade anormal de bebés que nasceram com microcefalia naquele país. Desde então, a ligação entre a infecção do vírus em mulheres grávidas e casos de bebés em que o cérebro não crescia normalmente foi sendo apoiada com provas científicas. Até 27 de Agosto, já se contabilizaram 1857 casos de microcefalia associados ao Zika no Brasil, segundo a OMS.
O vírus chegou ao Brasil vindo das ilhas do oceano Pacífico e acabou por se espalhar pela América do Sul, a América Central e já saltou para a Florida, nos Estados Unidos. Desde 2015, há 55 países que anunciaram ter um surto do vírus. Há outros 17 que já se tinham deparado com a mesma situação deste 2007. Muitos deles no Sudeste Asiático. Mas tal como a Tailândia, que agora divulgou os 200 casos, também Singapura só recentemente é que anunciou casos de Zika. O primeiro foi a 27 de Agosto. Desde então, o número aumentou para 300.
“Este vírus pertence à linhagem asiática e provavelmente evoluiu da estirpe que estava a circular no Sudeste Asiático”, lê-se no último relatório da OMS, da semana passada, depois de se ter obtido a sequência do genoma do vírus. “Estes casos recentes em Singapura não parecem resultar de uma importação da estirpe do vírus da América do Sul.”
Tudo indica que o vírus Zika seja originário da África, onde foi isolado pela primeira vez em 1947, de um macaco rhesus (Macaca mulatta). No ano seguinte, foi isolado num mosquito do género Aedes e em 1952 numa pessoa, tudo em África. Desde então, o vírus surgiu na Índia e depois no Sudeste Asiático. Mas até 2007 só foram documentados 14 casos de Zika em humanos e nunca se tinha associado a doença a problemas tão graves como a microcefalia.
Efeito no turismo
O anúncio feito nesta terça-feira pela Tailândia surgiu depois de especialistas na área da saúde terem pressionado o Governo tailandês para ser mais transparente e divulgar o risco do país em relação ao vírus. Segundo a Reuters, os especialistas temiam que o Governo não revelasse a situação real do Zika pelo potencial efeito negativo da notícia no turismo. “As pessoas não devem temer visitar as províncias afectadas pelo vírus Zika”, referiu Suwannachai Wattanayingcharoenchai. Para já, a Tailândia não reportou nenhum caso de microcefalia. Mas estão a monitorizar cerca de 25 mulheres grávidas.
Muita da apreensão sobre o vírus deve-se ao desconhecimento sobre a doença. Há uma panóplia de sintomas quando se é infectado pelo Zika. A doença pode ser assintomática, mas pode causar pequenas borbulhas, febre e dores no corpo. Em casos mais extremos, as pessoas sofrem da síndrome de Guillain-Barré — onde os nervos periféricos são atacados pelo sistema imunitário, deixando temporariamente as pessoas com dificuldades de se mexerem. Nos fetos, a microcefalia parece ser o efeito mais grave de uma paleta de problemas no desenvolvimento do sistema nervoso causados pelo vírus.
Esta complexidade alastra-se para a própria presença do vírus no corpo, que torna as pessoas infectadas potenciais transmissoras do Zika. Há provas recentes de mulheres que contraíram o vírus depois de terem tido relações sexuais com homens sem sintomas da doença, mas que tinham o vírus no sémen. Por outro lado, há casos de homens que ficaram infectados após terem tido relações sexuais com mulheres que estiveram doentes com o Zika. Além disso, já foram isolados vírus na urina e na saliva de pessoas doentes. Estes vírus infectaram novas células em laboratório. E os cientistas identificaram material genético do Zika no sémen de um homem 188 dias depois do aparecimento de sintomas da doença.
Por isso, a OMS recomenda que os homens e as mulheres que ficaram doentes com Zika tenham relações sexuais seguras com os parceiros durante seis meses. Mas há novidades para os casos assintomáticos: “O tempo recomendado para práticas sexuais seguras para homens assintomáticos que vieram de regiões onde há transmissão activa de Zika estende-se de oito semanas para seis meses”, segundo um novo documento da organização “Esta recomendação também se aplica agora às mulheres.”