May recusa sistema de imigração defendido pela campanha do "Brexit"
Primeira-ministra diz querer um método que permita ao Governo ter "algum controlo" sobre a entrada de trabalhadores europeus no Reino Unido.
O Governo britânico distanciou-se de uma das principais promessas feitas pela campanha a favor da saída do Reino Unido da União Europeia, ao rejeitar a introdução de um sistema de imigração por pontos, semelhante ao criado pela Austrália. A primeira-ministra, Theresa May, quer que o futuro acordo com Bruxelas permita a Londres ter “algum controlo” sobre a entrada de europeus no país, mas – tal como tudo o que tem a ver com o “Brexit” – remeteu a apresentação de uma proposta concreta para “o devido momento”.
Setenta e três dias passaram desde que os britânicos decidiram, em referendo, que o país deve sair da UE – uma decisão que desencadeou ondas de choque que não se limitam à Europa. O Governo mudou de mãos, a nova primeira-ministra, que favorecia a permanência, repete à exaustão que não haverá recuo, ainda que quatro milhões de eleitores tenham assinado uma petição (que chega nesta segunda-feira ao Parlamento) a pedir um segundo referendo e alguns políticos afirmem que há ainda vias escapatórias.
O que continua a não haver é um plano sobre aquilo que o executivo pretende alcançar nas negociações que começarão depois de Londres invocar o artigo 50.º do Tratado de Lisboa, o que May promete fazer no final deste ano ou no princípio do próximo. Nesta segunda-feira, David Davis, ministro para o “Brexit”, vai ao Parlamento com a promessa de apresentar os primeiros detalhes sobre a posição britânica à partida para as negociações.
No topo das preocupações está o difícil equilíbrio entre os dois principais temas em cima da mesa – o controlo da imigração oriunda dos países europeus e o acesso que Londres irá ter ao mercado único europeu quando formalizar a sua saída. Após semanas de indefinição, May deu a primeira indicação dos seus planos – não ainda o que pretende, mas aquilo que já excluiu. “Aquilo que os britânicos votaram a 23 de Junho foi a introdução de algum controlo sobre o movimento de pessoas da UE para o Reino Unido” e o sistema de pontos “não nos dá esse controlo”, afirmou no final da cimeira do G20, em que a incerteza gerada pela saída britânica da UE esteve em destaque.
O sistema australiano, em que os candidatos são avaliados segundo um conjunto de parâmetros, incluindo as suas qualificações e área de trabalho, é há muito uma das bandeiras do partido antieuropeu UKIP, tendo sido empunhada pelos principais rostos da campanha do “Brexit”, caso dos agora ministros Boris Johnson e Liam Fox. De saída da liderança do partido populista, Nigel Farage, não tardou a acusar a primeira-ministra de “sério recuo” em relação àquela que foi uma das principais razões que levaram os eleitores a votar pela saída.
Mas May invocou a sua experiência como “a ministra do Interior mais tempo em funções” para garantir que aquele método de selecção não iria contribuir para diminuir a imigração vinda da UE. “Quero um sistema em que o Governo seja capaz de decidir quem entra no país. É isso que os britânicos querem”. Que modelo prefere ou que restrições vão ser aplicadas a quem até agora beneficiava da livre circulação é algo que May não avançou – “os planos do Governo para a imigração serão anunciados no devido momento”.
Os líderes europeus repetem que, se não aceitar a livre circulação, Londres não poderá aceder ao mercado único, essencial para sectores como a City, mas May diz estar “optimista” quanto à hipótese de negociar o melhor acordo possível. Na China, e depois de ouvir tanto as preocupações do país anfitrião como do Japão e EUA sobre o impacto internacional do “Brexit”, a primeira-ministra britânica disse que o seu Governo que fazer do Reino Unido o “líder mundial do comércio livre” e revelou que, no decorrer da cimeira, a Índia, México, Coreia do Sul e Singapura já se manifestaram interessados em iniciar negociações com Londres para o levantamento de barreiras alfandegárias. Já antes, o Governo australiano tinha dito que está disponível para começar “conversas exploratórias” sobre um futuro acordo de comércio livre com Londres.