Felipe VI recebe os líderes políticos mas Governo continua longínquo
Os partidos não querem eleições, mas não se adaptaram ainda ao multipartidarismo e não conseguem fazer acordos
É o mesmo filme de há sete meses para cá. O rei Felipe VI começou esta terça-feira as consultas para a formação de um Governo mas continua o anterior quadro de “vetos cruzados” que impossibilitou a formação de uma maioria após as eleições de Dezembro. As eleições repetidas de 26 de Junho mudaram parcialmente a relação de forças, beneficiando o Partido Popular (PP) e enfraquecendo o Podemos e o Cidadãos, mas os líderes ainda não se adaptaram às regras do multipartidarismo. O país está há sete meses sem governo e admite-se que assim será pelo menos até meados de Setembro.
Felipe recebeu os pequenos partidos, prosseguirá as consultas amanhã e, quinta-feira, receberá os quatro líderes que contam: Albert Rivera (Cidadãos), Pablo Iglesias (Podemos), Pedro Sánchez (PSOE) e Mariano Rajoy (PP). Rivera disse que tentará convencer o rei a pressionar o PSOE a abster-se na segunda votação de um governo minoritário do PP, tal como fará o seu partido. Sánchez repetirá o “não a Rajoy”, dizendo que a iniciativa está nas mãos do PP, que deve negociar uma maioria com os seus “próximos ideológicos”, convencendo Rivera a votar “sim” e procurando outros apoios. Desta vez, Iglesias não terá voz decisiva nas negociações, pois uma eventual “maioria de esquerda” deixou de estar na agenda política.
Rajoy tem mostrado a habitual passividade. Declarou que não vê possível uma votação de investidura no início de Agosto, porque não tem apoios. O que lhe interessa, além de forçar o “sim” do Cidadãos, é garantir a abstenção do PSOE. A grande curiosidade é saber se Rajoy voltará a dizer “não” ao rei se este o convidar a tentar formar Governo.
O bloqueio
Após as eleições de 26 de Junho, o PP é o partido melhor posicionado para formar Governo, mas até agora foi incapaz de encontrar aliados estáveis, explica o politólogo Jorge Galindo. “No entanto, a verdade é que os eleitores colocaram o PSOE como eixo da dinâmica política”, ou seja, a sua posição é decisiva para aprovar ou recusar qualquer solução.
Acrescenta Galindo: “Na prática, nenhum dos quatro se quer mover demasiado por medo de perder em relação aos seus rivais imediatos. As implicações desta timidez vão muito para lá da investidura.” Ou seja, condicionarão o funcionamento do próximo Congresso dos Deputados e a sua actividade legislativa.
O melhor exemplo é a relação PSOE-Podemos. Ambos competem por se erigir em chefes da oposição ao Governo do PP. Iglesias não esconde o desejo de que o PSOE facilite a investidura de Rajoy, para depois o poder denunciar como “muleta do PP”. Aposta que, se o não fizer em Agosto, será forçado a fazê-lo em Setembro, para não ser responsabilizado por terceiras eleições. Diz Iglesias: “Isso convertê-lo-á, de facto, em sócio da direita.”
O PSOE nada tem a obstar a um novo governo de Rajoy desde que possa votar contra ele. É o dilema em que, com um partido dividido, Sánchez se encerrou ou deixou encerrar. Também o Cidadãos quer forçar a abstenção do PSOE para não ficar sozinho ou poder depois responsabilizá-lo pela repetição de eleições.
Este impasse tem levado a reacções de indignação. O El País escreveu há dias um editorial intitulado “Que se vayan todos. Se os líderes não afastarem já o fantasma de outras eleições devem ir-se embora.”
Segundo Pedro Quevedo, deputado das Canárias, o rei mostrou-se “mais sério” e “preocupado” do que nas anteriores consultas.