Fundos Centerbridge e Lone Star avaliam Novo Banco
Dois fundos de capital de risco juntam-se à Apollo, BCP, BPI e Santander no grupo que pediu acesso a informação sobre o banco. Brexit pode reflectir-se no desfecho do concurso de venda
Os dois fundos de capital risco norte-americanos Centerbridge Partners e Lone Star Funds integram o grupo de investidores que pediu acesso a informação financeira confidencial sobre o Novo Banco. Os restantes interessados já eram conhecidos: o Santander, o BCP e o BPI e a Apollo, outro private equity anglo-saxónico.
O Banco de Portugal (BdP) fixou a próxima quinta-feira, 30 de Junho, como data limite para os seis grupos que foram levantar o caderno de encargos de venda do Novo Banco confirmarem que avançam para a fase seguinte do concurso público, que passa pela entrega junto do Fundo de Resolução de uma oferta de compra vinculativa.
À semelhança do BCP, do Santander e do BPI, os três fundos de investimento norte-americanos terão de dispor de uma licença para operar no sector financeiro (banca ou seguros), um requisito da operação. Em Janeiro de 2015, a Apollo adquiriu a seguradora Tranquilidade ao Novo Banco, que tinha um penhor sobre a companhia do ex-Grupo Espírito Santo (GES). E, nesse mesmo ano, assumiu 80% do banco esloveno Nova Kreditna Banka Maribor. A Apollo já se tinha posicionado para ficar com o Novo Banco (na primeira tentativa de venda) e o Banif, mas acabou afastada.
Por sua vez, o Lone Star Funds detém uma participação (em conjunto com o Crédit Suisse) no Royal Park Investments criado para gerir os activos tóxicos do Fortis, o falido banco belga (um investimento de 6700 de euros). Em Portugal, o Lone Star herdou os centros comerciais Dolce Vita, depois de os adquirir ao grupo espanhol Chamartín Imobiliária. O Centerbridge Partners ganhou em 2015 o controlo do italiano Banca Farmafactoring. Mas na qualidade de investidor de dívida do ESFG (a dona do ex-GES), esteve envolvido na disputa judicial pelo domínio da Tranquilidade, tendo desistido da contestação do penhor financeiro da seguradora a favor do Novo Banco.
Hoje, no BdP e no Novo Banco a mensagem que passa é de confiança e dá-se como provável que o BCP, o Santander, o BPI, a Apollo, o Lone Star e o Centerbridge possam ir mesmo a jogo. Mas só a análise de cada uma das propostas permitirá perceber qual é o verdadeiro propósito de quem as carimbou. É que os grupos podem proteger-se condicionando as suas intenções ao cumprimento de certas condições difíceis de garantir e, assim, na prática uma oferta pode acabar numa não oferta.
Por exemplo, no BPI detectam-se curiosidades. Depois do seu presidente executivo, Fernando Ulrich, ter dado sinal de vontade de estudar a operação, o BPI levantou o caderno de encargos do Novo Banco. Isto passa-se em Lisboa. Porque em Barcelona, sede do CaixaBank, o maior accionista do BPI, o administrador-delegado, Gonzalo Gortázar, afastou o interesse (antes do Brexit) na instituição. Dado o “bom” entendimento que parece existir entre Ulrich e Gortázar as declarações foram interpretadas como uma manobra de diversão ou uma habilidade dos dois banqueiros.
São muitas as interrogações sobre o futuro de uma instituição de transição, sem marca e limitada na sua estratégia. Depois de terem sido injectados 4900 milhões, dos quais 3900 milhões metidos pelo Estado, o banco liderado por Eduardo Stock da Cunha pode ainda necessitar de um reforço adicional de capital à volta dos mil milhões fruto de imparidades por contabilizar. Ou seja: para limpar o balanço ou o comprador se compromete a reforçar o capital naquele montante ou o Fundo de Resolução avança com a verba. Mas o governo já declarou que não o fará.
Entre 2011 e 2015, o Novo Banco/BES inscreveu nas suas contas 9500 milhões de perdas, sendo que 5700 milhões resultam de créditos que não foram (ou dificilmente serão) pagos e 3800 milhões de investimentos tóxicos. O que tem outra tradução: o ex-BES apresentava-se com uma quota de mercado de 18%, mas afinal era bem mais pequeno.
Em 2015 o BdP justificou o insucesso na venda do Novo Banco pelo impacto da crise dos mercados de Xangai, que naquele Verão, levaram a bolsa chinesa a cair 30% em três semanas e a acumular perdas de três biliões de dólares. O timing tinha sido errado.
Mas as críticas à forma como o processo foi conduzido não se fizeram esperar: as contas do banco não estavam totalmente claras; a instituição não tinha sido reestruturada; os critérios do concurso eram rígidos (o banco teria de ser alienado a um só investidor); não havia previsão de disseminação do capital em bolsa; e apenas três fundos foram à final. E houve força política para o BdP passar o banco para a esfera privada antes das eleições legislativas.
O modelo escolhido para voltar a colocar a instituição no mercado é agora mais flexível. Pode haver alienação na totalidade ou em parte e pode ser por via directa ou em bolsa. A um dossier já de si difícil e complexo junta-se outro dado: o Brexit. Ao fixar a data de entrega de ofertas para esta quinta-feira, com apenas uma semana de diferença do referendo à permanência do Reino Unido na União Europeia, o BdP não antecipou o desfecho que abriu um quadro de grande incerteza face ao futuro.
O ministro das Finanças, George Osborne (que se opôs à saída da UE) já quebrou o silêncio para lembrar que a economia britânica é sólida. Nos últimos dias, o presidente executivo do Deutsche Bank (que tem uma grande operação na Grã-Bretanha), o britânico John Cryan, que divide seu tempo entre Frankfurt e Londres, já veio dizer “que o centro financeiro [de Londres] não vai morrer, mas vai ficar mais fraco”. E menos de 24h00 depois de se conhecer o resultado do referendo evaporaram-se 62,4 mil milhões de euros da London Stock Exchange.
Mas a volatilidade nos mercados continuou e os analistas não antecipam o fim o que dificulta uma eventual dispersão do capital em bolsa. E sem uma clarificação do que vai acontecer na UE os investidores tendem a adiar as suas decisões.
Outra consequência do Brexit foi o acentuar das tensões em torno do sistema financeiro europeu o que amplia a desconfiança. As notícias dão conta que o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, já reclamou junto de Bruxelas uma interrupção nas restritivas regras europeias de auxílio do Estado às empresas. Isto, para que possa recapitalizar em 40.000 milhões de euros a banca italiana, infectada com 360 mil milhões de euros de crédito mal parado.
Com os receios a avolumarem-se sobre o futuro da relação entre Bruxelas e Londres e a crescerem as incógnitas sobre o estatuto que será dado à city londrina (responsável por 10% do PIB da Grã-Bretanha) a propensão do capital para olhar para o sistema financeiro diminui.
Um cenário de turbulência que já infectou o sector bancário espanhol de onde têm partido grandes investimentos para o Reino Unido. O Santander é um dos bancos com maior exposição ao Brexit. Nos últimos 12 anos, o grupo da família Botín investiu directamente no sector financeiro britânico cerca de 20.000 milhões de euros. Em 2004, comprou o banco Abbey National por 13.400 milhões e, quatro anos depois, pagou 772 milhões pelas filiais e os depósitos do Bradford & Bingley, entretanto nacionalizado. Antes do final da década fechou acordo com a Alliance & Leicester (A&L) para ficar com a totalidade do capital por 1571 milhões de euros. E em 2010 comprou mais 300 sucursais do Royal Bank of Scotland e sete escritórios NatWest por cerca de 2000 milhões. Investimentos que não contam com activos e passivos em libras dos bancos.
A operação do Reino Unido é responsável por quase um terço dos lucros do grupo Santander, que a 24 de Junho deu uma queda em bolsa cerca de 20%. Tanto quanto o Sabadell, o accionista de referência do BCP, onde possui 5%. O banco catalão fez a sua entrada na Grã-Bretanha em 2015 adquirindo por 2350 milhões de euros o Trustee Savings Bank. Um investimento que foi destacado como elevado, dada a dimensão do Sabadell.
Mas o Brexit não trouxe apenas riscos financeiros, trouxe ainda problemas de natureza política. Na Escócia o voto foi pela continuidade na UE o que abriu espaço a um pedido de consulta popular à permanência na Grã-Bretanhao. Uma decisão que levanta a discussão em torno da independência da Catalunha, com mais instabilidade. E o principal accionista do BPI, o CaixaBank pode ser tentado também a rever detalhes da sua estratégia para Portugal. É que nem o CaixaBank escapou à onda vermelha da passada sexta-feira com uma desvalorização em bolsa de 18,1%.