Dezenas de migrantes desaparecidos em naufrágio ao largo da Líbia

O fluxo de pessoas na travessia do Mediterrâneo voltou a ser maciço "Estamos quase ao nível das ilhas gregas no ano passado", disse um responsável da OIT.

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Sobreviventes de um dos naufrágios a bordo do navio humanitário Aquarius GABRIEL BOUYS/AFP

Dezenas de pessoas estavam ontem desaparecidas no mar Mediterrâneo, depois do naufrágio de mais um barco de pesca sobrelotado ao largo da Líbia. No pedido de socorro que a guarda costeira italiana emitiu para os navios na região alertara para o facto de estarem "350 pessoas na água" — a Marinha anunciou que já tinha resgatado 130 pessoas e que decorriam buscas pelos restantes passageiros.

Com um novo fluxo de refugiados e migrantes, naufrágios, mortes e até um nascimento em alto mar, o Mediterrâneo voltou esta semana ao cenário dramático que conheceu nos últimos anos.

Desde segunda-feira de manhã, as mensagens de alerta sucedem-se nos rádios de navios militares, humanitários e comerciais que navegam ao largo da Líbia: mais de dez mil pessoas foram socorridas em quatro dias — um número nunca visto nesta zona do Mediterrâneo — e só esta sexta-feira foram avistadas 15 embarcações.

"É impressionante, estamos quase ao nível das ilhas gregas no ano passado", quando milhares de refugiados e migrantes chegavam diariamente, via Turquia", diz Flavio di Giacomo, porta-voz em Itália da Organização Internacional das Migrações (OIM).

Mesmo que esta vaga se explique com o tempo ameno — e inesperado nesta altura do ano —, a OIM ficou surpreendida por ver chegar da Líbia barcos de pesca carregados com centenas de pessoas, quando no Outono os traficantes líbios só usavam barcos pneumáticos, onde punham entre cem e 400 pesosas.

Na quarta-feira, a Marinha italiana divulgou as impressionantes imagens de um desses barcos de madeira a afundar-se. Foram salvas 550 pessoas, 48 delas mulheres e 35 crianças. Também foram resgatados cinco corpos da água e, pelos relatos dos sobreviventes, podem estar cem passageiros desaparecidos.

Uma equipa de psicólogos e de assistentes dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) ficou chocada com as histórias dos sobreviventes que chegaram a Porto Empedocle, no Sul da Sicília. "O nosso objectivo era oferecer apoio e identificar as pessoas mais vulneráveis, aquelas que tinham perdido um próximo no naufrágio. Mas quase todos tinham perdido alguém", disse Andrea Anselmi, chefe da missão dos MSF na Sicília.

Um grupo de nove jovens sudaneses explicou que, quando partiram, eram 19. E ainda que as mulheres e as crianças – que, na medida do possível, são sempre as primeiras a serem retiradas das embarcações em perigo – já estivessem a salvo quando o barco afundou, muitas ficaram órfãs e viúvas.

"A dimensão deste [naufrágio] é inacreditavel, disse Anselmi.

A ministra italiana da Defesa, Roberta Pinotti, esteve na quinta-feira em Porto Empedocle para agradecer à Marinha: "Foi uma operação épica, porque para salvar tanta gente em perigo no alto mar é preciso uma grande organização", disse.

Várias famílias candidataram-se à adopção de Favour, de nove meses, que chegou órfão à ilha italiana de Lampedusa depois de outro naufrágio. E o pequeno Destiné Alex emocionou todos, quando nasceu a bordo do navio humanitário Aquarius, que recolheu a sua mãe.

Só que em Itália há quem alerte para os riscos destes sentimentalismos. Matteo Salvini, o chefe da Liga do Norte, aliada da Frente Nacional francesa (extrema-direita), exigiu ser recebido na próxima semana pelo primeiro-ministro, Matteo Renzi (centro-direita).

"Fim à invasão, já basta. Renzi e [o ministro do Interior, Angelino] Alfano são cúmplices de uma tragédia", disse Salvini nas redes sociais, onde convocou uma manifestação para domingo, em Milão.

Esta foi uma semana em que grandes dramas – e algumas alegrias – se sucederam ao largo da Líbia. Mas o grande drama destas travessias do Mediterrâneo dura desde 2013. Desde esse ano, este mar já engoliu nove mil pessoas – e nos navios da Marinha italiana nasceram seis bebés.

Com a vaga desta semana, são já 44 mil os refugiados e migrantes chegados à Europa desde o início do ano, um número muito próximo do do ano passado no mesmo período, 47.400.

Na Líbia, estão concentradas centenas de milhares de pessoas que estão à espera de uma oportunidade de se fazerem ao Mediterrâneo, na tentativa de entrarem na Europa. Os receios de que o fluxo de sírios, afegãos e iraquianos, bloqueados pelo encerramento da rota dos Balcãs, se movesse para a Líbia ainda não se concretizaram. A quase totalidade dos que querem passar da Líbia para Itália são oriundos de países subsarianos.

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