Maduro mobiliza o exército para se preparar para “qualquer cenário”
Forças Armadas vão realizar exercícios militares como resposta às declarações de Álvaro Uribe, que fez apelos a uma intervenção militar na Venezuela. Fábricas "paralisadas pela burguesia" serão nacionalizadas, garantiu o Presidente.
O Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, disse ter ordenado a realização de manobras militares pelas Forças Armadas do país para se prepararem para “qualquer cenário”. A decisão surge dias depois de o ex-Presidente colombiano, Álvaro Uribe, ter apelado a uma intervenção militar na Venezuela.
Para além da resposta militar, Maduro quer abrir um processo nas instâncias internacionais judiciais contra Uribe, por incitar a um “golpe de Estado” no país. “Não sabem do que somos capazes de fazer”, avisou o líder venezuelano. “Vamos defender a Venezuela com a Constituição Nacional e também com os mísseis.” Os exercícios militares foram marcados para o próximo sábado, 21.
Foi nesta sexta-feira, em Miami, que Álvaro Uribe fez um apelo para que “as forças armadas democráticas sejam postas ao serviço da protecção da oposição na Venezuela”.
Para o Governo venezuelano, as declarações de Uribe dão força à sua tese de que existe uma conspiração internacional para derrubar o regime, em conluio com os partidos da oposição. Um cenário semelhante ao da destituição da Presidente brasileira, Dilma Rousseff, é o que Maduro quer evitar. “Estão a ser accionadas medidas a partir de Washington, pedidas e promovidas por faixas da direita fascista venezuelana, encorajadas pelo golpe de Estado no Brasil”, disse o sucessor de Hugo Chávez no poder.
De forma a expandir os poderes executivos, Maduro decretou uma nova extensão do estado de emergência económica no país por, pelo menos, mais três meses. A decisão ainda não foi publicada oficialmente, diz a AFP, e o âmbito da sua aplicação é incerto. A oposição receia que os direitos cívicos e políticos sejam restringidos, a fim de conter as manifestações que têm sido convocadas contra o Governo. É possível que o regime de excepção continue em vigor no resto do ano e em 2017, acrescentou Maduro, com o objectivo de “recuperar a capacidade de produção do país”.
Maduro anunciou igualmente que vai avançar para a nacionalização das fábricas “paralisadas pela burguesia” e que os empresários acusados de “sabotar o país” serão detidos. “Vamos entregar ao poder popular as fábricas paradas no país. Governo e povo unidos, como fizemos durante a greve petrolífera [conjunto de paralisações promovidas pelas empresas petrolíferas entre 2002 e 2003 contra o Governo de Chávez]". Em Abril, a Polar, a maior e mais emblemática distribuidora de cerveja do país, fechou a sua última fábrica por ter falta de acesso a matérias-primas.
A Venezuela vive uma situação de grave crise económica, marcada pela carência de bens essenciais e até medicamentos. Em 2015, a inflação chegou aos 180%, uma das mais elevadas do mundo, e o PIB recuou mais 5%.
No El País, os colunistas Moisés Naím e Francisco Toro traçam um retrato desolador do seu país. “Nos últimos dois anos, a Venezuela viveu um tipo de implosão que quase nunca ocorre num país de renda média, a menos que haja uma guerra: as taxas de mortalidade dispararam; os serviços públicos desmoronam-se, um atrás do outro; a inflação de três dígitos atirou mais de 70% da população para a pobreza; uma onda de crime incontrolável obriga as pessoas a permanecer fechadas em suas casas; os consumidores têm que ficar quatro ou cinco horas numa fila para as compras; os recém-nascidos, e também os idosos e doentes crónicos, morrem por falta de medicamentos e aparelhos simples nos hospitais”, descrevem.
As várias crises que assombram a Venezuela têm pesado sobre o Governo bolivariano. Sondagens recentes revelam um nível histórico de descontentamento e insatisfação com o Presidente: dois terços dos eleitores consideram que Nicolás Maduro deve demitir-se do cargo. E a oposição quer explorar este descontentamento.
No sábado, a Mesa para a Unidade Democrática (MUD, uma plataforma de partidos da oposição) convocou uma concentração em Caracas para pedir progressos no processo de convocação de um referendo ao mandato de Maduro. “Se fecharem a via democrática, não sabemos o que pode acontecer no país”, avisou o líder oposicionista, Henrique Capriles. “A Venezuela é uma bomba prestes a explodir.”
A vitória da MUD nas eleições legislativas de Dezembro abriu caminho a um braço-de-ferro entre a oposição e o chavismo. Apesar de deter a maioria dos lugares na Assembleia Nacional, as tentativas da MUD para acelerar a saída de Maduro do poder têm fracassado. Os sectores afectos ao Governo mantêm uma presença forte em várias instituições do país, como o Supremo Tribunal ou a Comissão Nacional Eleitoral. A oposição conseguiu dar início ao processo de convocação de um referendo para afastar Maduro, mas acusa a CNE de atrasar a validação das assinaturas necessárias.