A normalidade chegou à Madeira
A oposição assume que o Miguel Albuquerque mudou de estilo, mas teme que a "renovação prometida" ainda só se note nos protagonistas.
Sucedeu a quase quatro décadas de Alberto João Jardim e, logo na noite de 29 de Março de 2015, quando se soube vencedor das eleições regionais da Madeira, disse ao que vinha. “Contribuir para o melhor funcionamento da democracia e para o prestígio das instituições”. O primeiro passo do novo governo, que tomou posse a 20 de Abril desse ano, foi dado com a revisão do regimento do parlamento madeirense. O anterior não estabelecia limites de tempo para as intervenções dos membros do governo nas raras ocasiões que iam à Assembleia, e permitia ao PSD monopolizar as sessões tendo em conta o número de deputados que tinha. Com o novo regimento, aprovado por unanimidade, a oposição dispõe de mais espaço para intervir e apresentar projectos, e a mesa da Assembleia, que durante anos esteve vedada aos outros partidos, passou a ser mais plural com dois vice-presidentes de diferentes cores políticas.
Desse regimento, saiu também a presença assídua do executivo no Parlamento. Jardim só lá ia esporadicamente – na apresentação do programa de governo e na discussão os orçamentos regionais –, mas Albuquerque está obrigado a ir ao hemiciclo pelo menos uma vez por mês, para um debate mensal. Ao mesmo tempo, o executivo desencadeou o processo de Reforma do Sistema Político Regional, que vai culminar com a revisão do Estatuto Político-Administrativo da Madeira.
Esta nova forma de estar na política, é aplaudida, mas todos sublinham que se tratou apenas de uma normalização. “Há de facto uma postura diferente no relacionamento com a oposição, mas nada disto é extraordinário. É apenas a normalização das relações democráticas”, ressalva Roberto Almada, coordenador do Bloco na Madeira. António Lopes da Fonseca, presidente do CDS-Madeira, diz o mesmo. “A forma como o presidente do governo se relaciona com a oposição mudou, e isso é de salutar, mas é o normal em democracia.”
No plano externo, as mudanças de ‘estilo’ são também evidentes. Quer com Pedro Passos Coelho, quer agora com António Costa, as relações entre o Funchal e Lisboa têm sido pautadas pelo respeito institucional. Se do governo PSD/CDS, Albuquerque conseguiu 43 milhões de euros através do Fundo de Coesão Regional e negociou o subsídio social de mobilidade para as viagens aéreas entre a Madeira, continente e Açores – o valor máximo a pagar são 86 euros por uma viagem de ida e volta -, de Costa recebeu o apoio para uma candidatura do novo hospital do Funchal a projecto de interesse comum.
As relações entre as duas regiões autónomas foram igualmente normalizadas. Depois de anos de costas voltadas marcados por um clima de confronto entre Carlos César e Jardim, a Madeira e os Açores propõem-se agora a falar a uma só voz tanto em Lisboa, como em Bruxelas. Da Cimeira Insular, que decorreu no arquipélago açoriano, saíram mais do que fotografias e palavras de circunstância, com Funchal e Ponta Delgada a promoverem, desde esse encontro, reuniões bilaterais sobre temas comuns.
Em termos práticos, numa região que saiu a 31 de Dezembro de 2015 de um programa de ajustamento, e onde o desemprego (14,7%) continua a ter a taxa mais elevada do país, Albuquerque começou por reorganizar o sector empresarial da região. As Sociedades de Desenvolvimento, empresas de capitais públicas criadas por Jardim para fintar o limite de endividamento foram fundidas e o património tem sido concessionado a privados.
A tudo isto, a oposição responde com críticas. “Há uma certa frustração, porque as pessoas esperavam mais”, diz Carlos Pereira, líder do PS. “O governo parece estar a governar com o mesmo plano do Dr. Jardim”, acrescenta, lamentando que o desagravamento fiscal prometido não tenha sido concretizado. Edgar Silva, coordenador do PCP-Madeira, vai mais longe e diz que a “renovação prometida” limitou-se aos protagonistas. “O sistema, o regime e as políticas, continuam iguais”, acusa, enquanto Élvio Sousa, secretário-geral do JPP, diz que o “estado de graça” de Albuquerque já acabou, “há muito”.