BE quer fiscalizar enriquecimento injustificado em rendimentos acima de 25 mil euros

Em nova proposta sobre o tema, partido quer que usufruto do património alheio pelos políticos também seja declarado e propõe nova entidade que fiscalize efectivamente a transparência dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.

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Só o Bloco de Esquerda se opõe frontalmente à regularização do lobbying em Portugal Pedro Elias

Quem tiver declarado rendimentos anuais de, no mínimo, 25 mil euros e a Autoridade Tributária (AT) detectar que o seu património aumentou nesse ano pelo menos mais 20% do que isso, incorre na classificação, para efeitos fiscais, de “enriquecimento ilícito”. Se não conseguir justificar como conseguiu esse aumento de património – mobiliário ou imobiliário –, então ele reverterá na totalidade para o Estado. Esta é a proposta que o BE apresentou esta terça-feira na Assembleia da República para combater o enriquecimento ilícito, a par de propostas para aumentar a transparência dos políticos e detentores de cargos públicos - e que acredita haver possibilidades de serem aprovadas até Julho. 

O assunto tem sido recorrente nas últimas legislaturas, o termo andou entre o “ilícito” e o “injustificado” e já teve diploma aprovado mas depois considerado inconstitucional pelos juízes do palácio Ratton. Agora o Bloco de Esquerda volta à carga. “Para efeitos fiscais, considera-se enriquecimento injustificado sempre que se verifique uma discrepância significativa [igual ou superior a 20%] entre o rendimento declarado e o valor dos acréscimo e aquisições patrimoniais imobiliários e mobiliários”, define o BE no projecto de lei que entregou, que especifica estar a falar de um rendimento base para análise de pelo menos 25 mil euros.

O BE classifica como “acréscimos e aquisições patrimoniais” todas as valorizações de bens como títulos, aplicações financeiras, contas bancárias a prazo, direitos de crédito, quotas, acções ou partes sociais do capital de sociedades civis ou comerciais, direitos sobre barcos, aeronaves, automóveis ou bens de consumo e património imobiliário.

O partido quer assim reforçar os poderes da Autoridade Tributária para fiscalizar e agir sobre situações em que detecte desvios. Nesse caso, notifica o contribuinte para dar justificações em, no máximo, 60 dias. E se não o fizer ou a AT tiver dúvidas, comunica o caso ao Ministério Público para apuramento de eventual conduto criminosa. Esse património injustificado será tributado em IRS ou IRC a uma taxa de 100% – ou seja, será perdido para o Estado.

Noutro projecto de lei, o BE propõe a criação de uma Entidade de Transparência dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos que tome a seu cargo as funções actuais do Tribunal Constitucional de coligir a informação sobre o património e rendimentos destes altos responsáveis do Estado.

Se for aprovado, passam a ser obrigados a entregar registo de interesses, rendimentos e património também os titulares dos órgãos executivos das juntas de freguesia (agora são apenas das câmaras e assembleias municipais), das comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas; mas também os membros dos gabinetes dos ministros e secretários de Estado e quem intervenha como consultor, representante ou perito em processo de venda ou concessão. E espera-se que as regiões autónomas possam legislar no mesmo sentido para os membros dos seus executivos.

Essa declaração é entregue no início e de novo até seis anos depois de a pessoa deixar o cargo e sempre que o património aumentar mais de 100 salários mínimos mensais. E deve passar a conter, além dos bens de que essa pessoa é proprietária, também aqueles de que seja “possuidor ou detentor” – que use por empréstimo de amigos ou conhecidos, por exemplo – e tem que justificar tal situação. Sem querer particularizar, Pedro Filipe Soares falou nos casos em que um político “usufrui de um bem acima dos seus rendimentos” e do qual não é o proprietário e este seja, por exemplo, uma entidade sediada numa offshore.

A omissão ou falsa declaração é punida com pena de prisão e perda de mandato. E passa a aplicar-se até mesmo ao Presidente da República, presidente do Parlamento e primeiro-ministro, que estavam a “salvo” até aqui.

No campo das incompatibilidades, como o BE já tinha anunciado há algum tempo, vai impor um período de nojo de seis anos entre o fim das funções de um político ou um alto cargo público e o exercício de um cargo em entidades privadas no mesmo sector de actividade em que teve responsabilidades públicas. Outra restrição é que as empresas em que esses políticos ou altos cargos públicos tenham uma quota de mais de 10% não podem ter qualquer negócio com o Estado. 

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