Que futuro para o único mercado de levante de Lisboa?

Inaugurado em 1949, fica no Bairro das Estacas o único mercado da cidade que é montado e desmontado todos os dias. Para a sua requalificação, a cargo da Junta de Alvalade, o arquitecto Rui Mendes idealizou um "mercado jardim".

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O Mercado de Alvalade Sul tem hoje seis comerciantes DR
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A maquete do "mercado jardim" idealizado por Rui Mendes Pedro Loureiro
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Pedro Loureiro
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O arquitecto Rui Mendes projectou uam estrutura "bonita e funcional" DR

Quando foi inaugurado, às 6h do dia 1 de Julho de 1949, o mercado “provisório” de Alvalade, em Lisboa, registou uma “grande afluência de donas de casa e outra afluência também numerosa de curiosos”. À ocasião, registada nas páginas do Diário de Notícias, não faltou o “director de Serviços de Abastecimento do Município, sr. dr. Almeida de Eça”, que prometeu que procuraria “remediar as possíveis deficiências que porventura se verifiquem”.

Mais de 65 anos depois de ter aberto ao público, com a indicação de que as primeiras instalações seriam apenas provisórias, o equipamento hoje designado como Mercado de Alvalade Sul mantém as suas características originais, que o distinguem aliás de todos os outros da cidade: este é “o único mercado de levante de Lisboa”, o único em que as bancas e os chapéus-de-sol que as cobrem são montados ao nascer do sol, para serem desmontados e retirados algumas horas depois, ao início de cada tarde, numa rotina que se repete diariamente.  

É na Rua Antero de Figueiredo, a umas dezenas de metros da Avenida de Roma, que se realiza, de segunda-feira a sábado, este mercado. Neste espaço, no coração do Bairro das Estacas, obra premiada de Ruy Athouguia e Sebastião Formosinho Sanches, é possível comprar frutas e legumes, peixe, flores e alguma roupa. Ao todo são seis os comerciantes em actividade.

Com a reorganização administrativa de Lisboa, a Junta de Freguesia de Alvalade assumiu a gestão e manutenção do local, cuja requalificação está agora no topo das suas prioridades. A expectativa do seu presidente, André Caldas, é que a obra que vai permitir dar uma nova vida ao mercado seja lançada ainda este ano e fique concluída “no primeiro semestre de 2017”.

A empreitada tem já financiamento assegurado, uma vez que a proposta de requalificação do equipamento, “dignificando o espaço e o respectivo usufruto do espaço público envolvente”, foi uma das vencedoras do Orçamento Participativo de 2014 da Câmara de Lisboa. Caso a verba de 150 mil euros consagrada a este projecto se revele insuficiente, a junta está disponível para “suplementar um pouco” esse valor, garantiu ao PÚBLICO André Caldas.

Mas afinal o que vai ser feito naquele que é o único mercado de levante de Lisboa? Para encontrar a resposta a essa pergunta, a junta de freguesia promoveu em 2015 um processo de discussão pública, que incluiu uma exposição de alguns projectos possíveis para a requalificação do mercado e uma tertúlia. “O que gostaria que fosse feito no Mercado de Levanta - Alvalade Sul?” era a questão no centro do debate.

No relatório que sintetiza esse processo nota-se que o mercado “teve outrora grande expressão e dinamismo, mas acantona-se hoje numa pequena área fronteira ao armazém de apoio”. Além disso, observa-se, “as despesas de funcionamento ultrapassam o triplo das taxas cobradas”. Face a isso, e ao “trajecto longo de declínio”, constata-se que “a solução mais lógica seria a sua extinção, integrando os comerciantes no Mercado de Alvalade Norte, que se situa a curta distância e tem espaço disponível”.

“Era a solução economicista”, diz no entanto o presidente da junta de freguesia, que sublinha com veemência que o aspecto económico “não pode ser o único e exclusivo critério”. Na equação, sustenta André Caldas, devem ser também pesados aspectos como “a preservação da memória”, “a valorização do local” (e o contributo do mercado para “a qualidade de vida das pessoas que ali moram”) e “a dimensão da vida económica da cidade”.

Ainda assim, o autarca do PS reconhece que o mercado “como está não podia ficar”. “Estava no caminho do declínio”, admite, garantindo que tanto ele como os vogais do executivo estão “muito empenhados em mudar isso”. A vitória no Orçamento Participativo, acrescenta André Caldas, “acabou com as dúvidas” sobre se havia ou não “vontade” de se avançar com a renovação do espaço que este ano vai celebrar o seu 67.º aniversário.

Da discussão pública concluiu-se, como se lê no relatório síntese, que “o mercado deve permanecer de levante”, embora se deva promover “uma melhoria franca das condições a que estão sujeitos os comerciantes e clientes”. A “modernização do espaço” e a “melhoria da relação com a envolvente” são outras das pistas apontadas para o futuro do mercado, que se quer também tornar mais atractivo para os turistas, nomeadamente para os que se hospedam nos dois hotéis existentes nas proximidades.

Entre as quatro propostas de requalificação submetidas a discussão pública, a que granjeou mais apoios e que a junta considerou aproximar-se mais do pretendido foi a do “mercado jardim”, apresentada pelo arquitecto Rui Mendes, na qual serão agora incorporados alguns dos contributos da discussão pública.

Ao PÚBLICO, Rui Mendes explica que o programa que idealizou contempla a instalação de uma estrutura “fixa”, mas “relativamente leve e permeável”. No fundo, precisa o arquitecto, está em causa “uma cobertura”, sob a qual será disposto “um conjunto de células de venda, completamente atravessáveis, de um lado ao outro” da estrutura.

A essa estrutura, que segundo diz ainda está por decidir se será totalmente encerrada durante a noite, deverão juntar-se “outras pequenas funções” que não existem no Bairro das Estacas, como estacionamento para bicicletas e sanitários públicos.

Rui Mendes frisa que não está previsto que ao mercado se juntem “outras funções de venda, outros negócios”, embora reconheça que “o bairro precisa que esses negócios voltem a acontecer”. Mas a sua expectativa é que quando “o mercado ganhar consistência” os espaços comerciais que existem nos pisos térreos dos edifícios irão “voltar a ter alguma vida”.

E porquê “mercado jardim”? Porque a intenção do arquitecto é que o pequeno jardim ao lado do mercado seja também “intervencionado”, havendo “uma junção” entre os dois elementos. Rui Mendes acredita que a estrutura que propõe é “bonita e funcional”, permitindo “melhorar as condições” de trabalho dos comerciantes sem impedir que se mantenham “algumas das características do levante”.     

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