Ex-administrador da Ongoing diz que contestou contratação de Silva Carvalho

Ex-director do SIED foi “um óptimo trabalhador”, mas seria “obtuso” ligar a sua ida para o grupo empresarial à obtenção de informações classificadas

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Jorge Silva Carvalho Rui Gaudêncio

James Edward Risso-Gill, padrasto do presidente da Ongoing, Nuno Vasconcelos, revelou esta quinta-feira que se opôs, sem sucesso, à contratação do ex-director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) Jorge Silva Carvalho para o grupo empresarial.

Ouvido como testemunha no julgamento do processo das secretas, este antigo administrador não executivo da Ongoing lembrou que, ao saber que Nuno Vasconcelos queria contratar um amigo que trabalhou nos "serviços de inteligência do Estado", foi contra a admissão de Jorge Silva Carvalho, pois previa que isso iria trazer problemas.

"Naquele ambiente em que a Ongoing aparecia nos jornais, ir buscar uma pessoa com esse tipo de background podia ser desagradável", disse James Edward, observando que discordaria sempre da contratação de "alguém com esse lastro", mesmo que fosse "super-eficiente".

O padrasto de Nuno Vasconcelos reconheceu que Silva Carvalho foi um "óptimo trabalhador" na Ongoing, mas insistiu em que a decisão de o contratar foi "insensata" e reveladora de "falta de bom senso".

Quanto à remuneração de dez mil euros mensais que lhe foi atribuída, o antigo administrador admitiu que era "certamente muito dinheiro", mas que estava em linha com o que se pagava na empresa, onde havia quem ganhasse mais.

Num processo em que o Ministério Público acusa Nuno Vasconcelos de corrupção activa, relacionada com a contratação do ex-diretor do SIED, James Edward considerou absurdo e "obtuso" que o presidente da Ongoing precisasse de contratar Jorge Silva Carvalho para, assim, obter informações privilegiadas fornecidas pelos serviços secretos.

Questionado sobre se a Ongoing tencionava investir 300 milhões de euros na obtenção da concessão do porto de Astakos, na Grécia, James Edward começou por dizer que nunca tinha ouvido “falar de porto nenhum", tendo depois afirmado que "soube mais tarde que houve uma hipotética operação" nesse sentido.

"A Ongoing tinha muitas hipóteses de negócios e os passos às vezes eram maiores do que as pernas. Os resultados estão à vista", desabafou, adiantando que também veio a saber de outras hipóteses de negócios na China, em África e na América do Sul. Sublinhou ainda que quaisquer negócios de maior envergadura, como o de Astakos, teriam necessariamente de passar por si e pela sua mulher, mãe de Nuno Vasconcelos, e que isso não aconteceu.

O ex-diretor do SIED terá, alegadamente, intercedido junto das secretas para obter informações sobre empresários russos ligados ao porto grego.

O julgamento do caso das secretas apura também, numa outra vertente do processo, as suspeitas de acesso ilegal à facturação detalhada do telemóvel do jornalista Nuno Simas.

Por isso, Jorge Silva Carvalho responde não só por violação do segredo de Estado e corrupção mas também por acesso indevido a dados pessoais e abuso de poder. Nuno Vasconcelos está igualmente acusado de corrupção.

A juíza que preside ao julgamento, Rosa Brandão, antevê que as alegações finais possam ocorrer já em Abril próximo, caso o primeiro-ministro responda, até Março, ao pedido do tribunal para que haja levantamento do segredo de Estado em algumas matérias.