Rui Moreira ameaça TAP com boicote nortenho
Conflito da Câmara do Porto com a transportadora aérea passou a envolver o município espanhol de Vigo, cujo alcaide fez queixa de Moreira à União Europeia.
Há uma escalada na “guerra” da Câmara do Porto à estratégia anunciada pela TAP para este ano, no que envolve o Aeroporto Francisco Sá Carneiro, e o presidente da autarquia, Rui Moreira, garante que as duras críticas que tem feito não vão parar. “Não é o momento de inverter a estratégia”, disse esta quarta-feira na reunião do executivo, em que deixou claro que as próximas batalhas podem chegar mesmo a um apelo ao boicote. A polémica já ultrapassou, entretanto, fronteiras, com o alcaide de Vigo, Abel Caballero, a pedir “uma investigação” à União Europeia por causa das declarações de Moreira sobre a futura ligação Lisboa-Vigo da TAP.
Com a garantia de apoio de todas as forças políticas representadas no executivo, Rui Moreira não aceitou a sugestão do vereador Amorim Pereira, do PSD, para que a região pare “de correr atrás do prejuízo” no caso da TAP e se concentre nas companhias que querem, de facto, estar no Porto. “Fazer exigências é uma guerra perdida. Devemos negociar com as companhias aéreas que estão interessadas no Porto: a British Airways, a Lufthansa e as low-cost”, disse o social-democrata. “Ainda não chegou o tempo de nos calarmos e conformarmos. Poderá chegar o tempo de apelarmos à população da Região Norte para não voar na TAP, mas esse tempo ainda não chegou”, contrapôs Rui Moreira.
Referindo-se às recentes alterações ao capital da companhia, que fará aumentar o capital do Estado para 50%, o presidente disse “querer acreditar” que ainda se pode “reclamar alguma coisa”, mesmo defendendo que toda a estratégia da companhia aérea, centrada em Lisboa, tem objectivos bem definidos — construir um novo aeroporto na capital, fazer o TGV e “uma nova Expo do lado sul”. “Isto já não se resolve com a regionalização, isto é um problema de regime”, defendeu o autarca, argumentando: “Temos sido uns carneiros e temo-nos iludido com promessas sucessivas. Lembro o TGV e todas as versões para o Norte. O que se vai construir vai ser Lisboa-Madrid, não tenho dúvidas. O Porto de Leixões está prestes a esgotar a capacidade, mas não é aqui que se vai investir, é no Barreiro. E vão fazer a terceira ponte [sobre o Tejo], não tenho dúvidas. É um objectivo do regime”, disse.
Durante o debate no executivo foi o próprio Rui Moreira a informar os vereadores de que a polémica ultrapassara as fronteiras do país, ao anunciar que o alcaide da cidade galega de Vigo, Abel Caballero, tinha pedido à União Europeia que investigue as declarações do autarca portuense sobre a anunciada ligação Lisboa-Vigo — um anúncio feito na terça-feira pelo governante espanhol e que está reproduzido na edição desta quarta-feira do diário galego Faro de Vigo. “[Caballero] até pode chamar a PIDE”, insurgiu-se Moreira, afirmando que não aceita “lições” do outro lado da fronteira e que mantém as críticas que suscitaram a indignação galega. “A ligação Lisboa-Vigo é um insulto ao Porto e pretende destruir o aeroporto do Porto”, reiterou.
E esta não é a única pedra no sapato do autarca. “Não me conformo com a ponte aérea [Lisboa-Porto]”, defendeu Rui Moreira, declarando aos vereadores que esta ponte aérea – que começa a 27 de Março, com voos de hora a hora, desde as 5h30 e as 22h25 – “é muito interessante para um accionista que tem aviões parados no Brasil e não sabe o que lhes há-de fazer”, numa referência a David Neeleman, proprietário da Azul e um dos donos da TAP. “Não é o interesse da TAP que está a ser privilegiado, quem está a ser privilegiada é a White”, concluiu o autarca.
Os aviões da White Airways vão operar a maior parte dos voos da ponte aérea e são alugados à Azul Linhas Aéreas Brasileiras, a empresa de David Neeleman, que é um dos novos donos da TAP. Rui Moreira questionou se a companhia portuguesa iria agora funcionar em regime de “outsourcing”.
O Estado português vendeu 61% do capital da TAP, a 12 de Novembro de 2015, ao consórcio Atlantic Gateway, liderado pelos empresários Humberto Pedrosa e David Neeleman. A operação foi concluída ainda pelo anterior Governo PSD-CDS, e contra a vontade do PS, que viria a a formar Governo, duas semanas depois do negócio, com o apoio de uma maioria parlamentar de esquerda. Na altura do negócio – que o novo Governo entretanto alterou, com o compromisso de recomprar parte do capital até ficar com 50% para o Estado –, Neeleman prometeu fazer concorrência à Easyjet e à Ryanair, duas companhias low cost. "Vamos fazer uma Ryanair em cada nave", disse o empresário na altura, acrescentando que haveria "tarifas mais baratas".
A 19 de Janeiro foi noticiado que a administração da TAP iria cancelar "rotas deficitárias" de Lisboa e do Porto, cidade que perderia os voos directos de e para Barcelona, Milão, Bruxelas e Roma. O autarca do Porto argumenta que esses voos "deficitários", na verdade, estariam sempre cheios, e criticou a ligação Lisboa-Vigo, porque tira ao Porto todo o tráfego de passageiros oriundos da Galiza e que, a prazo, diz Moreira, representará o fim das ligações intercontinentais a partir do Porto.