Em dois anos desapareceram dez mil crianças à procura de asilo na Europa
Menores podem ter sido capturados por redes de exploração sexual e trabalho forçado. Europol alerta para o crescimento de gangues europeus de tráfico de seres humanos.
Nos últimos dois anos despareceram pelo menos dez mil crianças que procuravam asilo na Europa sem família. É possível que muitas estejam agora nas mãos de redes europeias de tráfico de seres humanos, em crescimento desde o início da maior vaga de refugiados no continente desde a Segunda Guerra Mundial.
O alerta partiu da Europol. É a primeira vez que a polícia europeia tenta calcular o número de crianças em risco de entre as dezenas de milhares que chegaram nos últimos meses em busca de asilo. Segundo a Europol, ao longo do último ano e meio desenvolveram-se grandes e sofisticadas redes europeias de tráfico humano. Operam sobretudo em países como Alemanha ou Hungria – o primeiro é o destino mais popular para quem chega à Europa, e o segundo foi um dos principais pontos de passagem até meados do último ano. Nestes países já foram desmantelados vários gangues de exploração sexual e trabalho forçado de migrantes. Menores e adultos.
“Há prisões na Alemanha e Hungria em que a vasta maioria dos prisioneiros está lá por actividade criminosa relacionada com a crise dos migrantes”, alerta o director da Europol, Brian Donald, em entrevista ao semanário britânico The Observer – do grupo do diário The Guardian.
É difícil saber quantas crianças foram capturadas por redes como estas, ou até quantas estão ainda desaparecidas. O número redondo revelado este domingo representa os desaparecimentos confirmados por serviços de Estado: ou seja, de menores que se registaram num qualquer país como requerentes de asilo sem acompanhantes e que as autoridades não conseguem agora encontrar.
Algumas destas dez mil crianças podem ter seguido caminho ou encontrado os seus familiares, desaparecendo assim dos lugares onde foram registados. Mas é também possível haver mais do que dez mil menores desaparecidos na Europa. A Europol calcula que, só no último ano, 27% das chegadas tenham sido crianças – o que corresponde a 270 mil menores requerentes de asilo. Destas, a organização Save the Children diz que 26 mil chegaram sem família.
Nas palavras de Brian Donald : “Não é despropositado dizer que procuramos mais de dez mil crianças. Nem todas estarão a ser exploradas de forma criminosa. Não sabemos simplesmente onde é que elas estão, o que estão a fazer e com quem estão.”
“Quer se tenham registado ou não, estamos a falar de cerca de 270 mil crianças. Nem todas chegaram sozinhas, mas temos provas de que uma grande proporção possa realmente estar desacompanhada”, conclui.
Brian Donald é da opinião de que a estimativa de dez mil desaparecimentos é um cálculo conservador. A polícia europeia calcula que só de Itália tenham desaparecido já cinco mil crianças. E na Suécia, em Outubro, responsáveis da cidade de Trelleborg revelaram terem perdido o rasto a cerca de mil crianças que tinham dado entrada apenas um mês antes.
“Menores desacompanhados vindos de zonas de conflito são de longe a população mais vulnerável: [são] aqueles que chegam sem vigilância dos pais, enviados pela família para a Europa para assentarem e depois receberem a família, ou que então fugiram com outros familiares”, explica Mariyana Berket, da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).
À medida que a crise de refugiados progredia, a Europol começou a aperceber-se de um número crescente de redes de tráfico humano nas travessias pelo Mediterrâneo que eram já conhecidas há anos por funcionarem como gangues de exploração sexual e escravatura na Europa.
“Os [gangues] mais activos no tráfico humano estão agora a aparecer nos nossos ficheiros em casos de tráfico de migrantes”, explica Brian Donald. Segundo diz, há várias organizações humanitárias de apoio a requerentes de asilo nos Balcãs que pedem agora à Europol ajuda para compreenderem melhor as práticas de captura de menores para tráfico.
Brian Donald aconselha mais vigilância. “Estas crianças estão nas comunidades. Se são abusadas, é na própria comunidade. Não estão a ser levadas para o meio de florestas – embora suspeite que algumas o estejam a ser. São visíveis. Como população, devemos estar alerta.”