Um português entre os mortos do ataque terrorista no Burkina Faso

Pelo menos 29 mortos e 150 feridos, de 18 nacionalidades diferentes, é o balanço final do atentando terrorista em Ouagadougou. Um casal de australianos foi raptado no Norte do país, junto à fronteira com o Mali. O terrorismo islâmico chegou a este país, que até agora tinha sido poupado.

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Este foi o primeiro atentado de radicais islâmicos no Burkina Faso, mas não é uma surpresa e acontece num contexto de transição política particular AHMED OUOBA/AFP
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O hotel Splendid e os carros à frente, destruídos pelo fogo REUTERS

Pelo menos 29 mortos e 150 feridos, de 18 nacionalidades diferentes — incluindo um cidadão português —, é o balanço final do atentando terrorista em Ouagadougou. Um casal de australianos foi raptado no Norte do país, junto à fronteira com o Mali. O terrorismo islâmico chegou a este país, que até agora tinha sido poupado.

O ataque começou no café Capuccino, quando estava cheio de ocidentais. Metralharam a esplanada, o interior do estabelecimento, lançaram granadas de gás, e tudo começou a arder. Os clientes e empregados do café de Ouagadougou, a capital do Burkina Faso, passaram 45 minutos escondidos na sexta-feira à noite. Quando não já podiam respirar, tinham de tentar fugir. “Os terroristas abatiam-nos a tiro”, contou ao Libération Jérémie Bangou, que conseguiu sair só com ferimentos. “Havia tantos feridos e mortos… Tivemos de passar por cima deles.”

O mortífero atentado na capital deste país da África Ocidental, que fez pelo menos 29 mortos, de 18 nacionalidades (dois serão franceses), e 150 feridos, segundo o embaixador francês em Ouagadougou, não ficou por ali. Os terroristas passaram para o hotel Splendid, logo ao lado. Incendiaram o hall de entrada, fizeram reféns e barricaram-se nos andares superiores.

A secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas informou na noite deste sábado que no hotel atacado estavam dois portugueses, tendo um deles morrido. A informação foi transmitida ao Governo pelas autoridades francesas e recolhida pelos serviços consulares de Portugal no Senegal. 

A vítima mortal, um luso-francês, residia em França e estava em Ouagadougou ao serviço de uma empresa privada francesa. Já o segundo português que se encontrava no hotel Splendid à hora do ataque estava no país como consultor da União Europeia.

França tem uma base militar nos arredores da cidade, que dá apoio à operação Barkhane, que combate os jihadistas no Sara. Por isso, tropas especiais francesas e norte-americanas deram apoio à reconquista do hotel. O assalto ocorreu pelas 2h00, mas durou toda a noite, porque percorreram o edifício, quarto a quarto – são 147. E alguns estavam armadilhados.

Conseguiram escapar 126 reféns. “Foi horrível, as pessoas estavam no chão e havia sangue por todo o lado. Ouvíamo-los falar e eles disparavam contra os feridos”, explicou à AFP Yannick Sawadogo, uma das pessoas que fugiu do hotel.

Pelo menos três terroristas foram mortos no Splendid, mas de manhã outro hotel, o Ybi, foi cercado, porque outro terrorista se teria refugiado ali. As informações são desencontradas, mas esse atacante terá sido morto. Algumas testemunhas dizem que entre os atacantes haveria mulheres.

Ou então que alguns eram muito jovens. "Eram crianças. Quando disparavam, parecia que as armas os empurravam para trás, por serem tão pesadas", contou ao jornal Le Monde Jérémie Bangou, de 28 anos, que ficou ferido na mão no Café Cappuccino.

O ataque foi reivindicado pela Al-Qaeda no Magrebe Islâmico (AQMI), que atribuiu a autoria operacional ao grupo Al-Mourabitoune, liderado pelo argelino Mokhtar Belmokhtar. Em Novembro, também num hotel de luxo no Mali, dois atacantes mataram 20 pessoas, incluindo americanos, russos e chineses, num atentado reivindicado pela AQMI e por Belmokhtar.

Este foi o primeiro atentado de radicais islâmicos no Burkina Faso, mas não é uma surpresa: era esperado, tanto pela posição geográfica do país, como por o país dar apoio à luta contra o jihadismo no Sara, e pela queda, em 2014, do regime do Presidente Blaise Compaoré, que tinha tomado o poder pela força há 27 anos. “Campaoré acolheu os islamistas argelinos expulsos de França por Charles Pasqua, e foi várias vezes intermediário em situações de reféns. Foi interlocutor destes grupos islâmicos. Agora que não está no poder, estes grupos já não têm motivos para não atacar”, disse ao Libération o jornalista Lemine Ould Mohamed Salem, especialista em AQMI.

O Burkina Faso faz fronteira a Norte e Leste com dois grandes países – o Mali e o Níger – onde os militantes islâmicos usam o deserto do Sara para se esconderem e também para múltiplos tráficos, com os quais se financiam. E é uma óbvia área de expansão. “Um grande contingente do Burkina faz parte da missão da ONU no Mali, a Minusma. Isso torna o país um alvo”, comentou à AFP Cynthia Ohayon, analista do Internacional Crisis Group em Dakar.

Sinal disso é o rapto, também neste sábado, de um casal de australianos, no Norte do Burkina Faso, perto da fronteira com o Mali, reivindicado pelo Emirado do Sara – outro grupo afiliado ao AQMI, diz a AFP.

Estes ataques acontecem num contexto político particular: o da transição democrática. O Governo tomou posse há dois dias, e o Presidente há duas semanas, salienta Ohayon. “As eleições correram bem, está a terminar a transição de um regime semi-autoritário para a democracia. Isto faz do país um símbolo de progresso. É o género de símbolo que estes grupos querem destruir.”

 

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