UE quer negociar reformas com Londres sem mexer nos tratados
Primeiro-ministro britânico divulga esta terça-feira o que quer de Bruxelas para defender permanência do país na União Europeia. Avisa que o Reino Unido não precisa da UE para sobreviver
A hora das negociações aproxima-se e, depois de muitos meses a denunciar a “chantagem” britânica, Bruxelas e os parceiros europeus procuram agora uma forma de aceitar o essencial das propostas de Londres para a reforma da União Europeia sem ter de reabrir a discussão sobre os tratados. Na véspera de tornar públicas as suas exigências, o primeiro-ministro David Cameron disse que o Reino Unido “pode muito bem sobreviver fora da união”, mas garantiu que se for bem-sucedido na renegociação, vai “atirar-se de cabeça” em defesa do “sim” à permanência na UE.
A prioridade, adiantam responsáveis comunitários ouvidos pelo jornal espanhol El País, é permitir que Cameron reivindique vitória no braço-de-ferro que ele próprio criou quando, há já dois anos e meio, prometeu referendar a presença britânica na UE. “O nosso objectivo é ganhar [o referendo], mas para isso ele tem de ganhar a negociação”, resumiu uma das fontes.
Depois das negociações que no Verão evitaram, in extremis, a saída da Grécia do euro e conscientes de que a crise de refugiados está a dividir como nunca a UE, os líderes europeus querem afastar tanto quanto lhes for possível o cenário da saída britânica. Mas por causa destas crises, os líderes europeus querem, a todo o custo, evitar embrenhar-se uma longa discussão sobre a revisão do Tratado de Lisboa.
Londres, que ainda no domingo afirmou que não aceitaria “mudanças cosméticas”, deu a entender que se contentaria com uma revisão simplificada dos tratados, em que a um acordo unânime dos Estados-membros se seguiria a ratificação do novo texto apenas pelos parlamentos nacionais.
Em Bruxelas, no entanto, ganha força uma hipótese mais minimal – um acordo político, ratificado pelo Conselho Europeu e juridicamente vinculativo, com a promessa de que as reformas acordadas serão anexadas aos tratados numa futura revisão. O precedente foi aberto em 1992, quando a UE aceitou que a Dinamarca, que tinha acabado de chumbar o Tratado de Maastricht, se excluísse das políticas de defesa, justiça e interior, e lhe permitiu ficar de fora do euro. O primeiro-ministro britânico, recorda a AFP, disse em Julho que poderia contentar-se com tais garantias escritas, mas é incerto se as reformas que propõe podem ser feitas sem rever as leis fundamentais.
O que Londres pretende ao certo está escrito, ainda que de forma não sistemática, na carta que enviou a Donald Tusk, o presidente do Conselho Europeu, e que será tornada pública esta terça-feira – a tempo, espera Londres, de ser discutida na cimeira europeia de Dezembro, o que em caso de acordo permitiria antecipar o referendo para 2016.
Sabe-se, porém, que são quatro as reivindicações centrais: a garantia de que o reforço da zona euro não põe em causa a igualdade e autonomia dos países que não aderiram à moeda única; um alívio da regulamentação europeia para aumentar a competitividade; a isenção britânica do princípio de um reforço da integração europeia; e, mais problemática, uma moratória de quatro anos no acesso dos imigrantes europeus às prestações sociais.
“É possível resumir esta renegociação a uma palavra – flexibilidade”, disse Cameron, durante uma reunião da confederação patronal em que quis desmontar os argumentos “falsos” tanto dos que defendem a saída como os que querem a permanência, a qualquer custo, do Reino Unido. Assegurando (para contentamento dos eurocépticos) “não ter qualquer ligação emocional” com a UE, o líder conservador prometeu aos empresários (receosos de uma eventual saída) que estará sem reservas ao seu lado na defesa da permanência “se esta for uma negociação bem-sucedida”.