O regresso ao futuro de Ana Salazar

Três anos depois de perder o direito ao seu nome enquanto marca, a pioneira da moda portuguesa apresentou esta quinta-feira uma nova colecção em Lisboa.

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Fotos Nuno Ferreira Santos
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Ana Salazar está a viajar Back to the Future. Esta quinta-feira, apresentou em Lisboa uma colecção-cápsula de pronto-a-vestir de autor de edição limitada que recupera as suas cores, reinventa “muitos detalhes” que há mais de 30 anos são seus e têm a sua marca – não a marca Ana Salazar, mas uma nova etapa da marca Ana by Herself, que criou há dois anos.

Ana Salazar é um caso único na moda portuguesa, não só por ser uma das pioneiras neste sector no país, mas também por ter perdido o direito ao seu nome enquanto marca há três anos. Isto não é (só) um comeback, é uma evolução na continuidade.

Num desfile coordenado pelo produtor Paulo Gomes e com 15 manequins num evento “só para clientes, ou para clientes potenciais” e imprensa, a colecção para este Inverno e venda imediata (ou em atelier) “recupera pequenos elementos da linha contínua do conceito do criador”, explicou Ana Salazar na manhã antes do evento. Cerca de 100 convidados, entre os quais a fadista Mariza, a escritora e jornalista Clara Ferreira Alves, o cantor Paulo Gonzo, o manequim Luís Borges, a directora do Mude Bárbara Coutinho ou a presidente da Experimenta Design Guta Moura Guedes, viram passar jóias de Valentim Quaresma sobre o negro de Ana Salazar.

Um simples vestido preto que nada tem de simples, cortes assimétricos e os obrigatórios fechos Ana Salazar, um estampado em fundo e o toque sedutor da lingerie champanhe num hotel da Baixa de Lisboa em ambiente cocktail. Mulheres cujos blusões de pele carregam a modernidade no peito folgado, ou nas costas abertas por um fecho circular. Dezasseis conjuntos depois, Ana Salazar agradeceu aos convidados com a colaboradora de sempre Cristina Barradas pelo braço, no final.

Nas roupas, Ana Salazar conta histórias sobre o espírito do tempo que vive e a própria história da decana da moda de autor portuguesa é bem conhecida. Resuma-se: abriu a loja Maçã, em 1972, com roupa de Londres; em 1978, cria a marca Harlow e, quatro anos depois, lança-se em nome próprio; em 1985, tem loja em Paris e vende para capitais do mundo, faz fardamentos, cerâmicas, perfumes e acessórios; em 2009, um acordo de cedência de capital com João Barbosa e Luís Aranha (que se afastaria em 2011) atribui-lhes 74% do capital da empresa e, "num segundo momento, a totalidade do capital", escreveu Ana Salazar em Fevereiro de 2012, quando anunciou o corte com a marca com o seu nome.

Um ano depois, criava a Ana by Herself, indo das malhas à venda em lojas multimarca, ou na loja da filha na Avenida de Roma, em Lisboa, ao desenho de fardas para o Hotel Farol Design de Cascais e mais recentemente vestindo a Filarmónica de Palmela. “A minha paixão é a moda e quando deixar de o fazer é porque morri”, diz ao PÚBLICO numa sala de chão de mármore com vista para as Amoreiras. Pelo caminho ficou a Ana Salazar Lda., que entrou em insolvência com dívidas de 3,5 milhões de euros e aderiu ao Processo Especial de Revitalização em 2013.

Aos 74 anos, Ana Salazar fez a colecção Back to the Future com “investimento próprio”, entre moldes, tecidos e confecção em outsourcing – é uma colecção de “peças de edição limitadíssima”, que a designer espera venha “abrir portas para algo novo”. Quando fazia desfiles sazonais, quando tinha presença internacional a solo ou com os novos sócios, chegou "a fazer 40, 50 peças” de cada modelo, nota. O plano do (regresso ao) futuro são mais eventos redimensionados como este, “que podem passar pelo vestuário ou acessórios e eventualmente pela moda de homem”.

Sobre a marca Ana Salazar, a criadora Ana Salazar não guarda mágoas. Gostava de voltar a unir as duas faces da moeda, mas, para tal, precisa de parceiros ou investidores. “Sou e não sou sentimental. Tento ser lúcida – e só por uma questão sentimental não vale a pena” tentar recuperar a marca sem capacidade financeira própria. “Só se tiver parceiros e se fizer sentido”, diz, embora frise que considera que a imagem da marca com o seu nome é indissociável da sua fundadora. 

As marcas da Ana Salazar Lda. foram postas à venda pelo administrador de insolvência – que o PÚBLICO tentou contactar sem sucesso até ao fecho desta edição por 300 mil euros, e o dia 6 de Outubro era a data limite para a recepção de ofertas. Segundo Ana Salazar, a Ana Salazar Lda. continua à venda, e por 200 mil euros. 

Sobre a decisão de cedência do capital da sua marca, diz sem arrependimentos: “Fiz o que devia fazer”. É o cenário internacional, “os criadores nunca estão sozinhos, porque um criativo não é um bom gestor”. Durante algum tempo, tudo parecia, e à sua equipa e colaboradores, “normal”. Mas depois foi “a má gestão”, diz, que levou ao declínio da marca. Os seus antigos sócios acrescentaram, em declarações públicas nos últimos anos, a crise financeira, o insucesso das vendas e a ausência de investidores. “Não sou saudosista”, diz Ana Salazar, aos 74 anos e a preparar-se para um dia de desfile e de entrevistas. “Mesmo no presente, estou sempre a pensar no futuro”.

 

  

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