Nova desvalorização do yuan aumenta pressão nas empresas exportadoras da UE

China volta a depreciar a moeda e afecta bolsas mundiais.

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Acções da VW cairam 6,8% em dois dias AFP / TOBIAS SCHWARZ

Nesta quarta-feira, o banco central chinês fixou a taxa diária do yuan face ao dólar em 6,3306, o que significa um ajuste de 1,6%. Já na terça-feira o yuan tinha sido desvalorizado em 1,9%, passando para uma taxa diária de 6,2298 yuan face ao dólar, quando na segunda-feira o preço imposto se fixava nos 6,1162.

A mexida na taxa de referência foi recebida com surpresa pelos mercados, mas o BPC anunciou que não iria repetir a medida no futuro. Um dia depois, Pequim voltou a depreciar o yuan, levantando preocupações sobre a performance da economia chinesa. 

À Reuters, um membro não identificado de um think-tank chinês que aconselha membros do governo disse que o yuan tinha ainda margem para perder um acumulado de 10%. “Deve haver depreciação suficiente, de outra forma não será possível estimular as exportações”, afirmou.

Esta quinta-feira, o BPC vai dar uma conferência de imprensa, ao longo da qual são esperados mais esclarecimentos.

Pequim estima que a economia cresça a um ritmo de 7% em 2015, o mais baixo em décadas, mas uma nova depreciação da moeda levanta preocupações sobre a capacidade de o país atingir essa meta. Nesta quarta-feira, os indicadores tornados públicos mostram que o desempenho da economia voltou a desiludir, com um crescimento de 6%.

Na quarta-feira, as principais empresas exportadoras para aquele país voltaram a acusar o cenário desanimador e viram as suas cotações em bolsa cair. O gigante asiático constitui o segundo maior mercado de destino dos produtos europeus, apenas atrás dos Estados Unidos. De acordo com números do Eurostat, a China foi o destinatário de 14% da indústria exportadora da União Europeia. Com nova desvalorização, a pressão acentuou-se. 

Na análise à surpreendente medida do BPC, as consequências previsíveis da queda do yuan passam pelo impulso das exportações, com os preço dos produtos chineses a diminuir, por oposição ao encarecimento dos produtos importados, o que reduz o poder de compra dos chineses.

Com a emergente classe média chinesa a perder poder de compra, é previsível que se registe uma quebra na procura por produtos de luxo, carros, tecnologia (entre outros) que a China ia adquirir principalmente nos mercados europeu e norte-americano. As últimas duas sessões do índice Euro Stoxx 50 confirmam esta lógica e espelham o receio dos investidores.

A liderar as perdas na sessão de quarta-feira estavam a Unilever (produtos de grande consumo), a descer 6,31%, e a LVMH (holding especializada em produtos de luxo, responsável por marcas como Louis Vuitton ou Moët et Chandon) a cair 5,46%. Todas as empresas deste índice fecharam o dia em terreno negativo. As grandes companhias europeias beneficiavam de um euro mais enfraquecido face ao yuan, cenário que se inverte com a intervenção do BPC.

Com a venda de carros no mercado chinês acelerar para uma queda de 6,6% em Julho, depois de já ter declinado 3,4% em Junho, a indústria automóvel também perde na bolsa. A Daimler (Mercedes, Smart) foi penalizada em 4,87% na sessão desta quarta-feira, enquanto o grupo Volkswagen (Volkswagen, Audi, Bentley, Bugatti) viu a cotação diminuir 3,26% (em dois dias foi de -6,8%, ou 13 euros).

Paris, Frankfurt, Madrid, Milão e Londres. As principais praças europeias encerraram em queda, arrastadas pelas perspectivas de menores oportunidades de negócio no mercado chinês. Lisboa não escapou às congéneres europeias, com o PSI-20 a fechar 1,13% em terreno negativo.

A fábrica da Volkswagen de Palmela aumentou as exportações 12% em 2014, muito impulsionada pelas vendas para o mercado chinês (à semelhança das grupo alemão). Dos 101 mil carros construídos no ano passado, a Autoeuropa vendeu 24 mil para a China, o seu maior destino fora da União Europeia.

No caso de Portugal, apesar do aumento das vendas para a China (onde o impulso da Autoeuropa ajudou), o défice comercial tem crescido. No primeiro semestre deste ano, estava nos -395 milhões de euros, mais 13% face a idêntico período de 2014. Com os recentes desenvolvimentos, é possível um agravamento deste desequilíbrio.

A moeda chinesa funciona num regime de valorização ou desvalorização deslizante, o que significa que, todos os dias, Pequim fixa uma taxa de câmbio do yuan face ao dólar, permitindo que a moeda flutue 2% ao longo da sessão.

Nos últimos meses, a taxa fixada pelas autoridades chinesas mantinha-se relativamente estável face ao dólar, mas esta intervenção pelo segundo dia consecutivo vem aumentar os receios de que o BPC não esteja apenas a ajustar o valor da moeda ao desempenho do mercado, mas a manter o yuan propositadamente fraco.

Nas reacções oficiais, Comissão Europeia e Departamento do Tesouro avaliaram esta intervenção como positiva, ao considerar que a depreciação do yuan reflecte a queda da economia chinesa. No entanto, os EUA expressaram preocupação quanto à evolução da intervenção estatal chinesa.  

A Reuters dá conta de duas correntes no aparelho governamental. Por um lado, o banco central chinês aponta para alicerçar o crescimento económico no reforço do consumo interno. Por outro, o Ministério do Comércio dá preferência à desvalorização da moeda, que apoia as empresas exportadoras, num modelo de crescimento que tem até agora sido seguida por Pequim. A agência refere que o BPC está sobre pressão do executivo para baixar ainda mais a taxa de referência yuan/dólar nos próximos meses.

Em Setembro, o presidente chinês Xi Jinping realiza a primeira visita oficial aos Estados Unidos, onde será recebido pelo homólogo Barack Obama e onde a política cambial será seguramente um dos temas. Em Outubro, será a vez dos principais responsáveis chineses definirem o objectivo de crescimento económico para os próximos cinco anos.

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