Na Ponte 25 de Abril, um elevador para o turismo ou para Lisboa?
A Infraestruturas de Portugal gostaria de inaugurar o projecto no próximo ano, para coincidir com o 50º aniversário da ponte. Arquitectos e um engenheiro comentam.
Para o engenheiro de estruturas Rui Furtado, responsável pela construção de obras como o Estádio de Braga de Eduardo Souto Moura e a Casa da Música de Rem Koolhaas, é uma oportunidade para olhar para a ponte “com o respeito que ela merece”. “É uma ideia óptima. As pontes sempre foram grandes demonstrações da capacidade de realização do homem. E hoje isso está um pouco vulgarizado”, diz. “As pontes são muito mais do que engenharia. São esculturas. Têm um valor paisagístico. Não conseguimos imaginar Lisboa sem a ponte sobre o Tejo. Isso já é mais do que a função de atravessar de um lado para o outro.”
O projecto que a empresa pública Infraestruturas de Portugal gostaria de inaugurar no próximo ano, para coincidir com o 50º aniversário da ponte, propõe a incorporação de um elevador no pilar de Alcântara, que subiria até ao tabuleiro rodoviário, a cerca de 70 metros de altitude. O que, nota Rui Furtado, promete ser “um miradouro excepcional sobre Lisboa”. “Tem esse lado poético de permitir que as pessoas vão lá acima”, diz.
A Ponte 25 de Abril tem uma posição muito forte na imagem de Lisboa, lembra o arquitecto Diogo Seixas Lopes. “Quando circulamos nos tabuleiros, ela devolve uma imagem muito gloriosa, lindíssima”. O futuro elevador teria “o aditivo lúdico de gozar da vista noutro suporte que não o carro”.
O arquitecto Manuel Graça Dias, que há década e meia projectou com Egas José Vieira um viaduto pedonal para a ponte, encomendada pela Administração do Porto de Lisboa e aprovada pela autarquia, mas que nunca veio a ser executada, não é entusiasta. “Não tem interesse nenhum. É mais uma estrutura feita para o turismo. Sem nenhuma espécie de outra utilidade”, diz. “A ponte tem realmente uma vista magnífica mas isso já é acessível quando se atravessa a ponte. Parece-me um esforço enorme para tão pouco.”
Manuel Graça Dias ressalva que, “ainda por cima, Lisboa é uma cidade de colinas, plena de plataformas altas” que permitem uma visão global. “Não é plana como Berlim e Paris, onde uma estrutura alteada introduz uma mudança.”
O arquitecto José Adrião admite que a incorporação de um novo uso num equipamento já existente “pode ser uma experiência interessante”, pensando no que outras cidades têm feito nesse domínio – cita como exemplo o High Line, um antigo viaduto ferroviário na zona ocidental de Nova Iorque que recentemente foi reconvertido num parque. Apesar das diferenças significativas entre os dois projectos – num caso, trata-se da adaptação de uma infraestrutura a um novo uso, no outro, a incorporação de uma nova utilidade numa infraestrutura que mantém a sua função tradicional – tanto num como no outro essas reformulações, em maior ou menor grau, produzem mudanças na forma como são entendidos pela cidade.
“Acho interessante a possibilidade de subir ao tabuleiro, de criar um pólo interpretativo para a ponte, de ter uma nova experiência na cidade de subir a um ponto muito alto. Devia ir-se mais longe: transformar a ponte numa ponte pedonal, atravessável”, sublinha José Adrião. “Podermos abrir a ponte ao peão, à bicicleta, seria uma forma mais amigável de usar aquela infraestrutura.”
Ideia, de resto, partilhada por Manuel Graça Dias. “Se me dissessem que esse elevador era para levar bicicletas começava a fazer algum sentido. Teria uma função e um rendimento que não é só para ver a vista.”
A Ponte da Arrábida, no Porto, deveria servir como exemplo preventivo, nota o arquitecto. Tida como uma obra-prima do engenheiro Edgar Cardoso, ela dispõe de quatro elevadores, nas duas margens do Douro, desde a sua inauguração, em 1963, com o objectivo de facilitar a travessia de peões. Mas esses mesmos ascensores foram desactivados há décadas por falta de operacionalidade.
Em relação ao projecto que já foi aprovado, Diogo Seixas Lopes nota que tanto o elevador como o centro interpretativo parecem “bastantes correctos em termos de arquitectura”, já que têm “uma linguagem que reporta à da própria ponte”, mimetizando a sua cor e estruturas tubulares.
“Vimos uma tendência nos últimos 10 anos de construir uma série de centros interpretativos para aproveitar os fundos europeus, nem todos com um sentido imediato. Mas este parece-me natural”, diz.
Rui Furtado louva a missão educativa do pólo interpretativo. “A ponte é uma obra com uma importância indiscutível no país no momento em que foi feito e tem uma história para contar”, conclui.