Um selo para guardar a história das lojas tradicionais de Lisboa
Câmara já está a trabalhar no programa "Lojas com história" e promete assumir um papel mais activo na revitalização do comércio centenário.
“Já perdemos algum tempo”, admite a autarca, referindo-se às lojas antigas que faziam parte da identidade de Lisboa mas que, por força da lei das rendas, da crise económica, da pressão imobiliária ou da falta de herdeiros, tiveram de fechar portas. Agora, o objectivo da câmara é travar esta tendência e invertê-la.
Ao abrigo do programa “Lojas com História”, aprovado em Fevereiro pelo executivo, foi já constituída uma equipa com técnicos de vários departamentos da câmara (urbanismo, cultura, economia e comunicação) e especialistas em design, da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. Esta equipa fez o levantamento da informação existente sobre os estabelecimentos que podem enquadrar-se na categoria de lojas históricas. "A câmara tem muita informação, que foi recolhendo ao longo do tempo, mas estava dispersa e não havia uma estratégia única", explica Graça Fonseca.
Além deste grupo, foi criado um conselho consultivo que junta investigadores e outras pessoas que se dedicam a estudar Lisboa. Deste órgão fazem parte nomes como o do historiador José Sarmento de Matos, o olisipógrafo Appio Sottomayor, a jornalista Marina Tavares Dias, a empresária Catarina Portas, a professora de História da Arte Raquel Henriques da Silva ou o fundador do Forum Cidadania Lisboa Paulo Ferrero - este último envolvido também na criação do Círculo das Lojas de Carácter e Tradição, uma plataforma que junta lojas lisboetas com mais de meio século na tentativa de as revitalizar.
O conselho consultivo esteve reunido na semana passada com um objectivo em mente: definir o conceito de "lojas com história". Para começar, "são lojas com mais de 100 anos e que, simultaneamente, tenham a mesma actividade comercial desde a abertura e estejam na mesma família, o que pode incluir terem passado de patrões para empregados", explica a vereadora. Mas há outros critérios possíveis, como por exemplo incluir património material ou imaterial ligado à história da cidade, ou vender produtos associados à identidade de Lisboa. Para meados de Julho está já marcada nova reunião na qual ficarão estabelecidos todos os critérios.
Segundo a vereadora da Economia, em Setembro começa a fase seguinte: os técnicos vão para as lojas recolher as histórias - dos estabelecimentos e das pessoas que lá trabalham ou trabalharam -, que ficarão registadas em vários formatos (texto, fotografia e vídeo) e disponíveis num guia, numa aplicação móvel e também online. O objectivo não é ter "lojas-museu", ressalva: "Queremos que as pessoas visitem os espaços e comprem os produtos."
A câmara vai também criar um selo que será mais do que uma simples imagem de marca. O objectivo, explica Graça Fonseca, é "criar uma espécie de comunidade, em que os lojistas sintam que não estão sozinhos, que estão ligados por um objectivo comum". Em estudo estão ainda eventuais benefícios fiscais, ao nível das taxas municipais. Mas a atribuição do selo implica uma contrapartida: "a câmara terá sempre uma palavra a dizer quando os proprietários quiserem trespassar ou vender os negócios", explica.
"A Câmara de Lisboa tem limites de intervenção muito mais fortes do que as pessoas julgam", lembra Graça Fonseca, referindo-se ao facto de a autarquia não poder impedir, por exemplo, que uma cadeia como o McDonald's se instale no espaço da Confeitaria Nacional. Através do selo "Lojas com História", o município quer apoiar os proprietários na busca de uma solução que permita perservar a história dos espaços, fazendo a ponte com potenciais interessados na continuação dos negócios tradicionais. "Sentimos que há interesse das pessoas mais novas por aprender ofícios antigos", afirma a vereadora.
A lista de potenciais lojas a incluir no programa ainda não está fechada mas Graça Fonseca estima que sejam cerca de 150 espalhadas por várias zonas da cidade. "O mapa é muito disperso. Por exemplo, a loja mais antiga de Lisboa é o restaurante O Rolhas, na zona de Belém, aberto desde antes do terramoto, no início do século XVIII."