Tinha 14 anos, saiu para ir à feira, foi espancado até à morte

Uma enorme mancha de sangue mostra o local onde o corpo foi deixado, numa arrecadação no último andar de um prédio em Salvaterra de Magos. Os suspeitos são traficantes. Da vítima todos dizem que era “um rapaz do melhor”.

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Local onde o jovem foi encontrado Miguel Manso

O crime aconteceu em Salvaterra de Magos, no distrito de Santarém, onde o adolescente vivia e frequentava a escola secundária. Nos últimos dias, a mãe colocou vários apelos no Facebook. “Se alguém viu o meu filho ligue! Não lhe façam mal!”, escreveu na terça-feira de manhã cedo. As mensagens multiplicaram-se depois: “Filho se estiveres por aí fala comigo!”

Terá recebido “várias pistas” desde terça-feira, e “lá ia sozinha, à procura”, mas eram todas “pistas falsas”, diz Maria Flores, dona do café que fica no rés-do-chão da casa da avó do adolescente, com quem ele vivia, no Bairro de São José — um bairro de ruas direitas e edifícios baixos, em Salvaterra de Magos. Maria Flores tem acompanhado o desespero da mãe do adolescente. “Ainda ontem desmaiou, ainda não se sabia disto”, conta. O pai do rapaz trabalha no estrangeiro.

Segundo fonte da polícia, o adolescente e os seus agressores conheceram-se recentemente. Ter-se-ão envolvido num conflito, mas até agora os investigadores da Polícia Judiciária não descobriram os motivos que levaram os suspeitos de rapto e homicídio a agredir o adolescente até à morte.

Maria Flores diz que o conhecia bem, que era um “rapaz do melhor que há”, que “se via bem que era bem cuidado, a quem não faltava nada, um bom telemóvel, um bom computador, roupas boas”. Não o associa a problemas.

Sangue nos degraus
O prédio onde o corpo foi encontrado fica numa pequena rua sem saída, a uma distância de cinco minutos de carro da casa do rapaz. No prédio, ninguém viu ou ouviu nada de estranho nos últimos dias, disseram ao PÚBLICO alguns dos moradores. Ninguém deu por nada. De resto, raramente vão às arrecadações no último andar, dizem.

Mas, face aos indícios que os peritos do Laboratório de Polícia Científica recolheram no local, a Polícia Judiciária acredita que o menor terá morrido ainda na noite de segunda-feira. Terá sido manietado pelos jovens que o agrediram incessantemente com murros por todo o corpo.

Como é que do recinto da feira, onde há quem garanta ter visto o adolescente na noite de segunda, ele foi parar ao prédio da pequena rua sem saída, é algo que não se sabe ainda. Os inspectores da Polícia Judiciária já ouviram várias testemunhas e também suspeitos do crime, mas, para já, não há detidos.

Nesta quinta-feira à tarde, a porta do prédio manteve-se aberta e os jornalistas entravam e saiam, subiam até ao 5.º andar — entre o 4.º e o 5.º piso havia sangue seco nos degraus — fotografavam, faziam directos para as televisões junto à porta escancarada da arrecadação. Lá dentro, diferentes divisões apertadas, de tecto baixo, com sacos de lixo, bicicletas e móveis velhos, restos de um carrinho de bebé, loiças de casa de banho... Uma grande mancha de sangue no corredor que faz a ligação das diferentes divisões da arrecadação indicava o local onde o corpo fora encontrado. Nada estava vedado a quem quisesse entrar.

Quando o PÚBLICO regressou ao local, pouco depois de lá ter estado, ao fim da tarde, um elemento da PJ analisava as escadas junto ao 4.º andar direito. “Não pode subir... preservação de indícios”, disse. Perante a estranheza de já tanta gente ter passado por aquelas escadas manchadas de sangue, garantiu depois que já tinham estado mais agentes no local, antes dos jornalistas.

O corpo do jovem foi retirado de manhã cedo do prédio. Vários moradores só perceberam que algo se passava “por causa da ambulância”. No 2.º andar, uma moradora, professora na escola que o rapaz assassinado frequentava — “mas não o conhecia”, sublinha — conta que só deu pelo caso através dos jornalistas.

A PJ tem suspeitos. Estão referenciados por episódios frequentes de delinquência na localidade, têm acesso habitual ao edifício onde o corpo foi encontrado, apesar de nenhum ali morar.

Uma moradora disse ao PÚBLICO que costuma ver um rapaz que não mora no prédio a subir e a descer as escadas. E que não há muito tempo avistou da rua um “grupo de miúdos” à varanda, no 4.º andar direito, o que estranhou, já que o apartamento em causa não está arrendado. Nesta quinta-feira ao fim do dia, era a porta desse apartamento que estava aberta, enquanto o agente da Judiciária recolhia indícios junto à entrada.

“Devolvam o meu filho”
O menor estava a ser procurado pela GNR local desde terça-feira. “Desaparecido. Vestia isto”, escreveu a mãe do adolescente nesta quarta-feira numa publicação no Facebook à qual juntou uma fotografia com a roupa que ele levou vestida na noite em que foi à festa. Na madrugada desta quinta-feira explicava que o filho ainda não tinha aparecido a alguém que lhe perguntara por novidades. “Devolvam o meu filho”, pediu horas antes de se saber que ele estava morto.

Uma familiar do jovem dizia esta tarde: “Estava no sítio errado, com as pessoas erradas, à hora errada.”

À porta da casa da avó do jovem ouviam-se choro e lamentos. Uma vizinha diz que a polícia chegou com a notícia às primeiras horas do dia. “Espero que descubram tudo.” Outros moradores começavam a dar sinais de inquietação com tantos jornalistas e tantas câmaras à porta. Maria Flores não. Apontava para o relvado em frente ao café: “Era ali que ele costumava jogar à bola com os mais novos.”

O caso está a ser investigado pela Unidade Nacional Contra o Terrorismo (UNCT) da Polícia Judiciária. A investigação ficou a cargo desta unidade, já que, estando desaparecido há vários dias, o jovem poderia ter sido vítima de sequestro, um crime cuja investigação compete à UNCT.

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