FBI confirma ligação de hackers da Sony à Coreia do Norte

Piratas informáticos elogiaram a Sony por ter cancelado a estreia de The Interview numa nova mensagem em que avisam que o estúdio não deve "causar mais problemas". Um diplomata norte-coreano negou já o envolvimento do país no ataque.

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ROBYN BECK/AFP

"O FBI tem informação suficiente para concluir que o Governo norte-coreano é responsável por estes actos", diz a agência federal em comunicado. "A análise técnica ao malware [software malicioso] usado neste ataque revelou ligações a outro malware que o FBI sabe ter sido desenvolvido previamente por agentes norte-coreanos. Por exemplo, havia semelhanças em linhas de código específicas, em algoritmos de encriptação, métodos de eliminação de dados e comprometimento de redes."

Na mesma nota sobre as conclusões da investigação iniciada no dia 1, o FBI diz ter identificado "sobreposições significativas entre a infra-estrutura deste ataque e outra ciberactividade maliciosa que o Governo dos EUA já associou anteriormente de forma directa à Coreia do Norte". O FBI fala de várias moradas IP associadas com infra-estruturas norte-coreanas e em ferramentas semelhantes às usadas num "ciberataque em Março do ano passado contra bancos e empresas de média sul-coreanas e que foi levado a cabo pela Coreia do Norte". 

"Estamos profundamente preocupados com a natureza destrutiva deste ataque a uma entidade do sector privado e aos cidadãos comuns que lá trabalham", diz ainda o FBI, que postula que "as acções da Coreia do Norte tiveram como intenção infligir mal significativo a um negócio americano e suprimir o direito dos cidadãos americanos de se expressarem". Classificando o ataque iniciado a 24 de Novembro como "actos de intimidação", a agência de investigação federal diz que vai continuar a trabalhar com "vários departamentos e agências, bem como com parceiros do sector privado" que tiveram um papel importante nesta investigação.

Esta informação vem assim confirmar as notícias do New York Times, CNN e outros órgãos de informação que desde quarta-feira dão como certo o papel do regime de Pyongyang no ataque informático. Dia 2, as autoridades norte-coreanas disseram que seria preciso “esperar para ver” se têm algo a ver com o caso e dia 6 a Comissão de Defesa Nacional norte-coreana negava a autoria do ataque informático, que ainda assim classificava como um “acto justo”.

A investigação dos EUA ao caso, um dos maiores ataques informáticos na história empresarial e que visa a comédia de Seth Rogen The Interview sobre uma tentativa de assassinato do líder norte-coreano Kim Jong-un, poderá ainda, de acordo com fontes governamentais citadas pela Reuters, passar por possíveis ligações à China, através de uma colaboração com indivíduos chineses ou usando servidores da China para mascarar a origem do ataque. Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês disse já que "os EUA deviam fornecer provas à China", acrescentando não estar a par "de toda a situação".

A Reuters noticia que o Presidente dos EUA, que segundo o New York Times tem estado a acompanhar diariamente o caso, falará sobre o assunto numa conferência de imprensa agendada para as 18h30 (hora de Lisboa) desta sexta-feira.  

O tema foi já quinta-feira enquadrado pelo porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, como “um assunto sério de segurança nacional” dos EUA, que reiterou que o Governo está “do lado dos artistas e das empresas que queiram expressar-se” – uma das principais consequências deste ataque informático são as críticas à decisão dos exibidores de não mostrarem o filme na esteira de ameaças aos espectadores de The Interview que evocavam o 11 de Setembro e à posição da Sony de suspender indefinidamente o lançamento da comédia. Muitas personalidades norte-americanas, da política às artes, manifestaram-se contra o que consideram ser um ataque à liberdade de expressão e uma cedência às exigências de ciberterroristas. Earnest explicou ainda na quinta-feira que o Governo nada disse à Sony sobre o que devia acontecer ao filme e que apoiou o direito de a comédia de Seth Rogen ser feita — sendo que The Interview foi objecto de análise e mostrado a responsáveis da administração Obama em Junho.

Também esta sexta-feira, o actor e realizador George Clooney revelou que fez circular uma petição de apoio à Sony pelos altos decisores de Hollywood e que “ninguém tomou essa posição” por “medo”. Vivemos num “novo paradigma e uma nova forma de gerir o nosso negócio”, alertou em entrevista ao site Deadline.

Dias antes, a produtora New Regency e o estúdio Fox comunicaram que não vão distribuir o novo projecto do realizador Gore Verbinsky com o actor Steve Carell, que adapta a reportagem-BD Pyongyang, que o canadiano Guy Delisle escreveu após dois meses na capital norte-coreana. “Antes disto, tínhamos luz verde e financiamento completo da New Regency. Penso ter entendido que, dada a situação na Sony, a Fox decidiu não distribuir o filme”, disse o realizador em comunicado, citado pelo diário francês Le Figaro.

Quanto à nova mensagem dos hackers, foi recebida quinta-feira à noite por altos responsáveis da Sony Pictures por e-mail e estará confirmada a sua autenticidade, por seguir o mesmo padrão que outros e-mails anteriores. “Agora queremos que nunca lancem, distribuem ou deixem fugir o filme sob qualquer forma, por exemplo em DVD ou pirataria”, dizem os Guardians of Peace (GOP), o grupo que está por trás do gigantesco ataque ao estúdio, uma das majors da indústria de Hollywood. 

No mesmo e-mail, o GOP detalha exigências: “Queremos que tudo relacionado com o filme, incluindo os seus trailers, bem como a sua versão integral, fora de qualquer site que os tenha publicado imediatamente”. E avisa: “Ainda temos os vossos dados privados e sensíveis” e “garantiremos a segurança dos vossos dados a não ser que causem mais problemas”.  

Desde 24 de Novembro que a Sony está sob um ataque informático sem precedentes a uma multinacional que revelou material sensível para as relações entre actores e o seu estúdio, libertou informações estratégicas da empresa e dados pessoais de milhares de funcionários — tudo com o objectivo de impedir que The Interview fosse lançado. Uma comédia que o regime norte-coreano descreveu, numa carta enviada ao secretário-geral da ONU, como “patrocínio não disfarçado de terrorismo, bem como um acto de guerra”.

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