OS EUA são um país pequeno de mais para três partidos
O Partido Libertário conquista adeptos entre os jovens. Tem um discurso que casa ideais conservadores e liberais, tanto defende "o mercado" como a homossexualidade e a legalização da marijuana.
É a última oportunidade para seguir de perto a campanha do candidato a senador Robert Sarvis, um jovem de 38 anos que aparece no boletim de voto como figura do Partido Libertário e nas fotografias e vídeos espalhados pela Internet como um símbolo do estranho casamento ideológico entre o mais liberal dos democratas e o mais conservador dos republicanos.
Em frente a um gigante Bart Simpson insuflável e mascarado de monstro de "Frankenstein", Sarvis tenta falar por cima dos gritos das crianças do jardim-de-infância da Escola Elementar de Vienna - “sha-nhe-nha-sha-she-nha-nha”, mas de certeza que era em língua inglesa.
Como candidato do partido que reclama para si o título de terceiro maior dos Estados Unidos, ainda assim numa galáxia muito distante do duo dinâmico que domina a política do país, Robert Sarvis não podia faltar a uma festa repleta de jovens, dos mais pequenos aos que já saíram da adolescência mesmo que ainda não tenham percebido - afinal é neles, os chamados millennials e seus sucessores, os meninos e meninas da geração Z, que o Partido Liberal se apoia para sonhar com um futuro mais brilhante.
“Estão a ocorrer mudanças muito interessantes em termos demográficos. Os eleitores que têm entre 18 e 35 anos estão muito interessados em votar fora deste sistema de dois partidos, ou pelo menos estão mais inclinados a fazê-lo do que os seus pais. No ano passado, quando concorri ao cargo de governador, tive 15% dos votos de pessoas com menos de 30 anos de idade, e este ano as sondagens indicam que essa percentagem cresceu para 24%, mais do que o candidato do Partido Republicano”, diz Sarvis.
Concorrentes de peso
A corrida a um lugar no Senado pelo estado da Virginia tem três concorrentes: o democrata Mark Warner, que deverá renovar o mandato; o republicano Ed Gillespie, antigo conselheiro de George W. Bush, que foi reduzindo a diferença em relação a Warner mas cuja hipotética vitória será interpretada como uma das maiores surpresas da noite eleitoral; e Robert Sarvis, que na mais recente sondagem da Universidade Christopher Newport só convenceu 2% dos eleitores.
A luta de Sarvis já seria difícil contra dois pesos-pesados como Warner e Gillespie, mas o facto de concorrer pelo Partido Libertário ainda baralha mais o eleitorado norte-americano. O principal problema é o nome, como admite Jason Fermster, 28 anos, uma das dez pessoas que enfrentaram o frio para acompanharem Sarvis no desfile do Halloween entre a Rua Berry e a Avenida Mapple, neste bairro de classe média alta.
“A maioria das pessoas não nos conhece. Ao ouvirem a expressão ‘libertário’, imaginam uma pessoa de cabelos compridos, encostada numa esquina sem fazer nada. Eu só descobri a ideologia libertária quando fui para a universidade, no curso de Economia”, diz Jason, naquele tom exaltado de quem garante não querer nada com a política mas que um dia lá irá parar.
“O coração dos libertários está nas universidades. Os millennials não querem saber se uma pessoa é homossexual, não queremos saber se alguém quer abortar. Se tu e a tua mulher quiserem fazer um aborto, o que é que eu tenho a ver com isso? Nem sequer percebo por que temos de discutir assuntos como esses. Os republicanos estão a assumir uma postura muito rígida, acho que os conservadores menos rígidos nos assuntos sociais vão começar a olhar mais para nós.”
O partido, fundado em 1971, já teve alguns sucessos ao longo dos anos, mas muito dificilmente conseguirá convencer os eleitores norte-americanos de que há alternativas a democratas e a republicanos. Isto apesar de várias sondagens – da Gallup ao Instituto Cato, da Zogby ao Wall Street Journal – terem identificado entre 14% e 20% de eleitores que se identificam com a ideologia principal do partido, muitos deles sem o saberem: conservadores em termos fiscais, liberais em assuntos sociais.
Robert Sarvis é filho de uma imigrante chinesa, casado com uma pediatra negra, tem uma filha de dois anos e um filho de quatro. À imagem do seu apoiante Jason Fermester, para quem o Partido Libertário “tem o melhor dos dois mundos – o liberal e o conservador” –, Sarvis defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a abertura das fronteiras a mais imigrantes e a legalização da marijuana.
Conquistar os jovens
“O Governo não deveria poder dizer a ninguém com quem uma pessoa se pode casar. O Partido Libertário também defende a legalização da marijuana, porque a proibição causa várias doenças sociais, como o excesso de jovens nas cadeias. Vivemos também num estado de vigilância constante, o que surpreendeu muitos americanos. Todos estes assuntos são muito caros aos mais jovens, e o Partido Libertário sempre os defendeu”, afirma.
Já a costela conservadora está ocupada com a defesa acérrima do direito à posse de armas e à redução ao mínimo da intervenção do governo “no mercado”, principalmente na saúde e na assistência social. Para Sarvis, e para o Partido Libertário, o problema é o Governo e a solução é “o mercado”. “A melhor forma de tirar as pessoas da pobreza é fomentar o crescimento económico, criar empregos, uma economia vibrante que crie inovação. Criar este ambiente é melhor para diminuir a pobreza do que a intervenção directa do governo. Um mercado livre é a melhor forma de tirar as pessoas da pobreza”, defende.
Sarvis e os seus dez apoiantes vão ficando para trás, entre a carrinha do Lions Club da Virginia, que oferece rastreios ao glaucoma e a problemas auditivos, e o Oldsmobile Cutlass descapotável que transporta a candidata a supervisora do distrito de Hunter Mill, Cathy Hudgins, como se fosse toda a tripulação da Apollo 11 acabada de regressar da primeira viagem à Lua. Mais à frente, apoiantes da republicana Suzanne Scholte, candidata a um lugar na Câmara dos Representantes, gritam pelo fim do controlo da posse de armas, até avistarem a figura de um sujeito de bloco de notas e gravador em punho. “Agora só mensagens populares, estamos num local público: votem na Suzanne!”