A expectativa da mensagem de Ano Novo do Presidente da República

Cavaco Silva fala ao país nesta quarta-feira. A dúvida é saber o que dirá sobre o Orçamento do Estado para 2014.

Foto
Cavaco Silva promulgou na segunda-feira a lei do Orçamento do Estado para 2014 Nuno Ferreira Santos

A expectativa existe não apenas porque o Presidente da República tem o poder constitucional de requerer a fiscalização sucessiva — assim como tem de pedir a preventiva, o qual não utilizou —, mas porque Cavaco Silva, há precisamente um ano, usou o momento institucional de se dirigir ao país no primeiro dia do ano para anunciar que tinha requerido aos juízes-conselheiros do Palácio Ratton que analisassem alguns aspectos das contas públicas de 2013.

Cavaco já tinha anunciado, no Panamá, em Outubro, que não iria usar o seu poder de requerer a fiscalização preventiva, com base no argumento dos riscos para o país de o Estado ter de viver de duodécimos.

“O que posso dizer é o princípio pelo qual eu normalmente me rejo nestas situações: eu faço uma avaliação cuidadosa, recolhendo o máximo de informação sobre os custos de um Orçamento não entrar em vigor no dia 1 de Janeiro e os custos que resultam de, eventualmente, uma certa norma ser considerada inconstitucional já depois de o orçamento estar em vigor”, explicou então o Presidente.

Ficou então confirmado que Cavaco não recorreria à fiscalização preventiva e que qualquer decisão final sobre a sua posição face ao Orçamento, bem como a existência de duvidas presidenciais sobre normas orçamentais, ficariam para depois da promulgação. Em causa podem estar as medidas do Governo que taxam extraordinariamente as pensões e as que fazem cortes entre os 2,5% e os 12% para os salários mensais acima dos 675 euros dos funcionários públicos.

É também sabido que, se o Presidente não enviar o Orçamento para fiscalização sucessiva, os partidos da oposição o irão fazer. Na terça-feira, assim que o Orçamento foi publicado em Diário da República, o vice-presidente do grupo parlamentar do PS, José Junqueiro, declarou publicamente que o partido o faria e que questionaria o Tribunal Constitucional precisamente sobre os cortes de pensões e de salários.

No caso de o Presidente da República pedir a fiscalização sucessiva ou esta ser accionada por deputados da oposição, qualquer decisão do Tribunal Constitucional poderá ser prolongada no tempo e incidir apenas sobre o Orçamento após o fim do prazo previsto para o cumprimento do programa de intervenção regulado pelo Memorando assinado pelo Estado português, a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, que termina a 17 de Maio de 2014. Isto porque o Tribunal Constitucional não tem prazos para decidir no caso de fiscalização sucessiva.

Foi assim há um ano
No ano passado, Cavaco Silva usou a mensagem de Ano Novo como Presidente da República para advertir para a necessidade “de pôr cobro” à “espiral recessiva, em que a redução drástica da procura” levava então já “ao encerramento de empresas e ao agravamento do desemprego”.

E lembrando que a “execução do Orçamento” iria “traduzir-se numa redução do rendimento dos cidadãos, quer através de um forte aumento de impostos, quer através de uma diminuição das prestações sociais”, sublinhou que “todos” seriam afectados, “mas alguns mais do que outros”, o que lhe suscitava “fundadas dúvidas sobre a justiça na repartição dos sacrifícios”. E afirmava então: “Por minha iniciativa, o Tribunal Constitucional irá ser chamado a pronunciar-se sobre a conformidade do Orçamento do Estado para 2013 com a Constituição da República”.

Já então o Presidente justificou a razão por que não recorria à fiscalização preventiva: “O Orçamento entrou hoje em vigor, no primeiro dia do ano de 2013. Se tal não acontecesse, o país ficaria privado do mais importante instrumento de política económica de que dispõe e as consequências para Portugal no plano externo seriam extremamente negativas”.

Foi na mensagem de Ano Novo que o Presidente da República fez questão de apelar ao consenso político partidário que, no seu entender, optimizaria a busca de soluções para superar a crise da dívida pública.

“A resolução dos problemas nacionais pressupõe diálogo e consenso, entendimentos feitos a pensar nos portugueses e no país como um todo”, dizia o Presidente há um ano para sublinhar a necessidade de haver diálogo e negociações entre o PSD e o CDS, no Governo, e o PS, principal partido da oposição, que em Maio de 2011, quando ainda era Governo, tinha negociado e assinado o Memorando: “Devemos ter presente que o programa de assistência financeira foi apoiado por partidos que representam 90% dos deputados à Assembleia da República, deputados eleitos num sufrágio que teve lugar há pouco mais de um ano e meio”.

E, antecipando as diligências que haveria de fazer no Verão para conseguir um Pacto de Regime, o Presidente dizia há um ano: “O país não está em condições de se permitir juntar uma grave crise política à crise económica, financeira e social em que está mergulhado”. Mas quando o pacto foi ensaiado no Verão, com a mediação do conselheiro presidencial David Justino, a iniciativa presidencial acabou por falhar e não houve acordo entre os partidos que tinham estado na origem do memorando.

 

 

Sugerir correcção
Comentar