O fado já é património mundial

Camané durante um concerto nas Festas de Lisboa, no Castelo de S. Jorge, em 2008
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Camané durante um concerto nas Festas de Lisboa, no Castelo de S. Jorge, em 2008 Pedro Elias
Depois de uma espera de quase dois dias, a candidatura portuguesa foi finalmente aprovada
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Depois de uma espera de quase dois dias, a candidatura portuguesa foi finalmente aprovada Enric Vives-Rubio/arquivo

Foram precisos pouco mais de cinco minutos para que a decisão fosse tomada por unanimidade (os 23 delegados presentes – faltou apenas um – votaram a favor), com grandes aplausos, conta ao PÚBLICO pelo telefone o musicólogo Rui Vieira Nery, presidente da comissão científica da candidatura. “Foi uma grande alegria que pôs fim a uma grande ansiedade”, admite Nery, referindo-se ao ritmo lento dos trabalhos na reunião de Bali. “Já não acreditávamos que fosse aprovada hoje.”

O fado foi a última candidatura avaliada na sessão deste domingo, que terminou às 20h30 (12h30, hora de Lisboa), depois de terem passado à votação mais de 30 propostas. E, mesmo assim, foi recebido com grande entusiasmo, diz o musicólogo. Para esse clima de festa contribuiu, “e muito”, o breve discurso de António Costa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, entidade que formalizou a candidatura junto da UNESCO: “O Dr. António Costa decidiu terminar as suas palavras, já a fechar a intervenção de Portugal, chegando o seu iPhone ao microfone e deixando que a sala ouvisse Amália cantar ‘Estranha forma de vida’. Foi uma emoção acabar com a voz de Amália num fado de [Alfredo] Marceneiro. A sala levantou-se num enorme aplauso.”

A partir de agora, o fado não é apenas a canção de Portugal, a canção de Severa, Marceneiro, Amália, Carlos do Carmo, Camané, Ana Moura e Carminho - é um tesouro do mundo. Um tesouro que fala de Portugal, da sua cultura, da sua língua, dos seus poetas, mas que também tem muito de universal nos sentimentos que evoca: a dor, o ciúme, a solidão, o amor.

Optimismo comprovado

O optimismo à volta da eventual entrada do fado para a Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade era grande desde que, em Outubro, a comissão de peritos da UNESCO considerou a candidatura portuguesa “exemplar”, mas vê-la formalizada compensa definitivamente anos de trabalho de uma série de especialistas, músicos e intérpretes.


Foi em 2005 que Portugal começou a preparar mais seriamente esta candidatura que o Museu do Fado, em nome da Câmara Municipal de Lisboa, formalizou em Junho do ano passado (tinham passado apenas dois anos sobre a aprovação da Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial). Mas a ideia, ou o sonho, tem quase 20 anos - surgiu por altura da Lisboa Capital Europeia da Cultura, em 1994, garantiu ao PÚBLICO há dias Ruben de Carvalho, vereador da CDU em Lisboa e um dos que mais apoiaram o projecto desde o início.

Em 2010, o fado apresentou-se à UNESCO como “símbolo da identidade nacional” e “a mais popular das canções urbanas” portuguesas, tendo por embaixadores dois intérpretes que, por motivos bem diferentes, fazem parte da sua história de forma incontestada: Carlos do Carmo e Mariza.

A canção que deve a Amália os primeiros grandes esforços de internacionalização é uma das 49 candidaturas a património imaterial da humanidade que já foram votadas nesta reunião que só termina na próxima terça-feira, dia 29.

A lista do património imaterial - uma designação que abrange tradições, conhecimentos, práticas e representações que fazem a matriz cultural de um país e que, juntas, formam uma espécie de tesouro intangível do mundo - tinha até à reunião de Bali 213 bens de 68 Estados, como o tango ou o flamenco, só para falar em dois exemplos de universos semelhantes. O fado é o primeiro bem português, mas, se tudo correr bem, já não faltará muito para que o cante alentejano lhe faça companhia.

Notícia actualizada às 14h11
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