Ana Stilwell, uma artista que vive a música além da maternidade
Caracteriza-se por duas coisas: uma paixão incontrolável pela música e um amor inegável pela família. E são estes dois factores que definem a cantora enquanto artista. Com antecedentes na educação de infância e na literatura, lança-se como cantora a tempo inteiro e traz um single muito íntimo sobre a necessidade de sermos vistos.
Aos 35 anos, Ana Stilwell é cantautora, dá aulas particulares de canto e ensina música em escolas. Simultaneamente, é casada e mãe de quatro filhos, com idades compreendidas entre os 11 e os quatro anos. Duas vezes por semana, com a sua mãe, a jornalista Isabel Stilwell, escreve para o PÚBLICO as “Birras de Mãe”. Diz que a música é “um chamamento” constante, que faz parte da sua identidade. Mas, por ser a carreira de sonho “em que não queria falhar”, representa também uma das suas grandes inseguranças, confessa. Neste sábado, o Centro Cultural de Cascais já está esgotado para ouvir o seu novo single Pousa o teu livro e dar início à digressão Conversas com a Sombra.
Ao longo da sua vida, Ana Stilwell explorou áreas diferentes. Começou a escrever com a sua mãe, Isabel Stilwell, aos 16 anos e explora o gosto pela literatura pontualmente, tendo já publicado dois livros. Além disso, estudou teatro musical em Londres, onde, paralelamente, estudou educação de infância. Mas, ao fim e ao cabo, foi a música que conquistou o seu coração.
“Sou uma pessoa muito ligada à família — e isso para mim é um pilar fundamental —, e sou uma pessoa criativa e musical. E essa é a minha forma de expressão”, adianta em conversa com o PÚBLICO, acrescentando que se esforça para tentar descobrir mais sobre si e sobre as pessoas que tem à sua volta. Com uma família grande, nem sempre viu facilitada a tarefa de se focar na carreira. Contudo, ser mãe acabou por servir como uma fonte de inspiração. “Percebi que para ser cantautora não precisava de ser superintelectual. Por isso falava simplesmente sobre o que conhecia: a minha família.”
O apoio familiar esteve sempre presente e constituiu uma parte crucial em todo o seu percurso, mas admite que conciliar a vida pessoal com a profissional tem os seus desafios. Fez um esforço para “encontrar espaço” para si própria além da maternidade, exercendo assim uma “grande flexibilidade” para se adaptar às circunstâncias. “Há alturas que são loucas, em que uma pessoa se sente culpada porque está a falhar em tudo. Mas tenho vindo a ficar melhor a aceitar isso. Sei que depois há umas fases mais calmas que permitem voltar a equilibrar tudo”, constata.
O processo de compor é, para si, algo de “muito genuíno” que vai ao encontro do que está a viver, acabando por a expor como pessoa e como mulher. E no mais recente projecto Conversas com a Sombra, partilha momentos de introspecção e de descoberta de identidade. Explica que “como sociedade tivemos esta obrigatoriedade de parar [por causa da pandemia], e fomos confrontados com questões como o trabalho, o que se gosta ou não de fazer”. Crê que o surgimento dessas questões nos leva a repensar sonhos, objectivos e a olhar para a vida de terceiros como comparação — e são essas as nossas “sombras”, que podem não ser más, mas que acabam por ser desafiantes. Ana Stilwell pega neste conceito e revê-se nele, usando-o para expandir o seu trabalho: “Sinto que sou uma pessoa bastante contida com um filtro grande e um medo ridículo. E tenho dito que a minha maior conversa com a minha sombra foi essa: ela desafiar-me. E dizer-me: ‘Vamos expandir-nos, ser mais ousadas.’”
A cantora explica que Pousa o teu livro, o single lançado no dia 7, é “um grito para sermos vistos”. E explica: “É uma canção de amor que me surgiu durante o confinamento, numa fase de muita vulnerabilidade. Mas, curiosamente, ganhou um sentido muito diferente e profundo, que me apanhou de surpresa”, conta. Num dia em que deitava um dos seus filhos, a criança usou a letra da canção (que ouviu durante os ensaios) como uma forma de pedir atenção. E foi aí que Ana Stilwell percebeu, sem querer, que a sua música podia ser interpretada além do romance: “Sinto que nesta sociedade em que andamos sempre a correr olhamos pouco [para os outros]. E esta música, além de uma balada de amor, tem uma chamada de maior profundidade para que nos olhem.”
Durante muito tempo, Ana Stilwell combateu a necessidade de perseguir uma carreira na música, mas acabou por não resistir. Começou a escrever num tom pessoal em ambientes familiares (como se fossem “cartas” para entes queridos), e não parou até hoje, tendo já lançado dois álbuns. E depois de produzir o primeiro, foi sentindo uma “necessidade cada vez maior” de criar projectos independentes. “Precisava de perceber o que é que eu queria dizer. E fico muito aflita com o que as outras pessoas querem, portanto tinha de encontrar o meu caminho.” Desde então, ainda que tenha feito várias colaborações, pensa e desenvolve as suas ideias de acordo com a sua visão. Sobre o futuro, e admitindo que não gosta de fazer planos a longo prazo, tem apenas uma certeza: quer continuar a fazer música.
Texto editado por Bárbara Wong