“A América quer o ouro do Afeganistão”
A 10 de Novembro de 2001 o enviado especial do PÚBLICO Fernando Marques está em Peshawar, Paquistão, e assiste a uma manifestação que mostra o grau de hostilidade à ofensiva liderada pelos EUA no Afeganistão
Os fiéis começam agora a sair da mesquita, onde a cerimónia, entretanto, se transformara num verdadeiro comício. Empunham cartazes e engrossam o grupo que já está na rua, em volta de uma camioneta em cima da qual o mullah Hussein, ao lado de um espantalho de Tony Blair, há-de, meia hora depois, proferir um longo e monocórdico discurso à Fidel Castro. “Parem com a III Guerra Mundial”, diz um cartaz. “Porque é que a ONU não acha que as atrocidades em Caxemira, na Palestina e na Bósnia são terrorismo?”, questiona outro. “Ó muçulmanos, unam-se contra a cruzada!”, incita um terceiro. “O Afeganistão precisa de comida, cobertores e tendas, não de bombas!”, assinala um outro.
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Os fiéis começam agora a sair da mesquita, onde a cerimónia, entretanto, se transformara num verdadeiro comício. Empunham cartazes e engrossam o grupo que já está na rua, em volta de uma camioneta em cima da qual o mullah Hussein, ao lado de um espantalho de Tony Blair, há-de, meia hora depois, proferir um longo e monocórdico discurso à Fidel Castro. “Parem com a III Guerra Mundial”, diz um cartaz. “Porque é que a ONU não acha que as atrocidades em Caxemira, na Palestina e na Bósnia são terrorismo?”, questiona outro. “Ó muçulmanos, unam-se contra a cruzada!”, incita um terceiro. “O Afeganistão precisa de comida, cobertores e tendas, não de bombas!”, assinala um outro.
E o resto é dedicado à América, o “grande terrorista internacional”. A polícia, agora também com viseiras e armas de fogo, forma duas barreiras, deixando entre ambas um espaço de cem metros, no qual, se houver distúrbios, os manifestantes poderão ser encurralados. Recua à medida que a frente começa a avançar a avançar. Gera-se alguma confusão, até porque as televisões se interpõem entre aquela mole de não mais de duas mil pessoas e a polícia. Fugas precipitadas, atropelos. Tensão. Há muitos olhos sedentos de violência, há muita má-vontade contra os estrangeiros.
O comício realiza-se uns 500 metros mais à frente. Berros: “Osama não é terrorista, é um grande soldado do Islão!”, “Os pobres e os indefesos estão contra a América!”, “Musharraf, tem vergonha!”, “Longa vida a Mullah Omar [líder dos taliban]”. Silêncio agora. Vai falar o mullah Hussein. “A América não está a combater o terrorismo nem Bin Laden, a América quer tomar o Afeganistão por causa das suas minas de ouro e diamantes!”. E mais: “Se há evidências contra os taliban e Osama nos ataques de 11 de Setembro, porque não revelam essas evidências ao povo?”. E mais: “Prometo que combateremos a América até ao juízo final!”. O resto do que diz está nos cartazes. Um deles, mostra um porco-diabo muçulmano a lidar um touro aliado, com a frase: “Combate de civilizações”. O mullah Hussein termina finalmente o seu monólogo. Corta-se o pescoço ao espantalho de Tony Blair e espezinha-se o corpo. A manifestação vai morrendo sem incidentes. O general Pervez Musharraf, presidente do Paquistão, pode estar descansado. Não vai ser com certeza o extremismo islâmico a determinar a sua queda em desgraça.