População do Corvo já fica hoje com as duas doses da vacina. “Um caso de estudo sobre a imunidade de grupo”
Esta sexta-feira termina a segunda toma da vacina contra a covid-19 na ilha do Corvo, que abrange 322 pessoas. “É um marco”, diz Tato Borges, responsável pelo combate à pandemia nos Açores.
O Corvo é um reduto no meio do atlântico livre de uma pandemia que continua a paralisar o mundo. Depois de em Fevereiro terem recebido a primeira dose, esta semana praticamente toda a população daquela ilha do grupo ocidental dos Açores recebeu a segunda dose da vacina contra a covid-19. É o primeiro território da Europa a ter a população toda vacinada com as duas doses.
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O Corvo é um reduto no meio do atlântico livre de uma pandemia que continua a paralisar o mundo. Depois de em Fevereiro terem recebido a primeira dose, esta semana praticamente toda a população daquela ilha do grupo ocidental dos Açores recebeu a segunda dose da vacina contra a covid-19. É o primeiro território da Europa a ter a população toda vacinada com as duas doses.
“Que eu tenha conhecimento é a primeira localidade da Europa que tem um processo deste género, em que se realizou uma vacinação em massa a toda uma população”, explica ao PÚBLICO, directamente da ilha do Corvo, Gustavo Tato Borges, coordenador da comissão de combate à pandemia nos Açores, destacando que o processo tem atraído a atenção internacional, justificando com a presença da Agence France-Presse na mais pequena ilha açoriana.
Até ao final desta sexta-feira, 322 pessoas terão a segunda dose da vacina administrada. Representam 95% da população vacinável da ilha. “Os outros 5% estamos a falar de pessoas com algumas doenças que necessitam de ser vacinadas em ambiente hospitalar e uma quantidade pequeníssima de pessoas que preferiram não ser vacinadas”, aponta. A população vacinável da ilha do Corvo representa 85% dos habitantes da ilha, que, no último Censos em 2011 tinha 435 habitantes.
Motivo pelo qual, Tato Borges, especialista em saúde pública, resiste em afirmar que a ilha apresenta imunidade de grupo, devido ao rigor científico do conceito. “Nós temos 85% das pessoas vacinadas. Para ser a definição clássica da imunidade de grupo teriam de ser 95%. No entanto, os estudos apontam que uma percentagem de 70% ou mais equivale a uma protecção acrescida da patologia”, especifica.
Conceitos à parte, o coordenador do combate à pandemia na região, não tem dúvidas: “ter 85% das pessoas vacinadas no Corvo é um marco e com certeza será um caso de estudo para aquilo significa a imunidade de grupo”. Para o sucesso do processo, contribuiu a adesão “brutal” da população. Mesmo algumas pessoas que no início rejeitaram serem inoculadas, acabaram depois por mudar de ideias.
No final da testagem, cerca de um terço das pessoas ficou “dores de cabeça e musculares”, as “reacções adversas” da segunda toma da vacina. “São reacções normais na segunda dose, mas acabou por ser tudo muito tranquilo, com zero reacções adversas graves”, explica Tato Borges.
"População encarou de forma radiante"
Para o autarca do único concelho da ilha, até é difícil de encontrar as palavras para descrever o sentimento da população: “olhe, nem sei a palavra certa. A população encarou isso de forma radiante”, afirmou ao PÚBLICO José Manuel Silva. O presidente da Câmara Municipal de Vila do Corvo salienta que desde o início da pandemia existiu uma “preocupação muito grande” na população, devido às “unidades de saúde extremamente limitadas” numa ilha que tem um médico e dois enfermeiros. “Um caso aqui poderia despoletar uma infecção em massa e poderia ser bastante complicado. Os hospitais estão longe”, afirma, assinalando, por exemplo, que a evacuação de um doente poderia demorar “cinco, seis horas, pelo menos”.
Por isso, José Manuel Silva não poderia concordar mais com a decisão de vacinar toda a população da ilha, até “porque não é precisa uma grande quantidade de vacinas”. Os corvinos, habituados a serem os mais afectados por uma insularidade mais extrema do que em qualquer outra ilha, sentem-se agora a servir de exemplo para a normalidade tão desejada. “As pessoas sentiam-se mais aflitas, agora sentem-se mais tranquilas. Noutras alturas ficamos sempre para trás, porque é que desta vez não havíamos de ser os primeiros?”. E foram mesmo.