Pedro Quirino: Um safari para ver os big five, outro para descobrir a Costa Vicentina

Namíbia, Botswana, Zimbabwe, Uganda, Quénia e Tanzânia ou Odemira, Almograve, Cabo Sardão, Odeceixe, Monte Clérigo, Arrifana e Carrapateira? “Não é preciso ir a África”, diz Pedro Quirino. “É preciso começar a entender os pormenores.”

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Daniel Rocha

O guia é o primeiro a acordar e o último a fechar os olhos — seja no Botswana, na Tanzânia ou Costa Vicentina abaixo, fila indiana pelas falésias, onze dias e onze noites, cataplana no horizonte. “Tem muita comparação”, diz Pedro Quirino. É certo que “não vamos encontrar leões e elefantes”, mas vamos “olhar para os pormenores e entendê-los”. “E essa é a parte mais interessante. Não é preciso ir a África. É preciso começar a entender os pormenores.

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O guia é o primeiro a acordar e o último a fechar os olhos — seja no Botswana, na Tanzânia ou Costa Vicentina abaixo, fila indiana pelas falésias, onze dias e onze noites, cataplana no horizonte. “Tem muita comparação”, diz Pedro Quirino. É certo que “não vamos encontrar leões e elefantes”, mas vamos “olhar para os pormenores e entendê-los”. “E essa é a parte mais interessante. Não é preciso ir a África. É preciso começar a entender os pormenores.

Este algarvio até não tinha passado as primeiras etapas da vida muito longe de casa. Uns passeios com os pais ali em Espanha e ali em Marrocos, o liceu em Portimão e a faculdade (de Arquitectura) em Lisboa antes de fazer as malas para o Erasmus (em Itália) e os primeiros trabalhos na Holanda e Dinamarca. Estava certo que “mais dia, menos dia ia deixar a Arquitectura” e a crise do subprime e do sector imobiliário serviu de alavanca. Em 2006, deu por si a organizar surf trips para holandeses, que galgavam as ondas atlânticas de França. “Não me ocorreu que Portugal ainda não estava nos roteiros europeus.” A mensagem passou, a cena repetiu-se em Copenhaga e Pedro, “uma espécie de guru”, criou uma plataforma de reservas online que iria colocar Portugal no mapa do surf. Acumulou dez anos de experiência até a concorrência internacional “com capacidade de projecção superior” o ter levado a procurar novos caminhos.

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Pedro Quirino

Foi precisamente em 2016 que decidiu fazer um safari de overlanding — expressão normalmente associada a uma viagem de camião auto-suficiente, normalmente explorando locais remotos e interagindo com as culturas autóctones — que mudaria o seu rumo. “Um safari à antiga”, descreve Pedro Quirino, 38 anos, que desde então tem andado por África “de um lado para o outro” a conduzir um camião durante a temporada de safaris (que vai de Abril a Novembro) em que faz seis, sete viagens entre 15 a 19 dias cada através de países como África do Sul, Namíbia, Botswana, Zâmbia, Zimbabwe, Moçambique, Uganda, Quénia e Tanzânia. “São viagens muito cansativas em que conduzo, monto e desmonto o acampamento, cozinho... É extenuante.”

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Esse primeiro safari, costa atlântica acima até às cataratas de Vitória, durou 24 dias. Pedro e o guia Jo Cooper ficaram amigos e o sul-africano convidou Quirino para o ajudar no lançamento da sua própria empresa, Footsteps Through Africa. “Fi-lo à distância e esse ano correu demasiado bem”, conta à Fugas o português, que pouco depois recebeu um telefonema e um convite para ficar com o segundo camião da jovem empresa. “Viver em África daqui a muitos anos sempre tinha sido um sonho. Engraçado como a vida nos oferece estes atalhos. Aceitei imediatamente.”

Foi em 2017 e directo para a formação para guias de safari a bordo da academia EcoTraining, que quatro meses e muitas disciplinas (Tracking, Botânica, Astronomia, Orientação, Sobrevivência e um pouco de Mecânica) depois lhe atribuiu a cédula profissional que lhe possibilita ter clientes sob a sua responsabilidade em determinadas reservas naturais. “Foi das melhores experiências da minha vida”, garante. “Acima de tudo dá-nos uma experiência e um conhecimento sobre todo o ecossistema, sobre a forma como tudo funciona na savana, que vai muito mais além do que nós vemos no National Geographic ou na Wikipédia. Estamos lá, pegamos nas plantas, vemos os animais e percebemos como tudo interage. Foram meses no mato sem electricidade e sem telemóvel com instrutores com um conhecimento muito profundo do mato.”

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"Não é preciso ir para África. É preciso começar a entender os pormenores"

Com a carta de pesados de passageiros e o curso na mão, Pedro andou quase um ano a estagiar com Jo. Conheceu as estradas e os facilitadores de fronteiras e alfândegas, habituou-se às manhas do camião e das estradas de terra, absorveu as paisagens e as comunidades que foram ficando anotadas, habituou-se aos big five, presença “quase certa” nas suas viagens. “Nunca há um dia igual ao outro. As distâncias são enormes e as estradas não estão no melhor estado. Passamos muito tempo em viagem, cerca de trezentos quilómetros em média por dia. Ao todo fazemos cerca de três mil, por vezes quatro mil quilómetros”, contabiliza Pedro Quirino, que normalmente conduz grupos de dez pessoas que acampam onde lhes é apontado atempadamente pelos guardas das reservas e dos parques. “Dão-nos as coordenadas do local exacto onde podemos acampar. E as coordenadas estão sempre a mudar de forma a não deixarmos vestígios da nossa presença.”

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Oleadas as viagens, ainda a pandemia não era pandemia, Pedro Quirino contactou a Landescape para propor o conceito overlanding — em regime de exclusividade para o mercado português — e hoje a agência fundada por Rafael Polónia apresenta no catálogo explorações no Botswana, Zimbabwe, Zâmbia, Uganda e Moçambique. Mas quis a covid-19 que o safari africano se transformasse numa aventura não muito longe de casa.

Quando se deu o lockdown de Março de 2020, Quirino estava cá ("fiquei a viver na Costa Vicentina; sou apaixonado") e já não voltou para lá. De pés e mãos atadas, a Landescape desafiou os seus líderes a reinventarem Portugal e Quirino apresentou um percurso na sua zona de conforto, juntando-se a uma lista de explorações no regime vá-para-fora-cá-dentro que hoje inclui o Guadiana, os açudes e serranias de Oleiros, o vale da Ferraria, a serra do Açor, trekking na serra da Freita, caiaque nas ilhas galegas, na serra da Arrábida ou entre as arribas do Douro internacional, caminhadas pela serra do Alvão, pelas margens do rio Ovelha ou pelo litoral do Algarve, isto para além das explorações pelos Açores (ilhas Terceira, Flores, Corvo, Faial, São Jorge e Pico).

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“Adoptei uma postura que adopto em África”, assume Pedro, que passou a olhar com outros olhos para o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. “Sempre conheci bem a zona, mas queria perceber verdadeiramente o ecossistema, as tradições e a forma como funcionam em estreita ligação com a natureza.” As sardinhas que só chegam no Verão, os sargos que só surgem a partir de Outubro, a migração do peixe e das aves, os lugares que só o eram por causa das populações mais pobres que viam na pesca mais um meio de subsistência, a “interacção do homem com o território”. “É obrigação do guia ter uma atitude pedagógica sempre focada na sustentabilidade ambiental. Viajar em África ou em qualquer destino não deve ser apenas contemplação de paisagens. E essa é a grande vantagem de viajar com um guia.”

O pack Costa Vicentina, disponível entre os meses de Outubro a Abril, faz-se durante 13 dias (as pessoas podem encurtar a sua aventura) de Porto Covo ao Zavial (passagens por Odemira, Vila Nova de Mil Fontes, Almograve, Cabo Sardão, Zambujeira do Mar, Odeceixe, Monte Clérigo, Arrifana, Carrapateira, Vila do Bispo e Sagres) a pé, de bicicleta, de caiaque e até num barco de pesca. Chama-lhe um “safari na Costa Vicentina”. “Entre aspas.”