Tribunal sul-coreano ordena compensação do Japão a “mulheres de conforto”
Japão considera veredicto de tribunal de Seul “inaceitável” e garante que não o vai aplicar, invocando um acordo de 2015 sobre as escravas sexuais dos bordéis militares japoneses.
Um tribunal de Seul ordenou, esta sexta-feira, que o Japão compense 12 mulheres forçadas a trabalhar nos bordéis para os militares japoneses antes e durante a II Guerra Mundial.
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Um tribunal de Seul ordenou, esta sexta-feira, que o Japão compense 12 mulheres forçadas a trabalhar nos bordéis para os militares japoneses antes e durante a II Guerra Mundial.
A questão das escravas sexuais, que os japoneses chamam “mulheres de conforto”, foi já tratada duas vezes entre o Japão e a Coreia do Sul – num tratado de 1965 que normalizava as relações entre os dois países e num acordo de 2015, e o Japão alega que por causa disso vê a questão como encerrada.
Mas o acordo de 2015 foi alvo de muitas críticas, por não terem sido ouvidas as vítimas, muitas ainda vivas. O tribunal distrital de Seul diz, por isso, que o acordo não pode retirar às mulheres o direito de serem compensadas, noticia a agência Reuters. E ordenou o pagamento de 100 milhões de wons (cerca de 74 mil euros) a cada uma das mulheres pelo Estado japonês.
O Tribunal disse que as mulheres foram vítimas de abusos sexuais que causaram danos corporais, doenças venéreas e gravidezes indesejadas, além de “grandes cicatrizes mentais”.
De Tóquio a reacção foi dura: o veredicto é “inaceitável”, disse o chefe de gabinete do Governo japonês, Katsunobu Kato. Seul deve “tomar as medidas apropriadas”, acrescentou, citado pela Reuters. O primeiro-ministro, Yoshihide Suga, disse que o Japão não aceitaria o veredicto.
O embaixador sul-coreano em Tóquio, chamado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, disse que iria tentar que a decisão não tivesse um “impacto indesejável” na relação entre os dois países. O embaixador Nam Gwan-pyo declarou ainda: “agora é importante que os dois lados respondam de um modo calmo.”
As relações entre a Coreia do Sul e o Japão, que têm importantes ligações comerciais e interesses partilhados, têm sofrido com discussões sobre o passado histórico nos últimos anos, como por exemplo um veredicto do Supremo da Coreia do Sul obrigando duas empresas japonesas a compensar sul-coreanos que estas sujeitaram a trabalhos forçados durante a guerra. Os antigos trabalhadores tentaram apropriar-se e vender bens das empresas na Coreia do Sul, o que Tóquio avisou que levaria a uma “situação muito grave”, lembra a agência Reuters.
Antes da reacção do Japão ao veredicto, peritos legais diziam que não era provável que Tóquio o aceitasse, e uma organização de apoio às mulheres afirmava que poderia levar a cabo uma tentativa de congelar bens do Governo japonês na Coreia do Sul se o Japão se recusasse a dar a compensação.
O tribunal vai ainda analisar mais um processo de 20 mulheres e das suas famílias na próxima semana, diz o diário britânico The Guardian.
O acordo de 2015 foi denunciado pelo Presidente Moon Jae-in, que o anulou quando tomou posse dizendo que não reflectiu a importância da questão para os sul-coreanos. O acordo previa um fundo de mil milhões de yens (cerca de 7,8 milhões de euros) para as vítimas.
“Foi um crime contra a humanidade que foi cometido sistematicamente, deliberadamente e amplamente pelo Japão em violação das normas internacionais”, disse o ministro da Justiça, Kim Jeong-on, depois do veredicto. “Mesmo que tenha sido um crime de um país soberano, não pode ser aplicado porque foi cometido contra as nossas cidadãs na península coreana que estava ilegalmente ocupada pelo Japão.”
Alguns historiadores estimam que até 200 mil raparigas e mulheres, sobretudo coreanas (mas também chinesas, do sudeste asiático e um menor número de japonesas e europeias) foram forçadas a ter sexo com os militares japoneses entre 1932 e a derrota do Japão em 1945.
Das vítimas registadas, apenas 16 estão ainda vivas, e seis das 12 vítimas morreram desde o início deste processo, em 2016.
A Amnistia Internacional reagiu ao veredicto sublinhando que foi a primeira vez que um tribunal interno reconheceu a responsabilidade do Japão nos bordéis do tempo da guerra.