Governo de Itália tem três semanas para rever o orçamento, ou ser punido por Bruxelas
Pela primeira vez, a Comissão Europeia rejeitou a proposta orçamental de um Estado membro da UE, que não cumpre as metas estabelecidas no Pacto de Estabilidade e Crescimento. "Não tivemos outra alternativa", lamentou o vice-presidente da Comissão.
A decisão “inédita” mas “não surpreendente” da Comissão Europeia, que esta terça-feira chumbou a proposta de orçamento apresentada pela Itália e abriu um prazo de três semanas para a apresentação de um plano revisto para o próximo ano de 2019, representa “um momento forte e grave”, mas não é o fim do processo nem do diálogo entre Bruxelas e Roma, sublinhou o comissário europeu dos Assuntos Económicos e Financeiros, Pierre Moscovici, sem querer especular sobre o possível desfecho desse confronto anunciado: uma acção disciplinar, também “sem precedentes”, sobre um Estado membro da UE por irresponsabilidade na gestão orçamental.
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A decisão “inédita” mas “não surpreendente” da Comissão Europeia, que esta terça-feira chumbou a proposta de orçamento apresentada pela Itália e abriu um prazo de três semanas para a apresentação de um plano revisto para o próximo ano de 2019, representa “um momento forte e grave”, mas não é o fim do processo nem do diálogo entre Bruxelas e Roma, sublinhou o comissário europeu dos Assuntos Económicos e Financeiros, Pierre Moscovici, sem querer especular sobre o possível desfecho desse confronto anunciado: uma acção disciplinar, também “sem precedentes”, sobre um Estado membro da UE por irresponsabilidade na gestão orçamental.
Do lado de Bruxelas, ninguém está preparado para falar nesse cenário mais drástico. “Vamos caminhar passo a passo, de forma cuidadosa e construtiva, sem fechar portas, sem perder de vista o interesse de todos”, apelou o comissário francês, que ainda na semana passada viajou até Roma para dar conta do alarme de Bruxelas e reforçar de viva voz, as preocupações da Comissão com o risco considerável de as contas públicas italianas violarem as regras orçamentais dos países da zona euro.
Esta terça-feira em Estrasburgo, Moscovici não foi brando nas palavras que usou para criticar firmemente o “desvio claro e intencional dos compromissos assumidos pelo Governo italiano”, referindo-se tanto ao respeito pelas recomendações orçamentais adoptadas no Conselho de 13 de Julho, como ao cumprimento das regras previstas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento a que estão sujeitos todos os países da zona euro.
Mas, ao mesmo tempo, procurou calibrar o seu discurso com notas positivas e de esperança numa resolução do problema dentro do prazo oferecido a Roma para rever o seu exercício orçamental, arrepiar caminho e escapar à penalização — muito provavelmente, sob a forma de um procedimento por défice excessivo, tal como previsto no âmbito do Semestre Europeu.
Nem Moscovici, nem ao seu lado o vice-presidente da Comissão Europeia responsável pela pasta do Euro e da Estabilidade Financeira, Valdis Dombrovskis, quiseram avançar muito nas explicações das possíveis medidas disciplinares ou sanções e punições (ainda que Dombrovskis tenha notado, en passant, que todos os Estados-membros que durante a crise se confrontaram com procedimentos por défice excessivo corrigiram os seus défices).
Os dois preferiram, para já, atirar a pressão — e a responsabilidade da crise — para o executivo liderado pelo primeiro-ministro, Giuseppe Conte, sublinhando que o momento ainda é de negociação e insistindo que Bruxelas não deseja um confronto. “Hoje não é o fim da história, é uma etapa do processo e o diálogo continua”, sublinhou Moscovici, informando que a Comissão preparará uma nova opinião assim que receber um novo documento de Roma.
Sem plano B
“O Governo tem três semanas para submeter um projecto revisto de orçamento. Quando ele chegar, nós faremos a nossa análise e prepararemos uma nova opinião”, disse, lembrando que entretanto a Comissão apresentará as suas previsões económicas de Outono. “Veremos se se aproximam ou não do que diz o Governo italiano”, acrescentou.
Numa posição desafiadora assumida na véspera, o primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, tinha repetido que não existe um “plano B” para o orçamento. E depois da conferência de imprensa dos dois comissários europeus, no Parlamento Europeu de Estrasburgo, uma porta-voz do ministro da Economia, repetiu que o Governo não tencionava abandonar o seu plano de promoção do crescimento económico à custa da expansão da despesa e do défice.
Mais provocatório na sua reacção, Luigi Di Maio, o vice primeiro-ministro e líder do Movimento 5 Estrelas, um dos dois partidos da coligação populista italiana, lembrou que o seu país é soberano e que os planos do seu Governo têm de ser respeitados por Bruxelas. “Não me surpreende nada que a União Europeia não goste do nosso orçamento. Porque este é o primeiro orçamento escrito por Roma e não por Bruxelas”, escreveu nas redes sociais. “Mas nós não vamos desistir”, prometeu.
Depois de lamentar a postura das autoridades italianas, que como salientou “não deixaram outra alternativa à Comissão” que não rejeitar a proposta enviada por Roma, Dombrovskis focou-se mais uma vez nos “problemas” detectados no documento e que não foram explicados “de forma convincente” — como por exemplo, o projectado aumento de 0,8 pontos percentuais do défice estrutural, quando o que a Itália aprovou no Conselho foi uma redução de 0,6% do PIB.
O vice-presidente da Comissão lembrou que a Itália tem a segunda dívida pública mais alta da zona euro, de 131% do PIB ou 37 mil euros por habitante (valores de 2017), e que o serviço da dívida come uma parcela de 65,5 mil milhões de euros, ou 3,8% do PIB, que é idêntica no orçamento ao sistema de educação. “A dívida excessiva torna a economia mais vulnerável”, disse Dombrvskis, que não acredita nas previsões de Roma de que o aumento da despesa — e da dívida — vá promover o crescimento. “Pelo contrário, tem um efeito oposto”, assinalou. “Aumentar a dívida não é uma estratégia inteligente”, concordou Moscovici.
Os dois comissários insistiram que a avaliação feita à proposta italiana não põe em causa as opções e prioridades políticas do Governo de Roma, apenas o cumprimento das metas definidas em termos do limite do défice, da redução da dívida e do esforço de consolidação. “Neste debate não há preferências políticas, nem julgamentos subjectivos. A Comissão não vai interferir nas escolhas internas que são legítimas”, garantiu Moscovici. A dúvida agora é se Itália vai escolher violar as regras, e sofrer as consequências.