Com demissão de Collomb, Macron perde uma peça-chave e aprofunda crise

O primeiro pedido de demissão do ministro do Interior, na segunda-feira, foi rejeitado por Macron. Mas o Presidente francês não teve outra alternativa senão deixar sair um dos homens mais importantes do Governo e um dos seus primeiros aliados.

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Gérard Collomb, antigo dirigente do Partido Socialista, foi um dos primeiros apoiantes de Macron REUTERS/Christian Hartmann

Não foi à primeira, teve de ser à segunda. Depois de ter rejeitado um primeiro pedido de demissão do ministro do Interior, Gerard Collomb, o Presidente francês não teve outra alternativa senão, menos de 24 horas depois, deixar sair um seus ministros-chave, e um dos seus aliados mais próximos no Governo.

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Não foi à primeira, teve de ser à segunda. Depois de ter rejeitado um primeiro pedido de demissão do ministro do Interior, Gerard Collomb, o Presidente francês não teve outra alternativa senão, menos de 24 horas depois, deixar sair um seus ministros-chave, e um dos seus aliados mais próximos no Governo.

Não só a saída de Collomb aprofunda a crise de Macron – cuja popularidade tem vindo a cair – ao juntar-se à lista de ministros que se demitiram, como os contornos desta demissão põe, mais uma vez, em causa a autoridade do chefe de Estado francês.

Há duas semanas, o agora ex-ministro do Interior disse à imprensa (e não ao Presidente) que, no próximo ano, a seguir às eleições europeias de Maio, ia deixar o cargo para se candidatar à autarquia de Lyon, tentando regressar às funções que ocupou entre 2001 e 2017.

Mas, na segunda-feira, Collomb manifestou o desejo de sair já. Em novas declarações aos media, desta vez ao jornal Le Figaro, disse que “o povo francês e o povo de Lyon necessitam de clareza”. “Por isso mantenho a minha proposta de demissão”, acrescentou.

“Após os ataques ao ministro desde que disse que seria candidato ao cargo de presidente da câmara de Lyon, o Presidente reiterou a sua confiança nele e pediu-lhe que se mantivesse totalmente comprometido com a sua missão”, disse à Reuters uma fonte do Eliseu, confirmando que o pedido de demissão tinha sido rejeitado.

No entanto, na terça-feira à noite, o gabinete de Macron confirmou que a demissão do ministro foi aceite. O primeiro-ministro, Edouard Philippe, que cancelou uma visita à África do Sul, vai acumular para já a pasta do Interior enquanto não se encontra um substituto.

Relativamente à cronologia desta demissão, o Le Monde, no seu editorial desta quarta-feira, diz que “se não fosse um assunto de Estado, era de rir com uma situação cómica”.

Mas anúncios de demissões através da imprensa já não são novidade no mandato de Macron. No final de Agosto, o popular ministro do Ambiente, Nicolas Hulot, surpreendeu todos ao anunciar a sua saída numa entrevista em directo numa rádio.

“Dos seis principais ministros – em ordem protocolar – em funções desde o início do mandato de Emmanuel Macron, resta apenas um, Jean-Yves Le Drian (dos Negócios Estrangeiros). Havia três ministros de Estado. Não sobra nenhum. François Bayrou [ministro da Justiça que se demitiu em Junho do ano passado por uso indevido de fundos do Parlamento Europeu], Nicolas Hulot e Gerard Collomb já não estão no Governo. Mas é principalmente a autoridade do Presidente que está enfraquecida”, sublinha o semanário Le Journal Du Dimanche.

Pouco tempo depois da demissão de Hulot foi Laura Flessel, ministra do Desporto, a pedir a demissão, mas por motivos pessoais.

Collomb, de 71 anos, que fazia parte do Partido Socialista, foi um dos primeiros socialistas a manifestar apoio ao então candidato presidencial Macron nas eleições do ano passado. Chegou a comparar a sua relação com o Presidente com uma de pai e filho. Por isso, foi sendo visto como uma espécie de mentor político de Macron e um dos membros do Governo que lhe era mais próximo.

Foi-lhe entregue a pasta do Interior, uma das mais importantes, tendo em conta que a segurança nacional se tornou uma das prioridades para o Governo e para a população francesa depois dos atentados terroristas em França.

As primeiras divergências entre ambos começaram na Primavera deste ano, quando Collomb expressou dúvidas sobre a intenção do Governo em reduzir os limites de velocidade nas estradas secundárias em França.

Em Julho, o distanciamento aprofundou-se na sequência do caso de Alexandre Benalla, membro da equipa de segurança de Macron que foi filmado a agredir violentamente um manifestante no 1º de Maio.

Numa comissão parlamentar, Collomb culpou mesmo o Presidente pela polémica, pois este tinha tido conhecimento das agressões e nada fez. Benalla acabou despedido dois meses depois.

As críticas subiram de tom nas últimas semanas. Segundo citaram os jornais franceses, numa conversa com um pequeno grupo de jornalistas Collomb falou da “falta de humildade” de Macron. “Muito poucos de nós consegue ainda falar [com Macron]”, terá dito. “Em breve vai deixar de ter de me aturar.”

Nesta quarta-feira houve Conselho de Ministros já sem a presença de Collomb. Aí, segundo informou o porta-voz do Governo, Benjamin Griveaux, Macron garantiu que não há qualquer crise política, argumentando que o “Estado funciona” e que o “Governo está perfeitamente no cumprimento das suas funções”.