Sergio Moro voltou para assombrar o PT a poucos dias das eleições

Juiz da Lava-Jato decidiu divulgar teor da delação premiada de Antonio Palocci, antigo aliado de Lula, que expõe pormenores do esquema corrupto que envolveu a Petrobras.

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O juiz Sergio Moro decidiu divulgar o depoimento dado por Palocci NUNO FERREIRA SANTOS

A Operação Lava-Jato entrou de rompante na campanha presidencial brasileira, depois de o juiz Sergio Moro ter decidido tornar público o depoimento do ex-ministro Antonio Palocci, em que este incrimina directamente o ex-presidente Lula da Silva.

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A Operação Lava-Jato entrou de rompante na campanha presidencial brasileira, depois de o juiz Sergio Moro ter decidido tornar público o depoimento do ex-ministro Antonio Palocci, em que este incrimina directamente o ex-presidente Lula da Silva.

Um dos pontos mais sensíveis é a descrição feita por Palocci de uma reunião em 2010, em que participaram Lula, Dilma Rousseff e o então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que é hoje um dos coordenadores da campanha de Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores, o de Lula). Nesse encontro, diz o ex-ministro, Lula pediu a construção de 40 sondas para a exploração das reservas de petróleo na camada oceânica “para garantir o futuro político do país e do PT”.

Entre outras acusações, Palocci disse que 3% dos contratos de publicidade da Petrobras acabavam nos cofres do partido. O ex-ministro contou que as duas campanhas de Dilma para a presidência custaram 1,4 mil milhões de reais (300 milhões de euros), muito acima do que foi declarado junto do Tribunal Superior Eleitoral.

Mas não é apenas o PT a ser visado por Palocci. Em 2008, dirigentes do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB, actual MDB), do Presidente, Michel Temer, fizeram pressão para que Jorge Zelada fosse nomeado director da divisão internacional da Petrobras. Assim que chegou ao cargo, Zelada “tratou de promover a celebração de um contrato”, disse Palocci, “com larga margem para propina [suborno]” e que terá rendido ao partido 40 milhões de dólares. Zelada está preso desde 2015 e foi condenado a 12 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Lula e PT defendem-se

As declarações de Palocci foram feitas durante um depoimento em Abril junto da Polícia Federal, mas Moro, responsável pela megainvestigação à corrupção num processo designado Lava-Jato, decidiu divulgá-las na segunda-feira à noite, dizendo não vislumbrar “riscos para a investigação”.

A defesa de Lula da Silva – que está a cumprir uma pena de prisão de 12 anos por corrupção e lavagem de dinheiro – disse que as acusações de Palocci são mentira e acusou Moro de estar a “agir politicamente” ao divulgar o conteúdo do depoimento a menos de uma semana das presidenciais, cuja primeira volta são no domingo.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse que Moro “não podia deixar de participar no processo eleitoral” e que esta é apenas a “enésima vez” que o juiz tenta “destruir Lula”. Dilma também divulgou um comunicado em que diz que as acusações feitas por Palocci são “absolutamente falsas”.

A imprensa brasileira nota que as revelações feitas por Palocci não são exactamente novas, mas o seu impacto, a poucos dias da primeira volta das eleições, pode ser profundo. No domingo, os brasileiros escolhem o primeiro Presidente desde que a Operação Lava-Jato começou a trazer à tona os contornos dos negócios realizados durante anos entre os principais partidos nacionais e algumas das principais empresas brasileiras.

Um dos principais beneficiados poderá ser o candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro, que se tem apresentado como o único capaz de combater a corrupção investigada pela Justiça. Apesar de ser deputado há quase 30 anos, a estratégia de Bolsonaro privilegia um discurso anti-sistema, criticando tanto o PT como o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) ou o MDB.

O candidato foi rápido a tentar capitalizar com a notícia, dizendo, através do Twitter, que uma vitória do “PT representa o fim da Lava-Jato e a volta dos esquemas que ameaçam a democracia”.

Para o PT, cuja campanha está baseada na popularidade de Lula, o regresso das acusações contra o ex-Presidente deverá reforçar a rejeição do seu candidato, Fernando Haddad, que tenta assegurar a presença na segunda volta, marcada para 28 de Outubro. Bolsonaro está instalado na liderança das sondagens desde que a campanha começou e é nessa posição que deve chegar no domingo.

A revelação da delação de Palocci dá uma renovada esperança aos candidatos que tentam chegar à segunda volta. A companheira de candidatura de Ciro Gomes, Kátia Abreu, disse esta terça-feira que a Lava-Jato “não vai dar paz ao PT”. “Essa lembrança ruim vai persistir durante a segunda volta”, afirmou a candidata, sugerindo que o PT será derrotado por Bolsonaro.

Delator crucial

Palocci é uma testemunha-chave na investigação ao megaesquema de corrupção que envolve a Petrobras e os governos do PT. O ex-ministro, preso desde 2012 e condenado a 12 anos de prisão por corrupção, era muito próximo de Lula e terá servido como intermediário entre os elementos do Governo e a construtora Odebrecht. Para além de amigo pessoal do ex-Presidente, com quem dava passeios a pé, Palocci foi ministro das Finanças e da Casa Civil e ainda coordenador da campanha de Dilma Rousseff.

Em Setembro de 2017, Palocci tinha já feito acusações graves durante um depoimento perante Sergio Moro. Na altura, o ex-ministro disse que Lula fez “um pacto de sangue” com os donos da Odebrecht, dando-lhes a garantia de que mesmo com Dilma na presidência a construtora iria continuar a ser privilegiada.

Desde que se viu envolvido na teia da Lava-Jato, Palocci tem tentado estabelecer acordos de “delação premiada” – que permite que suspeitos de crimes possam ver as suas penas reduzidas a troco de informações que os investigadores considerem mais valiosas. No início do ano, o Ministério Público Federal negou fazer um acordo com o ex-ministro, mas Palocci acabou por conseguir negociar uma delação premiada directamente com a Polícia Federal, algo raro, diz o El País Brasil.

O juiz do Tribunal Regional Federal de Porto Alegre, João Gebran Neto, aceitou em Junho o acordo entre Palocci e a Polícia Federal, mas sublinhou que as acusações lançadas pelo ex-ministro “deverão ser reforçadas por prova”, sob pena de os benefícios concedidos a Palocci poderem vir a ser retirados.