Bombeiros perderam o controlo do fogo na serra de Monchique. Chamas voltam a ameaçar a vila
Fogo volta a aproximar-se da sede do município. Fora da vila, as populações foram evacuadas por precaução, mas houve quem tivesse resistido às ordens da GNR. Terão ardido pelo menos meia dúzia de habitações. Número de feridos ligeiros chega às três dezenas.
Desta vez não houve vítimas mortais, mas a descoordenação entre forças de segurança e agentes de protecção civil repetiu-se. O fogo, que lavra desde sexta-feira na serra de Monchique estava, na noite de segunda-feira, incontrolável. “O quadro geral da operação continua bastante complexo”, afirmou ao final do dia o 2.º comandante da Protecção Civil Distrital Abel Gomes, sublinhando o agravamento das condições meteorológicas. As chamas trocaram as voltas aos bombeiros, instalou-se a confusão e houve pessoas que tiveram de ser retiradas à força das suas casas. O alto da Fóia transformou-se num vulcão de chamas a derramar calor e fumo negro sobre a costa algarvia.
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Desta vez não houve vítimas mortais, mas a descoordenação entre forças de segurança e agentes de protecção civil repetiu-se. O fogo, que lavra desde sexta-feira na serra de Monchique estava, na noite de segunda-feira, incontrolável. “O quadro geral da operação continua bastante complexo”, afirmou ao final do dia o 2.º comandante da Protecção Civil Distrital Abel Gomes, sublinhando o agravamento das condições meteorológicas. As chamas trocaram as voltas aos bombeiros, instalou-se a confusão e houve pessoas que tiveram de ser retiradas à força das suas casas. O alto da Fóia transformou-se num vulcão de chamas a derramar calor e fumo negro sobre a costa algarvia.
Cerca das 22h40 desta segunda-feira, o fogo rodeava novamente a vila de Monchique como um pequeno presépio. Ali, e após 40 minutos de ataque intensivo às chamas, os bombeiros voltaram a controlá-las. Uma casa de madeira pertencente a cidadãos estrangeiros foi destruída. O fogo também andou perto do Convento de Nossa Senhora do Desterro, mas não chegou a atingi-lo.
Os peritos tinham avisado: Monchique está na linha da frente das zonas de alto risco de incêndio. O perigo de voltar a repetir-se uma tragédia semelhante ao ano de 2003, quando ardeu quase todo o concelho, estava escrito. O primeiro-ministro, António Costa, foi no início do Verão ao terreno avaliar as acções de prevenção lançadas pelo Governo e os meios disponíveis de ataque ao fogo. “Prontos”, garantiram-lhe os operacionais, exibindo os meios de combate. Falharam na primeira prova. “Não esperava voltar a ver uma coisas destas”, comentava António José Santos ao princípio da manhã desta segunda-feira, enquanto distribuía alimentos aos bombeiros, no quartel de Monchique — uma oferta da paróquia de Marmelete, de que faz parte.
Depois de uma noite em luta contra as chamas, os bombeiros faziam na altura uma pausa para retomar forças. Na zona estão 1105 operacionais de várias zonas do país, apoiados por 341 veículos e mais de uma dezena de aeronaves — incluindo três aviões Canadair disponibilizados pelo Governo espanhol.
A ameaça das chamas, durante a noite de domingo, tinha obrigado à evacuação da vila de Monchique, ficando a população mais idosa a receber assistência na escola EB 2,3 da vila. Ao final da manhã de ontem, a Protecção Civil dava o fogo como praticamente dominado, mas à tarde já estava fora do alcance dos bombeiros. À noite descarrilou por completo. Além da Fóia, Odelouca, a zona de Caldas de Monchique e o sítio do Cascalheiro eram os pontos mais críticos. “As chamas reactivaram e com grande intensidade”, disse Abel Gomes. O vento aumentou de intensidade, surgiram projecções que “ultrapassaram a capacidade de extensão dos combatentes”, acrescentou. Foram disponibilizadas 24 máquinas de rasto, mas na fase inicial apenas duas estiveram a trabalhar. Faltou ordens superiores para avançar.
No Centro de Meios Aéreos, a cerca de duas centenas de metros de distância do quartel dos bombeiros voluntários de Monchique, cinco helicópteros não chegaram a levantar voo durante toda a manhã, por falta de visibilidade. “Estão em jogo questões de segurança”, justificou Abel Gomes.
O presidente da câmara, Rui André, viu arder tudo em volta da sua casa e anda no terreno desde sexta-feira, quando começou o incêndio: “Tenho conhecimento de algumas casas de primeira habitação ardidas e bastantes de segunda habitação e apoios agrícolas. “Houve pessoas que ficaram nas suas casas, escondendo-se ou fugindo das forças de segurança, para ajudar no combate”, garantiu.
O presidente da Comissão Distrital de Protecção Civil, Jorge Botelho (também presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve — Amal) desdramatizava ao final da manhã: “Noventa e cinco por cento do perímetro do fogo está considerado dominado.” Entretanto, o número de pessoas feridas subia de 25 para 29, entre as quais, uma mulher de 72 anos, que teve de ser transportada para o Hospital de São José, em Lisboa.
Marmelete foi uma das aldeias evacuadas à força. As pessoas resistiram até não mais poder às ordens de abandono das casas, dadas pela GNR. Pela estrada fora, rumo ao alto da Picota, são quilómetros e quilómetros de terra cor de cinza, com árvores negras por todo o lado. “Aqui está uma casa de primeira habitação ardida, ali abaixo estão mais duas”, diz Márcio Oliveira, à porta do restaurante do pai, na Malhada Quente, a quatro quilómetros da freguesia de Marmelete: “Se não fôssemos nós a ter resistido, ficando aqui, isto tinha ardido tudo”, disse: “O fogo apareceu, de repente, por volta das quatro e meia, bombeiros zero, só pelas 22h é que surgiu um carro a passar.” Numa habitação próxima do restaurante, acrescenta, “arderam patos, galinhas, perus, pavões — salvou-se só uma cadela e dois ou três pombos”.
Garcindo Barradas, do sítio da Nave Redonda, junta-se à conversa e acrescenta mais críticas à falta de assistência: “Tanto bombeiro, aviões e sei lá mais anda por aí, mas não se percebe o que andam a fazer.”
O presidente da câmara acha que houve “melhoria nas medidas de prevenção e nos meios de defesa, mas falta fazer o essencial”. O ordenamento da floresta, no entender do autarca social-democrata, é a questão central que continua por resolver. E a descentralização de competências para as autarquias, sublinha, é uma “velha reivindicação que tenho vindo a fazer, mas ainda não teve resultados”.
Na aldeia de Marmelete, Maria Fernanda, de 76 anos, diz que tinha uma casa arrendada a uns estrangeiros, não sabe o que lhes aconteceu. “A habitação ardeu, eles devem ter fugido”, presume. O marido, mais velho, sofre de uma doença cardíaca: “Acho que ele ainda não tem noção desta tragédia — trabalha uma pessoa a vida inteira, desaparece tudo em minutos.” Em Monchique, um antigo funcionário da Telecom foi impedido de ir defender a hortinha que possui nos arredores da vila. José Firme teve de se conformar. Havia razões para todos os cuidados — na noite de segunda-feira, a vila de Monchique voltava a estar ameaçada pelas chamas, tornando o ar irrespirável para os que se encontravam na localidade. O fogo continuava incontrolável.