Um "provedor da integridade" poderia reduzir conflitos de interesses

Inquérito do Conselho de Prevenção da Corrupção mostra que cerca de metade das entidades do sector público não dispõe de códigos de ética, embora a grande maioria reconheça estar exposta a situações de conflitos de interesse.

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Vítor Caldeira apresentou as concluões aos jornalistas Enric Vives-Rubio

O Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) elaborou um inquérito em final do ano passado junto das entidades públicas sobre conflitos de interesses e na sequência dos resultados, que apontam para a grande exposição a este tipo de situações, o seu presidente sugere que cada organismo tenha uma espécie de "provedor da integridade" que possa aconselhar os seus funcionários sobre situações concretas.

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O Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) elaborou um inquérito em final do ano passado junto das entidades públicas sobre conflitos de interesses e na sequência dos resultados, que apontam para a grande exposição a este tipo de situações, o seu presidente sugere que cada organismo tenha uma espécie de "provedor da integridade" que possa aconselhar os seus funcionários sobre situações concretas.

“A cultura de integridade que tem de se estender na administração pública é que os funcionários públicos ou em funções públicas têm de ter a percepção das situações” que podem configurar conflito de interesses e “declarar impedimento” nesses casos, disse o presidente do CPC, Vítor Caldeira. E como “catalogar [na lei] o que é e não é conflito de interesses não é uma boa solução, porque sempre ficariam de fora situações não previstas, seria preferível haver um conselheiro de ética em cada organismo”, defendeu.

Vítor Caldeira, que preside ao CPC por ser o presidente do Tribunal de Contas, falava na apresentação dos resultados do estudo Gestão dos Conflitos de Interesses no Sector Público, em que se conclui que cerca de metade das entidades que responderam (215 em 468) não dispõe de códigos de ética ou conduta, embora a grande maioria (443) reconheça estar exposta a situações deste tipo e 80% (374) disponham já de planos de prevenção de riscos de corrupção.

O inquérito foi feito entre Outubro e Dezembro de 2017 e obteve resposta de cerca de um terço das entidades que têm aqueles planos, um universo que representa quase metade dos funcionários públicos em todos os níveis da administração, e procurava saber o que tinha sido feito desde que, em 2012, o CPC emitiu uma recomendação para evitar conflitos de interesse. Nessa recomendação já se referia que os códigos de conduta são a forma de melhor controlar as situações de conflito de interesse, mas a maior parte das entidades ainda não dispõe deste tipo de instrumentos.

As principais medidas adoptadas foram a realização de acções de formação e sensibilização dos trabalhadores, a identificação e caracterização de possíveis situações de conflito de interesses e a obrigatoriedade de subscrição, pelos colaboradores, de declarações de inexistência de conflitos de interesses.

No entanto, nenhum dos organismos que respondeu disse ter detectado situações de conflito de interesses ao longo dos cinco anos, embora numa outra questão do inquérito tenha havido 19 entidades que reconheceram ter identificado situações desta natureza não reportadas pelos trabalhadores. Acabaram por ser identificados 57 casos novos, nunca antes reportados, que agora estão a ser investigados.

Para ajudar a identificar as situações em concreto que podem resultar em situações deste tipo, o CPC propõe-se actualizar a recomendação feita em 2012, abrangendo situações que foram identificando e outras que foram identificadas na lei, promover a criação de códigos de ética e conduta junto dos gestores públicos e identificar e difundir casos de boas práticas para promover a “cultura de integridade” na administração pública. O próprio Tribunal de Contas, onde funciona o CPC, aos seus auditores, antes de cada auditoria, uma declaração destas para o caso concreto da entidade a fiscalizar. “Se formos auditar um banco e um auditor tiver um empréstimo ali, já não poderá participar”, ilustrou Vítor Caldeira.

“Uma boa prática era ter alguém, em cada entidade, com quem o funcionário possa trocar impressões, naqueles casos que podem não estar previstos nos mecanismos de controlo mas podem ser casos de conflito de interesses”, defendeu Vítr Caldeira. Essa é uma competência que não cabe ao CPC, mas em que esta estrutura quer dar uma ajuda: “O que o CPC pode assumir é procurar ter uma espécie de elenco ilustrativo de situações, a partir de casos que possam já ter acontecido e que devem ser vistos como risco de conflito de interesses, e dizer como é que podem ser considerados se se verificarem”.

O Código dos Contratos Públicos, na última revisão, passou a prever que os membros dos júris dos concursos públicos apresentem declaração de inexistência de conflito de interesses naquele caso em concreto. Este tipo de novidades deverá ser agora incluído na recomendação do CPC de 2012.

Outras medidas agora em discussão no Comissão Eventual para a Transparência em Funções Públicas, como o alargamento do universo de pessoas que serão obrigadas a entregar declaração de rendimento, património e registo de interesses – como autarcas, magistrados e juízes, consultores do Estado para certos negócios ou dirigentes de segundo grau da administração pública, são bem vistas também pelo presidente do CPC.

“Julgo que essa intenção se traduz, também por parte da Assembleia da República, a consciência clara de que é necessária essa nova cultura de transparência, integridade e comportamentos éticos por parte de os que têm responsabilidades na função pública ou exercem altos cargos políticos, incluindo na magistratura. É um processo que está a fazer o seu caminho e que registo como positivo”, disse Vítor Caldeira, falando a título pessoal.