ANC escancara a porta de saída, Zuma arrasta decisão
Presidente propôs abandonar o cargo dentro de três a seis meses, mas a cúpula do partido comunicou-lhe que quer uma resolução urgente. Zuma vai responder na quarta-feira
O Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês) confirmou os rumores noticiados nos últimos dias pela imprensa sul-africana e revelou ter transmitido a Jacob Zuma que exige a sua saída imediata da presidência da África do Sul.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês) confirmou os rumores noticiados nos últimos dias pela imprensa sul-africana e revelou ter transmitido a Jacob Zuma que exige a sua saída imediata da presidência da África do Sul.
A decisão foi formulada no comité executivo do partido, reunido de urgência na segunda-feira, em Pretória, e foi anunciada na terça pelo seu secretário-geral, Ace Magashule, numa conferência de imprensa onde também foi ratificada a opção favorável à nomeação de Cyril Ramaphosa como sucessor de Zuma. Foi, aliás, o próprio vice-presidente que comunicou a deliberação da cúpula do ANC ao homem que preside à África do Sul desde 2009 e que está envolvido em múltiplos casos de corrupção.
Segundo Magashule, Zuma propôs demitir-se dentro de três a seis meses, mas o partido rejeitou liminarmente esta possibilidade e exigiu que seu afastamento fosse “tratado com urgência”. “O Comité Nacional Executivo constatou que a África do Sul atravessa um período de incerteza e de ansiedade, por causa da questão pendente da transição”, justificou o secretário-geral.
Magashule fez questão de esclarecer, no entanto, que o ANC está de boa-fé para com Zuma – uma postura partilhada por outros membros do partido que lidera a África do Sul desde 1994. “O Presidente Jacob Zuma comportou-se como um líder do ANC. Nunca nos ameaçou com qualquer acção judicial” disse o secretário-geral à televisão sul-africana SABC. “Não há qualquer guilhotina aqui. Ele [Zuma] é um camarada”, defendeu à BBC a ministra Lindiwe Zulu.
O Comité Nacional Executivo (NEC, em inglês) não estipulou qualquer prazo para o abandono de Zuma, pelo que espera agora pela resposta do Presidente, prometida pelo próprio já na quarta-feira, para se perceber em que moldes se poderá processar o afastamento.
Se a saída de Zuma do mais alto cargo político da África do Sul parece ser uma certeza, resta saber como poderá ser colocada em prática. Magashule garantiu que a liderança do ANC não discutiu a possibilidade de destituição do Presidente através da votação favorável de uma moção de desconfiança no Parlamento sul-africano, pelo que se depreende que acredita que Zuma pode conformar-se e renunciar ao cargo, bastando para isso que envie uma carta ao presidente do Parlamento, a dar conta da sua intenção. Esta via garante, desde já, a passagem do testemunho ao vice-presidente, Ramaphosa.
Cenários
Mas a verdade é que Zuma não está vinculado à deliberação do NEC e na agenda do Parlamento sul-africano já consta a votação da referida moção, pedida pelo partido de oposição Combatentes pela Liberdade Económica (EFF), e marcada para o próximo dia 22 de Fevereiro.
O Presidente já sobreviveu a algumas moções de desconfiança com o apoio dos deputados do ANC, em maioria na câmara legislativa – a última teve lugar em Agosto do ano passado –, mas a confirmação de que o partido o quer ver pelas costas dificilmente o ajudará a manter-se no cargo após nova votação.
Acontece que, em caso de aprovação da sua saída através daquele procedimento, o cargo de Presidente interino terá ser exercido pelo presidente do Parlamento, uma vez que também o vice-presidente e os membros do Governo serão destituídos.
Um cenário que não agrada seguramente a Ramaphosa, eleito líder do ANC em Dezembro – numa votação disputada com a ex-mulher de Zuma, Nkosazana Dlamini-Zuma – e determinado em revitalizar o partido, depois de uma vitória magra nas eleições locais de 2016 e em queda acentuada nas sondagens.
Uma terceira possibilidade para o afastamento do Presidente é a abertura de um processo de impeachment. Sujeito a determinados prazos e votações, e numa altura em que o Parlamento discute uma reforma na legislação aplicável, este procedimento dificilmente seria concluído rapidamente, pelo que também será de evitar, de acordo com a postura assumida pelo ANC. Tem a palavra Jacob Zuma.