Estudo mostra apoio à criação de uma "sala de chuto" no Porto
Assembleia municipal chumbou proposta para a criação de uma sala de consumo assistido, mas entre consumidores e não só a maioria revela-se a favor.
A criação de uma sala de consumo assistido de drogas, as chamadas “salas de chuto”, no Porto, é vista com bons olhos pela grande maioria dos 1058 inquiridos no âmbito de um estudo encomendado pela Assembleia Municipal do Porto (AMP).
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A criação de uma sala de consumo assistido de drogas, as chamadas “salas de chuto”, no Porto, é vista com bons olhos pela grande maioria dos 1058 inquiridos no âmbito de um estudo encomendado pela Assembleia Municipal do Porto (AMP).
A realização de um estudo “sobre a situação da cidade em matéria de toxicodependência” foi aprovada pela AMP em Julho de 2016 por proposta do PS e do movimento de apoio a Rui Moreira, na sequência do chumbo por aquele órgão autárquico de uma proposta de recomendação do BE com vista à criação de um projecto experimental de sala de consumo assistido. Em Lisboa, a câmara já decidiu avançar com a criação, no próximo ano, de três “salas de chuto”.
A elaboração do estudo aprovado pela AMP foi entregue ao Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (UP), que fez as entrevistas de campo em Janeiro passado. O relatório foi entregue, no início deste mês, aos partidos representados na AMP. A Câmara Municipal do Porto remeteu para esta quinta-feira uma eventual posição sobre o estudo.
Os autores do estudo contactaram, no terreno, com 576 utilizadores de substâncias ilícitas e realizaram entrevistas telefónicas a 482 adultos residentes na cidade. Também tiveram em conta os dados existentes nas chamadas coortes do Porto, que têm vindo a ser acompanhadas ao longo dos anos pelo Instituto de Saúde Pública da UP e que correspondem a três grupos de população: adultos; adolescentes e recém-nascidos nascidos entre 2005 e 2006, estes acompanhados em conjunto com os pais.
98% favoráveis a "salas de chuto"
Dos 576 toxicodependentes e ex-consumidores entrevistados na rua, com uma média de idades de 44,1 anos, 98% afirmaram-se favoráveis à existência no Porto de uma sala de consumo assistida, 90% disseram que a utilizariam se existisse e 72% propuseram que se localizasse num local próximo dos bairros de venda e consumo. As entrevistas foram feitas nos bairros do Aleixo, Pinheiro Torres/Pasteleira, Francos, Cerco e na Rua Escura.
Quanto aos 482 adultos contactados telefonicamente, dois terços dos quais com mais de 65 anos, cerca de 70% concordaram com a criação de uma sala de consumo assistida e destes 42% aceitariam que esta se localizasse perto da sua zona de residência.
Entre as razões elencadas para a existência de uma sala de consumo assistida foi apontado que seria “vantajoso tanto para os consumidores como para a própria comunidade e turistas que visitam o Porto”. Muitas das respostas “também apontam para o campo da melhoria de saúde dos próprios consumidores e das condições das salas, uma vez que as percebem como local higiénico” por contraponto aos locais na rua onde costumam consumir, que costumam estar “sujos de sangue e seringas”.
Dos entrevistados na rua, 92,5% disseram que esta era o local onde consumiam. A substância mais utilizada no último ano por estes inquiridos “foi o crack/cocaína (85% fumado e 21% injectado) seguida da heroína (52% fumada e 19% injectada) e 33% referiram o consumo de metadona ou buprenorfina”.
No estudo lembra-se que na coorte de adolescentes estes foram questionados acerca do consumo de substâncias ilícitas em 2007 e em 2011, quando tinham respectivamente 17 e 21 anos. Aos 17 anos, 14,6 dos adolescentes já tinham consumido alguma substância ilícita, percentagem que subiu para 41,2% no inquérito aos 21 anos.
Uma característica que foi possível identificar nestes inquéritos dá conta de “que os jovens adultos cujos pais são mais escolarizados apresentam uma maior prevalência de alguma vez ter consumido algum tipo de drogas ilícitas”. Aos 21 anos, entre os rapazes, esta prevalência é de 59,5% para os que têm pais com mais de 12 anos de escolaridade contra 28% entre aqueles cujos pais têm seis anos ou menos de tempo de escola.