Ex-presidente da Protecção Civil critica julgamento “inclemente” do “tribunal da opinião pública”
Numa carta de despedida aos trabalhadores, Joaquim Leitão expressa "enorme mágoa" por "não ter conseguido contribuir para evitar a morte de mais de uma centena" de pessoas.
Joaquim Leitão, o anterior presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), que apresentou a demissão em Outubro após uma segunda vaga de incêndios mortíferos no país, criticou numa carta de despedida aos trabalhadores o que disse ser o “tribunal da opinião pública”, assumindo contudo uma “enorme mágoa” por “não ter conseguido contribuir para evitar a morte de mais de uma centena de conterrâneos”.
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Joaquim Leitão, o anterior presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), que apresentou a demissão em Outubro após uma segunda vaga de incêndios mortíferos no país, criticou numa carta de despedida aos trabalhadores o que disse ser o “tribunal da opinião pública”, assumindo contudo uma “enorme mágoa” por “não ter conseguido contribuir para evitar a morte de mais de uma centena de conterrâneos”.
“Considerei que as condições para continuar à frente da Autoridade Nacional de Protecção Civil deixaram de estar reunidas. Durante meses o tribunal da opinião pública julgou-nos de forma inclemente. O silêncio que a lealdade institucional nos obrigou acabou por nos sujeitar àquela provação. Portanto, considerei que bastava”, lê-se na missiva a que o PÚBLICO teve acesso.
“A história encarregar-se-á, com certeza, de mostrar aos vindouros que a realidade que fizeram crer ao grande público não é verdadeiramente real”, escreve, defendendo que “tudo” foi feito para evitar os efeitos humanos e materiais da dupla catástrofe de 2017.
“Este foi, inegavelmente, um ano trágico em matéria de incêndios rurais. Não fiquei indiferente ao sucedido, nem ninguém, estou convencido, na Autoridade. Comigo carrego a enorme mágoa destas tragédias. De não ter conseguido contribuir para evitar a morte de mais de uma centena de conterrâneos nossos, além de elevados prejuízos materiais e enormes impactos ambientais, no entanto, estou ciente de que tudo fizemos ao nosso alcance para que as coisas tivessem sido de outra feição”, disse.
O antigo responsável da ANPC afirma ainda que esteve "empenhado em projectos que visavam a modernização e maior eficácia da Protecção Civil", mas que estes, por "motivos alheios" à sua "vontade", acabaram em alguns casos por nem ser "sequer iniciados".
Joaquim Leitão apresentou a demissão a 18 de Outubro, no mesmo dia em que a então ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, bateu com a porta – duas semanas depois de pelo menos 43 pessoas terem morrido numa vaga de incêndios que atingiu vários distritos do Centro e Norte do país. Meses antes, em Junho, mais de 60 pessoas morreram no incêndio de Pedrógão Grande.
Já na carta de demissão, em Outubro, o presidente da ANPC declarava que “foram ditas muitas inverdades” sobre a actuação do organismo, “sem que fossem criadas condições para as desmentir”, que puseram em causa o “bom nome” da instituição.
A demissão era esperada após a publicação do relatório da Comissão Técnica Independente sobre o incêndio de Pedrógão Grande, de teor bastante crítico face ao desempenho da ANPC.
Joaquim Leitão, antigo comandante do Regimento de Sapadores de Bombeiros de Lisboa, é rendido pelo antigo comandante-geral da GNR, Carlos Manuel Mourato Nunes, indigitado este sábado pelo novo ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, que vai ser ouvido no Parlamento na terça-feira. com L.V.