PGR trava acesso das secretas a registos de crimes económicos
Sector judicial dá luz verde à proposta do Governo para dar acesso a registos de telefone e internet, mas propõe algumas restrições. PGR quer garantias de que as secretas não têm dados sobre suspeitas de corrupção.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) quer que fique fora dos poderes das secretas o acesso a dados de comunicações que envolvam crimes de corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio ou branqueamento. A preocupação está expressa no parecer que fez sobre a proposta de lei do Governo que pretende dar ao Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) um regime especial de acesso a dados de base e a dados de tráfego de comunicações electrónicas.
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A Procuradoria-Geral da República (PGR) quer que fique fora dos poderes das secretas o acesso a dados de comunicações que envolvam crimes de corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio ou branqueamento. A preocupação está expressa no parecer que fez sobre a proposta de lei do Governo que pretende dar ao Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) um regime especial de acesso a dados de base e a dados de tráfego de comunicações electrónicas.
Ora, no parecer a PGR mostra-se preocupada com o facto de a expressão “criminalidade altamente organizada” ser demasiado ampla para estar na lei. Citando o Código de Processo Penal, a entidade liderada por Joana Marques-Vidal sustenta que a expressão “abarca um alargado e diferenciado leque de crimes”, entre os quais estão os que respeitam à criminalidade económico-financeira (corrupção, tráfico de influências, participação económica em negócio ou branqueamento).
Na opinião da PGR são “tipologias e/ou fenómenos criminais que se afigura não justificarem, do ponto de vista das atribuições do SIRP, das finalidades que se pretendem alcançar com a proposta de lei, que estes serviços possam aceder a dados de telecomunicações e Internet relacionados com tal tipo de actos”.
A PGR quer, por isso, que tal fique fora da proposta de lei do Governo: “A solução da proposta de lei, neste particular, deverá ser ponderada no sentido de excluir tais fenómenos criminais/tipologias de crime – corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio ou branqueamento – que, nos termos legais integram o conceito de criminalidade altamente organizada, da possibilidade de acesso aos dados de telecomunicações e Internet pelo SIRP.”
Esta é apenas uma das alterações sugeridas à proposta de lei que foi aprovada na generalidade no Parlamento com os votos a favor do PSD, PS, CDP e PAN. A PGR também quer que lhe seja atribuída “competência de pronúncia relativamente ao cancelamento de procedimentos e à destruição dos dados”. "Para que ocorra uma efectiva fiscalização/controlo do acesso, e mantendo-se, como é evidente, a iniciativa do SIRP, considera-se que o pedido de acesso deverá ser remetido ao (à) Procurador(a) Geral da República, que emitirá pronúncia sobre o mesmo em matéria de legalidade", lê-se também no documento.
Secretas avisam: isto é a sério
Contas feitas aos pareceres entregues na Assembleia, o projecto do Governo parece ter pernas para andar. Apenas a Comissão Nacional de Protecção de Dados continua a considerar a proposta inconstitucional.
Favoráveis são, naturalmente, os pareceres da Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP e do Secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa. Favoráveis, mas não inteiramente confiantes. A Comissão de Fiscalização de Dados das secretas, por exemplo, deixa cair dúvidas sobre "a eficácia prática" dos procedimentos previstos para a entrega de dados às secretas nos casos mais urgentes (os juizes, do Supremo, têm 24 horas para o fazer, de acordo com a proposta do Governo). E mantém as dúvidas quanto à possibilidade de o Tribunal Constitucional (TC) vir a dar luz verde à legislação, considerando “duvidoso” que a proposta satisfaça “integralmente” as suas exigências.
Mas as dúvidas não anulam a necessidade - pelo menos, aos olhos das secretas. As justificações que constam de ambos pareceres (da Comissão de Fiscalização e do Secretário-geral) prendem-se, de uma forma geral, com o combate ao terrorismo. Que só será eficaz se for feito em articulação "com serviços congéneres estrangeiros": "Não se trata de acautelar a ocorrência de possíveis situações abstractas de atentados, mas de prevenir a sua efectiva realização, com um tempo de reacção cada vez mais encurtado por parte das entidades encarregues da sua repressão."
Aliás, os autores deste parecer consideram mesmo que “convém ter presente que os Serviços de Informações portugueses são, neste momento, de todos aqueles que integram o chamado Clube de Berna (grupo informal de serviços de informações de segurança europeus), integrado por todos os países da União Europeia, a Noruega e a Suíça, os únicos em relação aos quais a lei não prevê a possibilidade de acesso a dados de tráfego, também por vezes chamados de metadados, o que deixa os mesmos serviços numa situação de particular vulnerabilidade.”
Também o parecer do Secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa sustenta que “a luta contra o terrorismo, bem como contra a espionagem, requer, actualmente, novas, mais ágeis e tempestivas formas de cooperação transfronteiriça e internacional, tal como decorre da Estratégia Antiterrorista da União Europeia e da Estratégia da União Europeia de Combate à Radicalização e ao Recrutamento para o Terrorismo, no quadro da Estratégia de Segurança Interna da União Europeia e dos acordos internacionalmente assumidos pelo Estado Português.”
Quanto ao parecer do Conselho Superior da Magistratura, depois de ter feito um parecer prévio em que apontava para a inconstitucionalidade do diploma, adianta neste parecer final não ver obstáculo à ideia que prevê que a autorização e controlo dos metadados caiba a um grupo constituído pelos presidentes das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça e por um juiz designado pelo Conselho Superior da Magistratura.