O bom desempenho do primeiro trimestre
Em termos históricos um crescimento homólogo de 2,8% é apenas pouco acima da média da nossa democracia. Ainda assim, e para os interessados, teve quase o sabor de uma vitória no Festival da Eurovisão. Não há necessidade de se ser pessimista apenas por razões defensivas.
Em outubro de 2016 escrevi um artigo no PÚBLICO que terminava com um apelo aos nossos governantes: “O compasso de espera de 2016 não precisa de se manter durante quatro anos. É responsabilidade do Governo desenhar uma estratégia económica que se baseie nos dados e na evidência e não apenas nas preferências expressas nos documentos políticos que assinou no passado.”
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Em outubro de 2016 escrevi um artigo no PÚBLICO que terminava com um apelo aos nossos governantes: “O compasso de espera de 2016 não precisa de se manter durante quatro anos. É responsabilidade do Governo desenhar uma estratégia económica que se baseie nos dados e na evidência e não apenas nas preferências expressas nos documentos políticos que assinou no passado.”
Confesso que continuo sem perceber qual a estratégia económica do Governo. Se A) cumprir as metas do défice; ou se B) cumprir os acordos políticos de 2015. Nas palavras ditas publicamente o Governo reafirma o primado dos seus acordos políticos. Nos atos revelados em 2016 o Governo parece comprometido com as metas orçamentais. Esta ambiguidade é inquietante.
Entretanto, a economia portuguesa deu sinais de melhoria a partir do segundo semestre do ano passado, e com um crescimento em cadeia do PIB de 1,0% no primeiro trimestre deste ano (2,8% em termos homólogos), divulgado ontem pelo INE. O Católica Lisbon Forecasting Lab - Necep mantém como ponto central da sua projeção para este ano 2,4%, uma previsão maior do que a generalidade das instituições oficiais (1,8% para o Governo, Banco de Portugal e Comissão Europeia e 1,7% para o FMI).
As nossas estimativas para o crescimento do investimento este ano são também positivas, mas neste agregado a perda acumulada desde 2010 é tão grande que será necessário crescer cerca de 30% apenas para chegar aos níveis daquele ano. Ou seja, só com crescimentos homólogos do investimento mais próximos de 10% teremos a confiança de que não estamos perante mais uma falsa partida da economia portuguesa.
De facto, em 2015 vimos sinais muito favoráveis na economia no dealbar do ano que acabaram por desaparecer ao longo do mesmo, em parte devido ao ruído do processo político-eleitoral. Pelo que convém manter uma atitude de grande prudência. O futuro é sempre incerto e há riscos significativos na frente externa.
Os dados de atividade económica são hoje bastante animadores. Mas, a forma como os interpretamos têm uma certa importância prática. Por um lado, se os bons dados do crescimento resultarem de aumento do endividamento ou dos estímulos orçamentais é mau sinal. Já que significa que o crescimento medíocre regressará assim que os limites de endividamento e do défice forem novamente atingidos.
Por outro lado, se o crescimento resultar do fim do processo de ajustamento e das medidas volumosas que foram implementadas a partir de 2011 estaríamos a observar a natural recuperação cíclica da economia após um período de ajustamento invulgarmente duro e longo. Foi isso aliás que se observou na Irlanda, em Espanha e nos países Bálticos.
Os bons dados das contas nacionais podem ser usados pelos diferentes responsáveis em apoio às suas teses. A tese X) que o crescimento da economia resulta da política da devolução dos rendimentos; ou a tese Y) que o crescimento da economia resulta da consistência no cumprimento das metas do défice. Generalizar com base em três bons dados estatísticos trimestrais é, porém, audacioso.
Na minha opinião o ideal seria deixar a atual, e muito desejada, recuperação económica correr o seu curso sem quaisquer estímulos públicos. E as eventuais folgas orçamentais deveriam ser usadas para reduzir a dívida pública e não para satisfazer os desejos e os projetos daqueles que estão mais próximos do poder. É difícil encontrar projetos de despesa pública com rentabilidade maior que a recompra da dívida.
No plano psicológico, os dados do INE contribuem para uma mudança favorável nas perspetivas da generalidade dos portugueses. Em termos históricos um crescimento homólogo de 2,8% é apenas pouco acima da média da nossa democracia. Ainda assim, e para os interessados, teve quase o sabor de uma vitória no Festival da Eurovisão. Não há necessidade de se ser pessimista apenas por razões defensivas.
O autor escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico