Governo avança com corte de 140 milhões nas renováveis

Empresas de renováveis receberam apoios públicos “em excesso” que devem ser devolvidos ao sistema. Produtores foram "apanhados de surpresa" e já pediram reunião à tutela.

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APREN estranha que pagamentos em excesso nunca tenham sido detectados por Governos anteriores e por Bruxelas Lara Jacinto/Arquivo

Não é o alargamento da contribuição extraordinária sobre o sector energético às renováveis, como defendia o Bloco de Esquerda, mas é um encontro de contas que deverá representar um corte de 140 milhões de euros ao sector das energias limpas. De acordo com uma portaria assinada pelo secretário de Estado da Energia, há produtores de energias renováveis, que beneficiam de tarifas subsidiadas pelos consumidores, que receberam cumulativamente 140 milhões de euros “em excesso”, a título de “apoios públicos à promoção e ao desenvolvimento das energias renováveis”.

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Não é o alargamento da contribuição extraordinária sobre o sector energético às renováveis, como defendia o Bloco de Esquerda, mas é um encontro de contas que deverá representar um corte de 140 milhões de euros ao sector das energias limpas. De acordo com uma portaria assinada pelo secretário de Estado da Energia, há produtores de energias renováveis, que beneficiam de tarifas subsidiadas pelos consumidores, que receberam cumulativamente 140 milhões de euros “em excesso”, a título de “apoios públicos à promoção e ao desenvolvimento das energias renováveis”.

Os valores foram identificados "através de um trabalho de avaliação de políticas públicas da área da energia realizado pela Direcção-geral de Energia e Geologia [DGEG]", revela o diploma publicado em Diário da República.

Esta duplicação de benefícios deverá ser utilizada para baixar o défice tarifário futuro (com impacto positivo nos preços dos próximos anos) e beneficiar os preços da electricidade já no próximo ano, sublinha a portaria: os valores, devem “ser corrigidos, a favor do Sistema Eléctrico Nacional, assim que possível e com efeitos no exercício tarifário de 2017”. Assim, 70 milhões deverão ser utilizados para abater a dívida tarifária e outros 70 milhões serão contabilizados a favor das tarifas eléctricas do próximo ano, cuja proposta a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) apresenta nesta sexta-feira.

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da associação das empresas de energias renováveis (APREN), António Sá da Costa, confessou que "foi apanhado de surpresa" e adiantou que já pediu um encontro com a tutela. "Ainda não sei qual a fundamentação da DGEG, portanto, não posso comentar, mas acho estranho que isto tenha escapado durante tantos anos ao Ministério da Economia, às entidades que geriram os os fundos comunitários e a Bruxelas", adiantou ao PÚBLICO.

Em simultâneo, o secretário de Estado da Energia avançou com diplomas para alterar os mecanismos da interruptibilidade e da garantia de potência, de forma a tentar reduzir os custos que estes dois regimes têm para o sistema eléctrico, ou seja, para os consumidores. Em 2016, representaram em conjunto um encargo de 120 milhões de euros comportados pelas facturas da luz.

Sobre a garantia de potência, o despacho assinado por Jorge Seguro Sanches indica que a DGEG e a ERSE estão a preparar “uma proposta de mecanismo de remuneração de capacidade” que garanta que as empresas que vão prestar estes serviços (pagos na factura da luz) são escolhidas com base num “procedimento concursal competitivo, com base em critérios claros, transparentes e não discriminatórios”.

Actualmente, as empresas que são remuneradas para estarem permanentemente disponíveis para assegurar o aprovisionamento eléctrico nos casos em que a produção de origem renovável (como as eólicas) não é suficiente, são escolhidas de forma administrativa. Da mesma forma, o nível de remuneração que recebem tem sido definido pela tutela.

De acordo com o documento da ERSE para as tarifas de 2016, este ano os consumidores irão assegurar, através da factura mensal, o pagamento de 20,3 milhões de euros relativos aos custos com garantias de potência em 2015. Em causa estão cerca de 15 milhões de euros devidos à EDP (pela disponibilidade de centrais como a barragem de Baixo Sabor e Ribeiradio ou a termoeléctrica do Ribatejo) e o restante à Elecgas (a central do Pego), detida pela Endesa e pela Trustenergy.

O despacho frisa que “a medida deve incorporar mecanismos que gerem a redução imediata de custos para o sistema”. Estes mecanismos deverão assegurar que o preço que os consumidores de electricidade pagam pela garantia de potência “tende automaticamente para zero, quando se esperar que o nível de capacidade fornecida é adequado para responder ao nível da capacidade necessária para satisfazer a procura". A proposta da ERSE e da DGEG deverá ser apresentada até 15 de Novembro, de modo a que o novo modelo (com menores custos) se reflecta nas tarifas do próximo ano. Isto porque a ERSE apresenta esta sexta-feira a proposta tarifária para 2017, mas a decisão final sobre as tarifas só será conhecida no dia 15 de Dezembro, depois de ouvido o conselho tarifário do regulador.

O actual modelo português já tinha merecido as críticas de Bruxelas num relatório publicado em Abril sobre os auxílios estatais nas garantias de potência. Este é um dos temas que estava a ser trabalhado pelo PS e pelo Bloco de Esquerda num grupo onde também o está secretário de Estado da Energia e que tinha como mote reduzir os custos do sistema eléctrico. O outro é o dos subsídios à interruptibilidade, que beneficiam cerca de meia centena de empresas industriais, (como a Altri, a Siderurgia Nacional, a Renova, a Cimpor, a Cuf, ou a Sonae Indústria), e que este ano se prevê que tenha custado 102 milhões de euros aos consumidores.

Na prática, a interruptibilidade serviria para que, em caso de necessidade de aliviar o consumo na rede eléctrica, as diversas unidades industriais pudessem suspender a produção para evitar um apagão, sendo ressarcidas por isso. Mas, segundo a ERSE, a REN, que faz a gestão administrativa, técnica e operacional do regime, nunca precisou de tomar essa opção.

Agora, o Governo quer "credibilizar e dar rigor ao sistema" e, por isso, quer atestar a disponibilidade e capacidade de todas as instalações que prestam o serviço através de ordens de redução efectiva de potência "com a duração mínima de uma hora, incidindo sobre aproximadamente 10% do total de potência interruptível contratada" a essa empresa. Só essas deverão ser remuneradas pelo sistema eléctrico. "A remuneração fica limitada às instalações que forem alvo de testes" e que se "revelarem aptas à prestação do serviço". Além disso, antecipa-se que este mecanismo passe no futuro para um processo de mercado.

O Bloco de Esquerda e o PS já tinham adiantado esperar que a revisão do subsídio da interruptibilidade pudesse cortar 60 milhões de euros a este encargo anual do sistema elétrico.