Tribunal austríaco dá razão à extrema-direita e manda repetir presidenciais
Juízes do Constitucional consideraram haver demasiadas irregularidades na contagem de votos. O candidto da FPÖ será um dos presidentes interinos, até haver eleições.
O Tribunal Constitucional da Áustria decidiu invalidar as eleições presidenciais de 22 de Maio. A sentença deu razão ao pedido de impugnação feito pelo Partido da Liberdade (FPÖ), que viu o seu candidato perder por uma margem mínima na segunda volta. E dá a esta formação de extrema-direita a aura de ter denunciado irregularidades no normal funcionamento do processo democrático.
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O Tribunal Constitucional da Áustria decidiu invalidar as eleições presidenciais de 22 de Maio. A sentença deu razão ao pedido de impugnação feito pelo Partido da Liberdade (FPÖ), que viu o seu candidato perder por uma margem mínima na segunda volta. E dá a esta formação de extrema-direita a aura de ter denunciado irregularidades no normal funcionamento do processo democrático.
Terão de ser marcadas novas eleições, provavelmente no Outono – o mais cedo seria a 18 de Setembro, diz o jornal austríaco Kurier – num contexto político europeu radicalizado pelo referendo britânico que decidiu a saída do Reino Unido da União Europeia. Várias forças políticas eurocépticas, maioritariamente de extrema-direita, ganharam novo fôlego com o “Brexit” – o FPÖ apelou também à realização de um referendo para sair da UE “dentro de um ano”, se a resposta da União Europeia for uma maior centralização.
O ecologista Alexander Van der Bellen, de 72 anos, nem chega a tomar posse – deveria fazê-lo a 8 de Julho. Até se realizarem novas eleições na Áustria, os três presidente da câmara baixa do Parlamento vão assumir a presidência de forma interina – e um deles é Norbert Hofer, de 45 anos, o candidato do FPÖ derrotado a 22 de Maio, na segunda volta das presidenciais, que foi disputada quase voto a voto.
Foi o apuramento dos votos por correspondência que determinou o desfecho das eleições — ganhas por Van der Bellen por uma margem de 30.863 votos. Foi sobre estes que se centrou o recurso do partido de extrema-direita.
Não é que haja suspeitas de fraude ou manipulação dos resultados finais. O Tribunal Constitucional considera é que que houve uma série de negligências no processo de contagem dos votos, tão generalizadas que considerou haver motivos para todo o país repetir a votação.
O laxismo nos procedimentos, notado pelo FPÖ no seu recurso, prendeu-se com votos por correspondência contados por pessoas que não estavam habilitados a fazê-lo, e/ou abertos antes do prazo. Criticava ainda a divulgação dos resultados antes do tempo na Internet e na rádio.
E o partido viu confirmadas as suas queixas. Entre as dezenas de testemunhas ouvidas pelo Tribunal Constitucional, muitas reconheceram terem existido essas irregularidades.
Por exemplo, foram abertos 14 mil votos por correspondência na circunscrição de Innsbruck-Land logo no domingo, quando não deveriam ter sido abertos antes das 9h da manhã de segunda-feira, 23 de Maio. A testemunha que o relatou disse ter recebido autorização para o fazer, de forma oral, da Comissão Eleitoral. Mas não ficou nenhum registo dessa permissão. Outras testemunhas relataram ter recebido instruções para trazer mais pessoal para contar os votos.
O Tribunal Constitucional concluiu que estão em causa pelo menos 78 mil votos em 14 distritos eleitorais – embora não haja indícios de que as irregularidades tenham afectado o resultado final.
Na última audição do Tribunal Constitucional, na quarta-feira, John Schnizer, um dos juízes, perguntou aos advogados do Presidente eleito se tinham presente a “antiga e dura lei” do Tribunal Constitucional: não é preciso detectar prova de que houve manipulações com resultados eleitorais, basta apenas a possibilidade de haver manipulação. Trata-se de jurisprudência estabelecida em 1927, por Hans Kelsen, respeitado como o pai da Constituição Federal austríaca, que julgou o caso de uma estação de voto reaberta depois de já terem sido contados os votos em urna.
Esta sexta-feira, o presidente do Tribunal Constitucional, Gerhart Holzinger, apresentou a decisão como uma forma de defender "os pilares da democracia". “Esta decisão não faz perdedores nem ganhadores”, afirmou. “Tem um único objectivo: assegurar a confiança no Estado de direito e o reforço da nossa democracia.
Os partidos políticos austríacos aceitaram a decisão do Tribunal Constitucional, como uma posição de defesa da democracia, apesar de reabrir uma disputada eleição que, até estarem contados todos os votos, as eleições pareciam estar ganhas pela extrema-direita. Antes da segunda volta, as sondagens davam como vencedor Norbert Hofer, com 15 pontos de avanço.
Apesar do choque, Van der Bellen diz-se confiante de conseguir ganhar outra vez. "Se ganhei uma primeira vez em condições adversas, conseguirei fazê-lo uma segunda vez", afirmou. No entanto, não tem o financiamento da campanha assegurado – apesar de ser ex-líder do partido Os Verdes, candidatou-se como independente. O seu director de campanha apelou a todas as doações: “Mesmo pequenos montantes, cada euro conta”, disse Lothar Lockl.
Outros líderes de extrema-direita europeus exultaram com este resultado: “Super!!”, escreveu no Twitter o populista holandês Geert Wilders. A francesa Marine Le Pen saudou “a boa notícia para os patriotas, que se inscreve na Primavera dos povos que os nossos países estão a viver” – após o “Brexit”.