“Grillini” atraem votos da direita na estratégia de “todos contra Renzi”
O primeiro-ministro reconheceu “uma derrota sem atenuantes em Roma e Turim”. As eleições de domingo reforçaram a campanha do Movimento 5 Estrelas para o derrotar no referendo de Outubro.
O Movimento 5 Estrelas, (M5S, fundado por Beppe Grillo), vai governar Roma. A sua candidata, Virginia Raggi, fala num “momento histórico” pois será a primeira mulher a presidir à capital italiana. Não foi uma surpresa mas tornou-se na “grande notícia” das eleições autárquicas italianas de domingo. Ao contrário, inesperada foi a vitória de outra mulher de M5S, Chiara Appendino, em Turim, onde derrotou Piero Fassino, presidente cessante e figura histórica do Partido Democrático (PD, de Matteo Renzi).
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O Movimento 5 Estrelas, (M5S, fundado por Beppe Grillo), vai governar Roma. A sua candidata, Virginia Raggi, fala num “momento histórico” pois será a primeira mulher a presidir à capital italiana. Não foi uma surpresa mas tornou-se na “grande notícia” das eleições autárquicas italianas de domingo. Ao contrário, inesperada foi a vitória de outra mulher de M5S, Chiara Appendino, em Turim, onde derrotou Piero Fassino, presidente cessante e figura histórica do Partido Democrático (PD, de Matteo Renzi).
Os democratas ganharam em Milão a batalha de maior peso político, mas o conjunto dos resultados é um grave desaire para Renzi e para o seu partido. É a sua primeira derrota. Outra nota política fundamental é o facto de parte do eleitorado de direita e extrema-direita ter transferido o seu voto para os candidatos do M5S, seguindo a estratégia dita “todos contra Renzi”.
A abstenção cresceu e, ao contrário da tradição italiana, apenas metade dos recenseados se deu ao trabalho de ir votar. Raggi reuniu 67,2% dos votos e Appendino 54,6. Em Milão, Giuseppe Sala, candidato do PD, bateu a aliança de direita com 51,7%. O PD conservou Bolonha, através do presidente cessante, Viginio Merola, Em Nápoles, Luigi de Magistris (Lista Cívica, apoiada pela “esquerda da esquerda”) manteve o seu lugar com 66,8%.
Raggi não conquistou Roma com um programa mas explorando a retórica “anti-sistema”, que continua a encontrar largo eco na Itália. E perfeitamente adequada a uma cidade mal governada há longos anos, tanto pela direita como pela esquerda.
Renzi reconheceu “a derrota sem atenuantes em Roma e Turim” mas repetiu que “a verdadeira partida é em Outubro”, no referendo sobre as reformas constitucionais e sociais. Ele prometeu que se demitiria no caso de perder o referendo, o que incentiva a convergência de todos os adversários, dos “lepenistas” da Liga de Matteo Salvini a alguns dos seus opositores dentro do PD.
Efeitos políticos
A bipolarização, assente na disputa entre coligações do centro-esquerda e do centro-direita, desapareceu após as eleições de 2013. Deu lugar a uma “tripolarização imperfeita”, graças à ascensão do M5S. O centro-esquerda mudou radicalmente com o novo PD de Renzi, que lançou um plano de reformas que dividem a esquerda. Procura manter o eleitorado tradicional da esquerda mas captando votos no centro-direita. Em vão tentou esvaziar a vaga da “antipolítica”. Venceu esmagadoramente as europeias de 2014. Mas a sua popularidade e a do partido estão em erosão, pois os resultados económicos demoram a manifestar-se.
O centro-direita deixou praticamente de existir. A tentativa de Matteo Salvini para assumir a sua liderança esbarrou na resistência da Força Itália de Berlusconi. Nestas autárquicas, a Liga sofreu uma clara derrota. “Não há um partido, mas dois ou três, muitos líderes e muito caos. O que surpreende é que ainda exista o seu eleitorado”, resume o analista Antonio Polito.
Resta o “terceiro pólo”, o M5S. Resistiu melhor do que o previsto pelos analistas. Os populistas descobriram que poderiam tirar partido das eleições a duas voltas. Conseguiram demonstrar no domingo que lhes era possível captar transversalmente os votos de “todos os anti-renzianos” para afastar da cena o primeiro-ministro no referendo. Estão também numa encruzilhada: ao conquistar Roma e Turim não podem falhar na sua gestão. A maioria dos seus eleitores exprimem um protesto votando neles mas não os consideram aptos para governar a Itália.
O ponto fraco desta estratégia é que, de momento, não se vislumbra uma alternativa a Renzi. Afastá-lo sem uma alternativa sólida seria o “salto no escuro” com alto risco de abrir uma nova crise financeira. É previsível que o combate do referendo se vá travar noutro terreno, o da estabilidade política e económica.
Aguarda-se a resposta de Renzi pois a ausência de alternativa não é um trunfo infalível. Outro analista, Stefano Folli, sublinha outra vertente da derrota de domingo: “É sobretudo um péssimo resultado para o ‘renzismo’, entendido como um ambicioso desígnio de remodelar a Itália, definindo os contornos de um partido pessoal construído sobre o carisma do líder.”
Por isso estas eleições, formalmente locais, têm um significado nacional. Foram o tiro de partida para o referendo de 2 de Outubro, que será uma prova de força entre Renzi e o Cinco Estrelas.