Herbicida "provavelmente cancerígeno" é usado por um terço dos municípios
Valores de glifosato em amostras de urina de voluntários portugueses são vinte vezes maiores do que os registados noutros países europeus. Herbicida é utilizado na agricultura, mas também na eliminação de ervas daninhas nos passeios de zonas urbanas.
O glifosato, um herbicida que a Organização Mundial de Saúde identificou como uma substância “provavelmente cancerígena”, é utilizado pela esmagadora maioria das autarquias que responderam a um inquérito do Bloco de Esquerda, noticia este domingo o Diário de Notícias. Entre os 308 municípios contactados, 107 prestaram informações sobre o uso da substância e, destes, 89 confirmaram que utilizam o herbicida. Gondomar é a câmara que mais usa a substância (4000 litros), seguida de Matosinhos (2800) e Évora (2500).
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O glifosato, um herbicida que a Organização Mundial de Saúde identificou como uma substância “provavelmente cancerígena”, é utilizado pela esmagadora maioria das autarquias que responderam a um inquérito do Bloco de Esquerda, noticia este domingo o Diário de Notícias. Entre os 308 municípios contactados, 107 prestaram informações sobre o uso da substância e, destes, 89 confirmaram que utilizam o herbicida. Gondomar é a câmara que mais usa a substância (4000 litros), seguida de Matosinhos (2800) e Évora (2500).
Em Portugal, onde em 2014 foram comercializadas 1600 toneladas de glifosato, o herbicida é utilizado na agricultura mas também em espaços urbanos, sobretudo na eliminação de ervas daninhas nos passeios. A absorção pelo organismo humano está comprovada. Num estudo promovido pela Plataforma Transgénicos Fora e acompanhado pela RTP em que participaram 26 voluntários portugueses, uma universidade norte-americana analisou amostras de urina e detectou a presença do glifosato em todos os casos. O valor médio registado foi de 26,2 nanogramas por mililitro, muito superior ao valor máximo detectado num conjunto de 18 países europeus (1,8 nanogramas) e maior do valor máximo observado nos Estados Unidos (18,8 nanogramas).
Existe um enorme debate científico e político em torno do glifosato. Em Março de 2015, o braço de pesquisa oncológica da Organização Mundial de Saúde (OMS) atribuiu à substância o segundo grau mais grave de risco cancerígeno (o 2A, numa escala de 1, “cancerígeno para humanos”, a 4, “provavelmente não cancerígeno para humanos”). No estudo publicado na Lancet, a Agência Internacional de Pesquisa de Cancro (IARC, na sigla inglesa) aponta “provas limitadas” de uma maior propensão para o linfoma de não-Hodgkin em trabalhadores expostos ao glifosato após análises conduzidas na Suécia, Estados Unidos e Canadá. A IARC cita ainda um outro estudo que indica a subida de marcadores tumorais em populações de regiões colombianas onde aquele herbicida é utilizado. Em ratos, foi identificada “prova suficiente” da relação entre a exposição ao glifosato e o desenvolvimento de tumores no sistema urinário, no pâncreas e na pele.
As conclusões da IARC não têm efeitos vinculativos sobre a capacidade das agências nacionais de decidirem sobre a utilização do herbicida. Em Portugal, e através de um comunicado divulgado no sábado, o Ministério da Agricultura sublinha que o risco em causa não está directamente associado ao glifosato, mas antes a uma substância presente em determinadas fórmulas que potenciará os possíveis efeitos do primeiro elemento. Trata-se da taloamina. A conclusão do Governo português é retirada após “exaustiva reanálise dos estudos e informações disponíveis pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos”.
A nível local, no entanto, várias autarquias como a Câmara do Porto decidiram suspender o uso do herbicida.
A utilização do glifosato é debatida neste momento a nível europeu. A 18 de Maio, a Comissão Europeia vai decidir sobre a renovação da licença de uso do herbicida. Uma primeira proposta para a revalidação da autorização durante 15 anos foi rejeitada por Itália, França, Holanda e Suécia. Uma recomendação não vinculativa do Parlamento Europeu aponta agora para uma revalidação por sete anos e a proibição do uso do glifosato em zonas urbanas.
Citado pelo Diário de Notícias, o deputado bloquista Jorge Costa afirma que o Ministério da Agricultura era inicialmente “favorável à renovação”, mas que “entretanto indicou aos peritos que assumam uma posição de abstenção”.
“Esperamos que o Governo não alinhe na renovação”, disse.
Em 2015, e após a divulgação do estudo da IARC, o Governo francês começou por fazer uma recomendação não vinculativa contra a venda ao público do glifosato. Há poucas semanas, porém, optou pela proibição total de produtos químicos que contenham glifosato e taloamina.
Fora do espaço europeu, países como o Sri Lanka e as Bermudas proibiram a importação e uso do herbicida. A Colômbia, por seu turno, deixou de utilizar nesse ano a substância nas campanhas de destruição da planta de coca.
O glifosato foi desenvolvido pela multinacional agroquímica Monsanto, que também comercializa as culturas transgénicas que resistem à substância. A empresa desvaloriza a toxicidade do herbicida, apontando que na mesma categoria em que a IARC coloca o produto também estão “o café, os telemóveis, o extracto de aloé vera e vegetais em conserva”.